Redatora especialista em bem-estar, família, beleza, diversidade e cuidados com a saúde do corpo.
A era das redes sociais fortaleceu um fenômeno que já ocorre há vários anos, mas ainda não tinha um nome oficial. "Body shaming", termo em inglês utilizado para definir o julgamento em relação ao corpo de alguém, pode trazer mais consequências negativas do que aparenta, impactando fortemente a saúde de quem lida com esses comentários.
Esse comportamento pode se manifestar de diversas maneiras: comentários ofensivos em fotos, agressões verbais envolvendo a aparência de alguém ou através de olhares e risadas. Apesar desses episódios de ódio serem mais comuns entre celebridades, todas as pessoas estão sujeitas a enfrentarem situações desse tipo - que podem vir até mesmo da própria família.
Para Adriana Drulla, mestre em psicologia positiva e especialista em autocompaixão, um dos fatores que leva alguém a falar ou escrever críticas maldosas em relação a aparência de outra pessoa é a insegurança. Ao criticarem alguém, muitas pessoas se sentem melhor a respeito de si mesmas, já que assim é reduzido o valor do referencial externo do próximo.
"A autoestima é beneficiada quando nos comparamos com uma referência, que pode ser externa ou um ideal interno, e nos sentimos melhores do que esta referência. Ela é o resultado da avaliação que fazemos de nós mesmos. Quando ela é favorável, a nossa autoestima aumenta, e quando desfavorável, a autoestima diminui", explica.
Vergonha do próprio corpo
Um dos impactos mais claros do body shaming é o surgimento de uma forte vergonha do próprio corpo. Ao sentirem medo de ouvir julgamentos, muitas pessoas passam a esconder suas características ou buscam maneiras radicais de mudar a aparência. É comum encontrar pessoas que não vestem trajes de banho quando vão à praia, ou se sentem extremamente culpadas apenas por comerem uma sobremesa.
Adriana conta que, quando sentimos vergonha de nós mesmos, é subentendido que somos inadequados. Ou seja, concluímos que porque tem algo que não gostamos no nosso corpo, somos inferiores. É um julgamento de valor que ultrapassa o aspecto que incomoda do corpo e atinge o autoconceito, a visão global que a pessoa tem de si mesma.
"A pessoa sente que ela não tem valor, e se sente exposta ao julgamento desfavorável do outro - mesmo que isso seja apenas uma fantasia. Uma meta análise de 108 estudos com 22.000 participantes achou uma correlação significativa entre a propensão à vergonha e o desenvolvimento de depressão. Existem outros estudos que mostram também uma relação com o desenvolvimento de ansiedade e distúrbios alimentares", relata a especialista.
Lidando com comentários de ódio
É natural e esperado que busquemos a aceitação do próximo. Mesmo quem considera ter uma boa autoestima pode se abalar ao ouvir uma crítica rígida e inesperada. Essa reação é compreendida pela ciência, demonstrando através de estudos que o cérebro, mesmo que de forma inconsciente, está sempre avaliando as percepções que as pessoas possuem de nós mesmos.
"Os pesquisadores chamam de sociômetro, um termômetro interno que avalia a percepção do outro gerando emoções negativas ou positivas. Mas sabemos que é possível ir além do sociômetro quando nos lembramos, por exemplo, que é impossível agradar a todos. Podemos limitar o número de pessoas cujas opiniões daremos importância. Podemos nos relacionar com pessoas que nos aceitam do jeito que somos e por quem somos", fala Adriana Drulla.
Além disso, é importante lembrarmos que somos imperfeitos e todos possuímos defeitos. A especialista ressalta que este entendimento é um dos pilares da autocompaixão, que consiste em ser gentil consigo mesmo em um momento de dificuldade, já que as nossas inadequações são os fatores que nos fazem humanos, não inferiores ou diferentes.
"A autocompaixão é uma habilidade que pode ser treinada e uma alternativa saudável para a autoestima, já que não depende de um julgamento de valor. Outra dica é lembrar que a crítica à imperfeição vem da aversão que algumas pessoas têm aos próprios erros. A crítica à imperfeição nega a condição humana, que é imperfeita por definição.
Pessoas que criticam as outras não são melhores que ninguém, porque não são menos humanas que as demais. Se você entende que defeitos são normais e comuns a todos os seres humanos, você também entende que o comentário negativo do outro diz mais sobre ele, do que sobre você", conta a mestre em psicologia positiva.
Como identificar o body shaming
Pode ser fácil apontar um comportamento tóxico e negativo quando ele parte de outra pessoa, mas nem sempre percebemos que esse tipo de situação pode estar sendo reproduzida por nós mesmos. Quando não possuímos uma relação saudável com a nossa aparência, o body shaming pode se manifestar como um sinal de defesa.
De acordo com Adriana, uma forma de trazer consciência para este comportamento é entender que se sentir melhor ao diminuir o valor do outro é algo temporário. Isso acontece pois, quanto mais julgamento é feito ao próximo, mais você vai se julgar também.
"O diálogo interno de uma pessoa excessivamente crítica é tão cruel quanto aquilo que ela diz para o outro. É necessário entender que fazer o outro sofrer não melhora o seu sofrimento, pelo contrário. Então, é importante que o crítico acolha as próprias imperfeições, entendendo que elas estão presentes em todas as pessoas. Que acolha as suas inseguranças com gentileza e amor, entendendo que é humano se sentir inseguro às vezes", explica.
Para a especialista, o julgamento constante sobre a aparência alheia pode diminuir quando aprendemos a nos amar como somos, com nossos defeitos e qualidades, entendendo que somos mais do que a estética do nosso corpo. Dessa forma, é possível que nos tornemos menos críticos com as imperfeições das outras pessoas.