É graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) (1998) e possui mestrado em P...
iRedatora das editorias de beleza, família e alimentação.
O bullying é definido como uma violência ocorrida comumente entre crianças e adolescentes, de forma intencional, repetitiva, sem motivação aparente e demarcada pelo desequilíbrio de poder entre agressor e vítima. Essa definição da psicóloga Elaine Di Sarno, especialista em Terapia Cognitivo Comportamental, ilustra o cenário atual das escolas brasileiras.
Segundo os resultados do Pisa 2018, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes, divulgados neste mês pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 29% dos estudantes brasileiros relataram ter sofrido bullying em sala de aula. A média da OCDE é de 23%.
Além disso, o relatório deste ano da Unicef sobre os 30 anos da Convenção dos Direitos da Criança mostram que problemas como bullying e cyberbullying precisam urgentemente ser olhados com atenção. Segundo o estudo, o suicídio de crianças e adolescentes passou de 714, em 2007, para 1.047, em 2017.
O que é o bullying na prática?
Para entender como essa violência funciona, a educadora e psicopedagoga Sueli Bravi separou os principais tipos de bullying:
- Físico: quando a pessoa sofre violência física, como puxões de cabelo, beliscões, mordidas, socos, chutes, etc
- Verbal: piadinhas, gozações, fofocas, ameaças, apelidos, etc
- Material: quando o outro rasga, esconde, suja, estraga, risca ou danifica pertences da vítima
- Moral ou sentimental: é parecido com o verbal, porém atacando o lado emocional da vítima com apelidos, por exemplo, que podem levar a vítima a distúrbios como bulimia, anorexia, mutilação, entre outros
- Psicológico: (variação do verbal ou moral) uma manipulação que faz com que a pessoa sempre se sinta culpada por algo, podendo levar à depressão, crises de ansiedade ou mania de perseguição
- Virtual: é uma extensão dos outros tipos de bullying, mas acontece pela internet, partindo de um perfil anônimo ou não identificável
Mesmo com tantas formas de agressão, muitas crianças acabam se sentindo acuadas e não contam para seus pais. Por isso, é necessário se atentar aos sinais do seu filho.
Como saber se seu filho está sofrendo bullying?
Alguns sinais de que a criança está sofrendo bullying são quando ela está:
- Mais calada
- Introspectiva
- Agressiva
- Chora frequentemente
- Briga em casa frequentemente, sem motivos aparentes
- Isolada
- Desconcentrada na escola e em casa
No entanto, outros sinais podem surgir. O educador e fundador do Programa Semente, projeto de aprendizagem socioemocional, Eduardo Calbucci alerta que o comportamento pode variar de acordo com cada vítima. Algumas podem ir para o espectro da tristeza, medo ou raiva.
"Uma criança triste, desanimada e desestimulada pode se isolar; uma criança preocupada, com receio, ansiosa vai ter muito mais dificuldade de concentração; uma criança irritada e indignada vai ter manifestações de agressividade. Então, isso pode variar de vítima para vítima", afirma Eduardo.
Consequências do bullying
Segundo a psicóloga Elaine de Sarno, as primeiras consequências são o isolamento social da vítima, que não se vê como alguém pertencente àquele grupo.
Depois isso, pode ocorrer:
- queda no rendimento escolar
- problemas físicos de saúde
- queda na autoestima
- quadros de depressão
- transtorno de ansiedade
- síndrome do pânico
- outros distúrbios psíquicos
Quando esses transtornos não são tratados, o quadro pode se agravar ainda mais e levar o jovem a tentar suicídio. De fato, um estudo realizado no Reino Unido apontou que 1 a cada 5 crianças pensa em suicídio como forma de fugir da perseguição do bullying.
Para entender a gravidade desses números, conheça alguns casos de suicídio por bullying que tiveram grande repercussão na mídia.
