Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina do ABC (1978) e doutorado em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da U...
iBeber para esquecer, para comemorar uma vitória ou simplesmente para amenizar um momento de tédio. A relação de álcool e as nossas sensações está diretamente ligada.
De forma que existe uma percepção de que o álcool pode ajudar a reduzir temporariamente as emoções negativas e, consequentemente, a aumentar a sensação de bem-estar e de relaxamento. Essa, na verdade, tem sido considerada como uma das principais razões para o consumo dessa substância, embora ele também possa estar associado a emoções negativas, como a agressividade e a depressão.
Um artigo inovador e interessante, liderado por Kathryn Ashton, do Kings College de Londres e publicado em novembro de 2017 na British Medical Journal Open, avaliou a relação entre os diferentes tipos de bebidas alcoólicas (cerveja, vinho e destilados) e as emoções desencadeadas pelo seu consumo. Foram quase 30 mil entrevistados em 21 países, entre eles o Brasil, sendo 66,8% homens e 33,2% mulheres, com idades entre 18 e 34 anos. O estudo utilizou dados do Global Drug Survey, uma das maiores pesquisas online sobre o consumo de álcool e drogas ilícitas entre adultos do mundo.
Entre os principais resultados do estudo, destaca-se a associação da cerveja e vinho tinto à sensação de relaxamento, relatada por cerca de 50% dos entrevistados, enquanto 30% relacionaram os destilados a sentimentos de agressividade e inquietação.
O consumo de destilados também foi associado ao aumento da sensação de energia e confiança por mais da metade dos entrevistados. As mulheres relataram com mais frequência todos os tipos de emoções após o consumo de qualquer bebida alcoólica, exceto o aumento na agressividade.
Indivíduos com maior grau de dependência de álcool associaram o consumo de destilados a maior intensidade de emoções, sejam elas positivas ou negativas, independente do contexto onde beberam. Esta observação pode refletir uma possível busca de preencher, com o álcool, um potencial hiato emocional.
Bebedores mais pesados, ou seja, com maior pontuação no AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test), relataram emoções negativas com mais frequência do que os moderados, o que pode ser parcialmente explicado pelo fato de beberem maior quantidade em menos tempo.
Este estudo representa uma análise relevante, ainda que inicial, para entender as relações entre as emoções percebidas e o consumo de álcool. Outras atividades realizadas durante o período de consumo de bebidas alcoólicas, como a dança, a socialização e o uso de drogas, também podem afetar as emoções relatadas associadas a cada tipo de bebida.
Por isso, entender a escolha de determinados tipos de bebidas alcoólicas em diferentes contextos pode ser de grande utilidade na elaboração de intervenções de saúde pública, seja para modificar os padrões de consumo como reduzir os danos causados pelo uso nocivo do álcool, responsável por 5,1% da carga global de doenças.