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Tudo que tem vida se transforma, seja pela ação do tempo ou até mesmo por um anseio de mudança. A virada do ano é uma época que simboliza esse momento, principalmente em relação às mudanças que se almeja para a própria vida.
A mudança de ano vem acompanhada de uma motivação súbita, quase como se fosse um fluxo elétrico correndo por nossas veias. "É comum as pessoas depositarem suas expectativas em um novo ano pelo fato de ainda não conhecerem essa nova época. Sendo assim, a sensação é de que pode-se projetar todos os desejos e anseios para o período que vem a seguir, como se fosse o último ano da vida", explica a psicóloga Monica Machado
Não há nada de errado em tentar movimentar as coisas ao redor com a virada do ano. Afinal, o que não se altera fica estático e arraigado em certezas. A questão é que quando esse movimento não é ponderado, pode trazer frustração, pois, muitas vezes, o planejamento não corresponde às expectativas. Isso faz com que as mudanças almejadas tenham que ser novamente adiadas.
É comum associarmos metas não realizadas com falta de planejamento. De fato, em alguns casos, a ausência de dedicação, disciplina e orientação correta podem influenciar. No entanto, existe uma etapa que antecede a mudança que muitas vezes fica esquecida: a autoaceitação - e ela pode trazer grandes benefícios para as nossas vidas.
Importância da autoaceitação
A autoaceitação é o reconhecimento de si mesmo, dos limites, virtudes, medos e bagagens de experiências que cada um carrega. Não se enxergar é como atravessar uma estrada no escuro, colocando-se vulnerável a todo tipo de situação. De acordo com a psicóloga Wanessa Moreira, uma pessoa que não se aceita tem dificuldade em lidar com a própria realidade. ?Quem almeja realizações, mas não aceita sua própria condição, se distancia da própria vida?, explica.
A psicóloga Monica explica que essa situação acontece porque tem-se o hábito de embasar as próprias metas levando em consideração a comparação com outras pessoas. ?Isso é um equívoco, pois não podemos estipular nossos projetos com base em outro alguém?, explica Monica.
Potências e motivações nos lugares errados
Não há problema em ter admiração pelas conquistas de outra pessoa e ambicionar realizações semelhantes, o risco está em perder o senso de realidade. Outro aspecto é entender se a mudança desejada é para satisfação própria ou se há uma vontade de ser bem visto e aceito unicamente aos olhos dos outros. Se o intuito for conseguir algo a fim de obter o reconhecimento de outras pessoas, talvez seja necessário analisar melhor a questão. Quando o estímulo não está claro dentro de nós, pode-se perder a motivação para alcançar a meta. Outro fator é que não temos controle sobre as atitudes de outras pessoas, logo pode ser que o reconhecimento esperado não venha e isso gera frustração.
"Costumamos colocar nossas potências nos lugares errados. É preciso saber o que queremos para tirarmos de nós mesmos a força de vontade que precisamos. Esperar isso do outro é colocar nossa satisfação pessoal em uma terceira pessoa", pontua Monica.
Esse hábito de querer mudar aos olhos dos outros não precisa ser um motivo de culpa, mas pensar sobre isso ajuda a manter a mente mais tranquila e focada no que realmente importa. Você já reparou como estamos sempre recebendo diversos estímulos que nos prometem uma sensação de felicidade a partir da obtenção de coisas que estão sempre um passo à frente? O corpo ideal, a promessa de um emprego melhor, um relacionamento mais intenso e até mesmo uma vida sem preocupações são alguns exemplos que ilustram essas tentações. Por outro lado, quando o objetivo é alcançado, a vontade de conseguir outras coisas e a insatisfação logo aparecem.
São nesses momentos que a autoaceitação pode ser uma ferramenta poderosa, pois ela possibilita que o indivíduo tenha um melhor entendimento sobre si e consegue olhar com mais clareza os desconfortos e ansiedade em conquistar algo novo.