Casos de suicídio por bullying
1-Gabriel Tye, 8 anos
Gabriel estudava na Escola de Ensino Fundamental Carson e sofria bullying desde os 5 anos. No dia 26 de janeiro de 2017, dois dias depois de ser atacado por um estudante no banheiro masculino, ser ridicularizado e chutado por outros estudantes enquanto estava desacordado, o menino se suicidou.
2-James Myles, 9 anos
O menino estudava na escola fundamental Joe Shoemaker, em Denver, EUA. Nas férias, contou para sua mãe que era homossexual e que queria se apresentar assim para seus colegas, pois estava orgulhoso de si. Poucos dias após o início das aulas, James foi alvo de bullying constante e se enforcou no próprio quarto em agosto de 2018.
3- João*, 14 anos
Um estudante, o qual o nome foi preservado, de 14 anos, se jogou de cima de uma caixa d'água, uma altura de 50 metros, em agosto deste ano, na zona leste de São Paulo. O outro aluno, que estava com ele no momento da queda, contou que os dois se jogariam juntos pois sofriam bullying na escola. Segundo o menino de 12 anos, eles sempre eram xingados e recebiam apelidos pejorativos.
4- Massacre de Columbine
No dia 20 de abril de 1999, ocorreu um grande massacre na Columbine High School, no estado norte-americano do Colorado. Os estudantes Eric Harris, de 18 anos, e Dylan Klebold, de 17 anos, sofriam bullying na escola e mataram 12 colegas e um professor. Em seguida, cometeram suicídio.
Como ajudar o seu filho que está sofrendo bullying?
"É importante incentivar seu filho a falar sobre o assunto, sobre como se sente, quem são estas pessoas que estão fazendo isto com ele. É essencial elevar a autoestima destas crianças. Os pais devem tratar o assunto com seriedade, sem pressionar os filhos a reagir e sem fazer com que ele se sinta pior lhe dizendo que deveria deixar para lá", afirma Sueli.
Além disso, a psicóloga Elaine enfatiza a importância do acompanhamento psicológico. Segundo ela, a terapia pode ajudar a criança a melhorar sua autoestima e ensiná-la a lidar melhor com suas emoções. Ela ainda alerta que, em alguns casos, é recomendável até mesmo a mudança de escola para que a criança não adquira aversão ao ambiente escolar.
Porém, não é só com a criança que sofre bullying que os pais devem se preocupar. Para evitar que o bullying continue acontecendo, é necessário se atentar se o seu filho está praticando a agressão.
Como saber se o seu filho está praticando bullying?
Nesse caso, a neuropsicóloga Deborah Moss, especialista em psicologia do desenvolvimento, afirma que a criança pode ficar muito agressiva em outras situações, começar a ter um baixo rendimento escolar e sofrer mudanças bruscas no comportamento.
Além disso, é mais fácil que chegue ao ouvido dos pais questões sobre a vítima, não sobre o agressor, já que, muitas vezes, a criança ou adolescente sabe que está fazendo algo de errado e tenta esconder a situação. Por isso, é importante que os pais estejam sempre atentos e presentes na vida de seus filhos.
Porém, o educador socioemocional Eduardo Calbucci alerta que não se deve estereotipar o perfil da criança que pratica a violência. "Muitas vezes, o bullying é praticado em grupo. Então, mesmo pessoas que eventualmente as crianças sejam empáticas e compassivas, elas podem acabar, por pressão do grupo, adotando uma postura que não adotariam individualmente", acrescenta ele.
O que leva uma criança a praticar bullying?
Segundo a psicopedagoga Sueli, a pessoa que pratica bullying precisa "colocar para fora" uma frustração, violência vivida ou ainda demonstrar poder sobre os outros.
"Muitas vezes, o próprio agressor está em uma situação de conflito, inseguranças, aflições e acaba projetando no outro aquilo que frustra em si mesmo. Mesmo que seja de forma negativa, essa é a maneira da criança expressar que precisa de ajuda", acrescenta Deborah Moss.
