Psicóloga e psicanalista. Realiza atendimento de psicoterapia em casal, família, ludoterapia, adolescentes e adultos. Ta...
iRedator de saúde e bem-estar, entusiasta de pautas sobre comportamento e colaborador na editoria de fitness.
Criar, educar e proteger uma criança não são tarefas fáceis. Desde o momento em que um filho chega na família, pais e mães ganham um grande desafio pela frente. Porém, algumas crianças demandam uma atenção ainda maior e um acolhimento especial dos seus responsáveis. Thales é uma delas.
Desde pequeno, o garoto, hoje com 12 anos, teve uma personalidade tímida e, de acordo com sua mãe, sempre apresentou uma rejeição ao universo feminino, rechaçando roupas, brinquedos e até acessórios considerados “de menina”.
Foi durante um almoço em família, no meio da semana, que Thales, com 11 anos na época, decidiu contar aos seus pais que era, na verdade, um menino transgênero. Ou seja, ele não se identificava com o gênero designado no seu nascimento.
Segundo Laura Silveira, que é professora universitária e mãe de Thales, sua primeira atitude foi buscar conhecimento. “A partir de sua fala, eu perguntei como poderíamos ajudá-lo e ele disse que gostaria de se assumir menino. Então, eu me comprometi a me informar e procurar ajuda”, relembra, em entrevista ao Minha Vida.
Como acolher a criança trans da melhor forma?
Assim como Laura, muitas famílias não conhecem muito sobre o processo transsexualizador - especialmente quando ele acontece logo na infância. Por isso, o ideal é buscar informações e aprender sobre a transição de gênero. Dessa forma, é possível auxiliar a criança e solucionar quaisquer dúvidas que ela tenha.
“A minha primeira reação foi perguntar o que meu filho sabia sobre isso. [...] Então, sem saber muito sobre o assunto, meu próximo passo foi me informar sobre um tema que eu, de verdade, não conhecia, sabia muito pouco”, relata a professora, que posta vídeos sobre a transição de Thales em sua conta no Instagram (@mae.adolescentetrans).
De acordo com a psicóloga Margaret Simas, esse processo deve ser sempre acompanhado de amor, afeto e cuidado com o filho. “O importante é acolher com atenção, tentar escutar mais do que falar e compreender qual é a questão da criança”, explica a especialista.
Uma vez envolvida na transição da criança, é importante que a família busque a ajuda de um profissional. Neste caso, é essencial fazer um acompanhamento psicológico com um especialista, a fim de resolver as questões da criança transgênera e auxiliá-la durante o processo transsexualizador.
“O ideal é levá-la a um psicólogo ou um psicanalista que já tenha estudo nessa área, para trabalhar isso tanto na cabeça da criança quanto na da família, dos pais, dos irmãos, porque ainda é algo muito novo”, ressalta Margaret.
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Enfrentando obstáculos
Segundo a psicóloga, é comum que, desde a concepção, a família faça projeções e crie certas expectativas sobre o futuro da criança que está por vir, gerando alguns obstáculos (e frustrações) pessoais.
“As pessoas fazem planos, criam fantasias em relação àquele ser que está sendo gerado. E dentre elas, estão as questões de gênero: se for uma menina, vai ser bailarina, ou se for um menino, vai ser jogador de futebol... Isso envolve desde as coisas mais simples até outros projetos”, exemplifica Margaret.
No caso de Laura, durante o início da transição de Thales, o único obstáculo enfrentado por ela foi o medo. “Medo de ele sofrer, ser rejeitado, enfim, medo de mãe, agravado pelo contexto da violência contra pessoas LGBTQIAP+ no Brasil”, conta.
Em relação à transfobia, a professora afirma que se resguarda com o filho para possíveis situações. “Nunca tivemos que lidar com ataques transfóbicos, embora eu o prepare para essa possibilidade com estratégias que vão do desprezo às ofensas até a denúncia, a depender da situação”, relata.
Além disso, a mãe de Thales ainda reforça como a transgeneridade de seu filho foi bem acolhida no ambiente escolar. “Como era o primeiro ano dele lá, e as aulas estavam acontecendo mais online do que presenciais, Thales já construiu na escola uma identidade que o representa de fato e sempre foi acolhido e respeitado, tanto por alunos quanto por professores”, diz Laura.
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Reação negativa e a saúde mental da criança trans
Em muitos casos, durante a transição, é comum que a criança transgênera apresente angústia, insegurança e dúvidas em relação ao seu corpo e gênero. Por isso, o acolhimento com atenção e afeto são tão importantes para o seu desenvolvimento.
No entanto, nem todas as famílias se mostram dispostas a saber mais sobre o assunto e apoiar a transgeneridade nessa fase. Dessa forma, a reação negativa dos familiares pode impactar significativamente a saúde mental e a evolução da criança.
“Para qualquer criança, a aceitação dos pais é muito importante para a formação e constituição de sua personalidade, para ela ter uma autoestima mais elevada, segurança e confiança. E as crianças trans, em especial, têm uma dificuldade nessa questão. Às vezes, as pessoas esperam e desejam que elas se comportem de um jeito e elas se comportam de outro”, alerta a psicóloga Margaret Simas.
Por isso, o acolhimento parental é essencial para promover um melhor desenvolvimento da autoconfiança da criança trans – e não só durante o processo transsexualizador, mas também ao longo de toda a vida desse indivíduo.
Um ótimo exemplo desse impacto é o reflexo da aceitação de Laura durante a transição de Thales, que experimentou uma melhora na autoestima e o alívio de sua insegurança. “Ele se sentiu muito confiante em sua identidade e segue sendo respeitado sempre, além de ser muito popular e social na escola, comportamento que só surgiu após a transição”, conta a professora universitária.