"Uma pessoa que tem uma estatura baixa vai se frustrar se quiser ter a todo custo uma estrutura longilínea, por exemplo", alerta Wanessa. Porém, de acordo com ela, é possível, por exemplo, que essa pessoa conheça o próprio corpo, entenda o que pode lhe favorecer e usar roupas que alongam a silhueta. Esse tipo de atitude faz com que o objetivo seja factível a não algo autodestrutivo. "No momento em que eu aceito meus erros, consigo ter generosidade comigo, reduzindo o peso da cobrança e deixando de ser meu próprio carrasco", informa a psicóloga Wanessa.
Aceitação não é conformismo
Pode-se pensar que autoaceitação é um pretexto para se conformar com uma situação ruim. O exercício consiste em se colocar no presente, observar o cenário de maneira racional e madura, a fim de reconhecer os aspectos positivos e também os pontos que podem ser melhorados. ?Quem se aceita é capaz de conhecer os próprios potenciais e usá-los de ferramenta para ir transformando o seu cotidiano diariamente?, enaltece Monica.
Para ela, o caminho para conquistar o que se deseja é criar expectativas diariamente e não apenas na mudança de ano. Também é importante baixar um pouco a régua diante das expectativas, a fim de focar no que é possível naquele momento.
Como se auto aceitar
Cada um tem o seu tempo para realizar o processo de autoaceitação e tentar apressar esse entendimento pode trazer frustração. No entanto, existem alguns passos que podem ser incluídos na rotina e que podem te ajudar a se sentir mais à vontade na própria pele.
Identifique e valorize as próprias conquistas
Diariamente nós conquistamos coisas em nossa vida, mas é comum acreditarmos que somente grandes acontecimentos merecem ser reconhecidos. No entanto, cada conquista, por menor que seja, foi obtida a partir de uma vontade de fazer com que as coisas aconteçam, colocamos um pouco de nós em tudo que realizamos e devemos nos lembrar disso.
Reconheça sua origem
De acordo com Wanessa, é importante que cada um saiba reconhecer e valorizar sua origem. "Precisamos lembrar dos nossos pais, porque eles representam a ancestralidade que carregamos, chegamos ao mundo a partir deles. Aceitar que estamos aqui pelo esforço deles, também é uma forma de aceitar quem se é", pontua.
Busque sua força interior
Essa dinâmica ajuda a entrar em contato com as potencialidades que cada um carrega dentro de si. Muitas vezes, os acontecimentos e a rotina fazem com que a gente se esqueça da nossa força interior - no entanto, ela continua lá. Basta que a conexão com ela seja restabelecida. Caso não consiga, é importante refletir: em qual momento essa força foi perdida? Qual situação ofuscou o nosso brilho interno?
Lembre-se que você não precisa alcançar a perfeição
Estabelecer uma relação de aceitação com o erro e ao invés de culpar, tentar aprender algo com a situação contribui para fortalecer a essência e espontaneidade que é inerente a nós. Na vida, por mais que se esforce, ninguém tem o controle do que vai acontecer. Mas ao ressignificar a ideia de "preciso fazer tudo perfeito" para "vou fazer o meu melhor", é possível se abrir às possibilidades que surgirão para cada um.
Converse com um especialista
Para alcançar o processo de autoaceitação, contar com o auxílio de um especialista pode ser útil. Monica explica que é importante falar e se escutar durante o processo de autoaceitação. "A fala vai além dos ouvidos, um psicólogo pode ajudar a elaborar e organizar os pensamentos", ressalta.
Exercite o autoconhecimento
Quando não nos conhecemos não sabemos quais são os nossos limites, virtudes, necessidades e sombras. "A partir do momento que uma pessoa se reconhece, muitas vezes ela passa a se sentir confortável e satisfeita com a própria vida, retirando o peso dos próprios ombros e coexistindo de forma mais harmônica", completa Wanessa. Independentemente de qual for o projeto que cada um almeja para o novo ano, é importante olhar para dentro de si. Dessa forma é possível ver que antes de tentar transformar nossas vidas e quem somos, precisamos nos conhecer.