Consequências de praticar bullying
Sueli afirma que quem pratica o bullying e não recebe ajuda pode desenvolver problemas psicológicos, ansiedade, estresse e, principalmente, tornar-se mais violenta.
Além disso, de acordo com Deborah, uma vez que é descoberto, a criança pode sofrer consequências sociais, como isolamento, mas também individuais como a vergonha, culpa e, por fim, o arrependimento.
Como ajudar o seu filho que está praticando bullying?
"É necessário cuidar também do agressor. Por mais que ele tenha consciência e seja responsável pelos seus atos, é preciso ir a fundo e buscar uma ajuda psicológica para entender a raiz do problema. Descobrir e resolver o conflito que o mobilizou a ter essa prática violenta", explica a neuropsicóloga Deborah.
Além de enfatizar a importância da criança entender a gravidade da situação e ter alguma punição, o educador Eduardo Calbucci sugere programas estruturados de aprendizagem socioemocional para que a criança lide melhor com a situação e supere isso: "Se esse comportamento continuar na fase adulta, as consequências podem ser desastrosas, inclusive do ponto de vista penal e criminal".
Bullying entre adultos
Mesmo que seja mais comum na infância e adolescência, o bullying também pode acontecer na fase adulta e a motivação será sempre a mesma: alguém que não sabe externalizar uma frustração em forma de diálogo e acaba fazendo isso ao atacar o outro.
"Em situações de trabalho por exemplo, o bullying também pode acontecer, mas é mais velado em tom de brincadeira. Quando tiram sarro de um adulto que é gordo, careca, baixo, muitas vezes se leva em tom de brincadeira, mas a pessoa pode se sentir humilhada e agredida", explica a neuropsicóloga Deborah.
Lei do Bullying
Como forma de combate a essa agressão no Brasil, em 2015 foi aprovada no Senado a ?Lei do Bullying? (lei 13.185/15). A norma obriga a publicação de relatórios bimestrais das ocorrências de bullying nos estados e municípios para planejamento de ações.
Já em 2018, foi criada a lei 13.663/2018 que exige que as escolas promovam medidas de conscientização e combate de todos os tipos de violência, inclusive a prática do bullying.
Além disso, foi promulgada pelo governo federal no final de 2019 a lei 13.935/2019, que determina que as redes públicas de educação básica deverão contar com atendimento psicológico.
Os sistemas de educação terão um ano a partir da data que a lei foi promulgada para desenvolver ações para a melhoria de qualidade do processo de ensino-aprendizagem, atuando na mediação das relações sociais do ambiente escolar.
Como evitar o bullying?
A psicopedagoga Sueli afirma que é importante que tanto a comunidade escolar (professores, coordenadores, diretores, inspetores e outros profissionais), quanto os pais estejam abertos a conversar com as crianças e adolescentes e escutar atentamente suas queixas e reclamações.
Além disso, é interessante estimular que eles relatem sempre que algo acontecer, seja consigo ou com colegas. Nesse sentido, é válido reconhecer e valorizar as atitudes das crianças quando elas atuam no combate ao bullying, protegendo um colega que está sofrendo com o problema, por exemplo.
"Outra ação interessante é criar, junto com as crianças, regras de disciplina, estimular lideranças positivas entre eles, prevenindo novos casos e interferir diretamente, o quanto antes, para quebrar a dinâmica de bullying sempre que for identificado", acrescenta Sueli.
Referências
Elaine Di Sarno, psicóloga especialista em Terapia Cognitivo Comportamental. CRP: 06/89286
Deborah Moss, neuropsicóloga especialista em psicologia do desenvolvimento. CRP:59350-4/SP
Eduardo Calbucci, educador e fundador do Programa Semente
Sueli Bravi Conte, psicopedagoga, educadora, doutoranda em Neurociência e mantenedora do Colégio Renovação.