Vice-presidente da SBIm e ex-presidente da Sociedade (2011 a 2014), especializou-se em pediatria e neonatologia no Hospi...
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A vacina da poliomielite é a única forma de prevenir a doença, conhecida por causar a paralisia infantil. No entanto, a cobertura vacinal nas crianças não tem atingido as metas nos últimos anos, aumentando o risco de que a doença volte a circular no Brasil - o que não acontece há 28 anos.
Segundo dados do Ministério da Saúde, no ano passado, a cobertura vacinal atingiu apenas 77% das crianças de até cinco anos. A meta é vacinar 95% delas. Diante desse cenário, a pasta tem anunciado algumas medidas para retomar a vacinação contra a poliomielite a níveis seguros.
Um desses anúncios é a substituição gradual da vacina da poliomielite oral (VOP), conhecida popularmente como “gotinha”, pela vacina inativada (VIP) a partir de 2024. A decisão foi debatida e aprovada pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunizações (CTAI), que considerou as novas evidências científicas para proteção contra a doença.
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Segundo o Ministério da Saúde, a transição será feita com o objetivo de atingir uma maior eficácia do esquema vacinal. A nova recomendação foi apresentada no último dia 7 de julho pela ministra da Saúde, Nísia Trindade, durante live feita com a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
“A retomada das altas coberturas vacinais é uma prioridade do Governo Federal. Esse é um movimento, não uma campanha isolada, justamente pela ideia de continuidade e pelo constante monitoramento de resultados. Esse trabalho não se restringe ao Ministério da Saúde, por isso estamos indo aonde estão os movimentos da sociedade”, afirmou a ministra.
Como é o esquema vacinal contra poliomielite atualmente?
A vacina contra poliomielite protege a criança de três tipos diferentes de poliovírus, responsável pela doença. Atualmente, existem duas versões do imunizante: a vacina oral (VOP) e a vacina inativada (VIP), que é aplicada através da injeção.
O esquema é feito com a aplicação de três doses da VIP aos 2, 4 e 6 meses. Posteriormente, são aplicadas mais duas doses de reforço com a VOP, versão em gotinha, uma aos 15 meses e outra aos 4 anos de idade.
Como será o novo esquema vacinal, sem a VOP?
Com as novas recomendações, a vacina oral será substituída gradualmente pela vacina injetável. Com isso, as crianças não vão mais precisar tomar reforço aos 4 anos de idade, pois o esquema vacinal feito até os 15 meses será o suficiente.
O médico pediatra e infectologista, Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), explica que há evidências científicas de que apenas quatro doses de VIP são suficientes para trazer a mesma proteção, ou até mais, que o esquema realizado com cinco doses.
“Não há necessidade de cinco doses de vacinas. As três doses no primeiro ano de vida e um único reforço após conferem proteção absolutamente adequada”, afirma Renato.
Por que o desuso da vacina oral é necessário?
O desuso da vacina oral é uma tendência mundial. Países da Europa e os Estados Unidos, por exemplo, já abdicaram do uso da VOP para imunizar suas populações infantis.
“A vacina feita com o vírus enfraquecido [a VOP] teve um grande mérito quando foi introduzida no mundo. O vírus vacinal [atenuado] se reproduzia no intestino do indivíduo vacinado e era excretado. Com as campanhas nacionais de vacinação, muitas pessoas foram vacinadas, o que fez com que houvesse muito vírus vacinal no ambiente. Com isso, as pessoas não vacinadas acabavam se beneficiando dessa proteção indireta que a vacina conferia ao ser eliminada no ambiente”, explica Renato.
Porém, o vírus vacinal pode, em raros momentos, sofrer mutações e fazer o que é chamado de “reversão da virulência”, ou seja, volta a causar paralisia. “Esses vírus podem sofrer uma divergência genética que volta ao estágio anterior, antes do enfraquecimento, e que pode causar paralisia em alguém que não está vacinado”, esclarece o pediatra.
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Diante desse cenário, a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é que todos os países parem de usar a VOP para imunizar a população infantil, a fim de retirar o vírus vacinal do ambiente. “Nós só vamos eliminar a pólio do mundo quando pararmos de colocar vírus vivo no ambiente. Embora isso [a infecção por vírus vacinal que sofreu mutação] seja raro, é mais frequente do que a infecção pelo vírus da pólio selvagem”, afirma.
O Brasil, então, caminha para essa transição e os primeiros passos foram dados há mais de uma década, quando o esquema vacinal passou a ser feito, inicialmente, com três doses da vacina inativada (VIP).