Redatora de saúde, família e bem-estar, com foco em comportamento e saúde mental.
Uma escultura de uma mulher magra, com olhos arregalados, cabelo bagunçado e boca arqueada com um sorriso alto está assustando muita gente na internet. Essa imagem é a foto de perfil do Whatsapp de um número de telefone com o DDI +18, do Japão, que é divulgado como sendo de Momo. A lenda que se espalhou é que, quando você entra em contato com Momo, ela envia mensagens com seu nome e falando o seu idioma.
Ao fazer uma busca na internet é possível ver vídeos de Youtubers conversando com Momo, e relatando receber mensagens assustadoras, com ameaças de morte e imagens de espíritos. O vídeo mais visto, em espanhol, tem mais de 10 milhões de visualizações.
No entanto, o número que seria de Momo, divulgado massivamente nos fóruns da internet e até por esses próprios Youtubers, não acessa o Whatsapp desde 11 de julho.
Segundo o advogado especializado em direito digital Marcelo Crespo, sócio do Peck Advogados, não há como afirmar com exatidão o que é a Momo, mas ao que parece é um trote com o intuito de causar susto e curiosidade. "Acredito que não há motivo para pânico. Não recebi relatos de pessoas se ferindo, perdendo dinheiro ou sendo agredidas", explica.
De acordo com ele, no entanto, é importante que as pessoas fiquem atentas e bloqueiem qualquer número que entre em contato se passando por Momo e também não adicionem os números de celular que possam estar circulando na internet.
Momo - o que está por trás
A foto do perfil de Momo é a imagem de uma escultura conhecida como "Mulher Pássaro", que está na exposição Ghost, da Vanilla Gallery, em Tóquio.
O que se especula sobre a Momo é que ela seja na verdade um robô que coleta informações públicas do Whatsapp, como o número e o nome, e a partir daí consegue mencioná-lo e falar o idioma de que lhe adicionou. Assim, as mensagens seriam personalizadas a partir das informações que você dá para ela. Isso é possível através de técnicas de inteligência artificial, usando mecanismos que "aprendem" com a informação coletada e aperfeiçoam algoritmos.
No entanto, a maioria dos vídeos de relatos e conversas com a Momo foram publicados após o dia 11 de julho. O que mostra que existem informações desencontradas.
De acordo com Crespo a partir do momento que o fato começou a ganhar visibilidade na internet, é possível que outras pessoas tenham começado a criar outros perfis para se passar por Momo
A questão é que, independente de a Momo ser uma programação ou vários números diferentes passando trote, é fato que a personagem em questão despertou a curiosidade de crianças e adolescentes. E, principalmente quando se trata deste público, é importante que os pais fiquem alertas ao conteúdo que os filhos estão tendo contato.
Lendas urbanas foram parar no Whatsapp?
Quem cresceu nos anos 90 ou 2000 pode ter ouvido falar da loira do banheiro. O que se propagava pelas escolas é que a assombração aparecia após um ritual que envolve coletar cabelos loiros, jogar num vaso sanitário e chutá-lo.
Uma justificativa para essas brincadeiras serem tão comuns nos primeiros anos de vida é que as crianças estão sempre buscando sentir sensações de tensão e alívio. "O medo é uma emoção que coloca nosso corpo em "alerta" e isso é químico. Há liberação de adrenalina, por exemplo, e isso traz sensações diferentes do habitual", explica a psicóloga Denise Franco. Segundo ela, é o mesmo mecanismo que faz buscar os pequenos se interessarem por filmes de terror, por exemplo.
Já nos adolescentes, há um elemento extra: a necessidade de transgressão das regras. "Tudo que parece proibido chama a atenção. Além disso, essa é uma fase em que ele necessita se diferenciar dos pais e se autoafirmar, por isso procura por tudo que é diferente", afirma Katyanne Segalla, também psicóloga.
Passar por esses momentos de medo, no entanto, pode deixar marcas no desenvolvimento da criança. "Não é porque tem uma busca natural por sentir emoções novas que se justifica as crianças ficarem à mercê dessas criações virtuais nocivas que não têm nada a acrescentar como saudável no desenvolvimento dos pequenos", critica Denise.
Para um adulto, é mais fácil entender a diferença entre realidade e imaginação. No entanto, as crianças transitam melhor entre a abstração e o nosso mundo, declara Katyanne. "Quanto mais nova a criança, mais real a lenda tende a parecer", completa.
Assim, o medo em excesso de uma lenda como essa pode gerar pânico e levar a algumas consequências a curto prazo. Uma criança pode deixar de fazer coisas como transitar pela casa, dormir sozinha, além de chorar frequentemente e fazer xixi na cama.
Para quem está vivendo a infância agora, testar esse mecanismo de tensão e alívio envolve a vida virtual, e pode representar mais perigo do que a lenda da loira do banheiro ou o jogo do compasso. Pessoas mal intencionadas podem aproveitar esse contato para roubar dados ou até incentivar comportamentos nocivos às crianças e adolescentes.
"Muitas pessoas têm se passado pela personagem para roubar dados dos usuários de redes sociais, feito ofensas e até produzido algo parecido com o antigo baleia azul, por isso, uma conversa aberta é essencial", alerta Katyanne.
Como conversar com seus filhos sobre lendas como a Momo
Mesmo em momentos que não há alguma grande ameaça circulando pela internet, Denise defende que os pais sempre monitorem as crianças para saber o uso que fazem da internet. No caso dos adolescentes, a confiança pode ir sendo conquistada aos poucos. "Gradativamente, é possível ir oferecendo momentos mais livres para perceber como reagem diante disso; isso de de acordo com o amadurecimento que só pode ser avaliado quando existe diálogo na família e muita conversa de "olho no olho", explica a psicóloga.
Katyanne acredita que esse monitoramento deve ser indispensável até os 13 anos. "Na adolescência, quanto mais diálogo e instrução, menos será preciso a invasão de privacidade". A atenção ao comportamento dos filhos é essencial para identificar se algo está errado. Mesmo nos casos em que os pais sintam a necessidade de entrar nas contas dos filhos e invadir essa privacidade, o diálogo é uma ferramenta para fazer com que o adolescente não perca a confiança e não se sinta injustiçado ou invadido, instrui ela.
A advogada e pedagoga Cristina Sleiman, sócia do Peck Sleiman Edu e diretora pedagógica do Instituto iStart explica que é importante que os pais falem sobre o assunto com os filhos, mostrem as notícias que estão sendo divulgadas e expliquem sobre os possíveis riscos tentar falar com a Momo. "Sendo verdade ou não, é fato que existem pessoas mal intencionadas na internet e é preciso que os pais falem os filhos sobre esses perigos", completa a especialista.
Para não ter uma Momo dentro de casa
A especialista ainda chama atenção para a necessidade de os pais conversarem com os filhos para que eles não tentem replicar a brincadeira. Sim, é importante lembrar que no Whatsapp é possível modificar a foto do perfil e o nome de identificação. Provavelmente é isso que diferentes pessoas estejam fazendo para tentar se passar por Momo. De acordo com Cristina esse tipo de trote pode ser perigoso tanto para quem envia quanto para quem recebe. "Ver tudo pelo lado da brincadeira e praticar ações que podem trazer danos para outras pessoas é errado e, dependendo do caso, pode trazer consequências judiciais".
Reportagem com colaboração de Lara Deus