Graduação em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (1984), mestrado em Medicina (Neurologia) pela Universidade...
iRedatora especialista em conteúdos sobre saúde, família e alimentação.
Vencedor de quatro estatuetas no Oscar, o filme Pobres Criaturas conta a história de Bella Baxter, protagonizada por Emma Stone, uma jovem da era vitoriana que é ressuscitada por um cientista através de um transplante de cérebro. O diferencial? O cérebro transplantado para Bella pertence a seu filho que ainda não havia nascido.
O tema despertou dúvidas. Deixando a fantasia do filme de lado, o transplante de cérebro é possível? A resposta é que, mesmo com os avanços da ciência, o procedimento não é uma realidade e dificilmente será viável tão cedo. Isso acontece por diversas razões, a começar pela complexidade da cirurgia.
Por que ainda não é possível realizar um transplante de cérebro?
O cérebro contém aproximadamente 86 bilhões de neurônios interconectados, formando milhões de conexões que controlam as funções do corpo, incluindo as motoras, físicas e mentais. Para um procedimento bem-sucedido, seria preciso conectar todo esse circuito em outro corpo, mais especificamente na medula espinhal, responsável por conduzir as informações do organismo para o cérebro e dele para outras regiões do corpo.
"Não consigo ver perspectivas futuras de tal procedimento. Até creio que transplantar uma cabeça poderia ser mais fácil que apenas o cérebro. Bastaria ter tecnologia para conectar a medula espinal com o bulbo cerebral, última estrutura do cérebro que sai da caixa craniana. A medula espinhal é como se fosse um feixe de fios elétricos, um cabo, que conecta o cérebro com todas as estruturas do corpo. Isso sim é muito difícil de se conseguir", explica Sandro Matas, neurologista na Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo.
Há ainda outro grande impasse: a viabilidade de se ter um doador. Caso fosse possível realizar um transplante de cérebro, ao contrário do transplante de coração, por exemplo, a doação precisaria acontecer de um doador ainda vivo, uma vez que o órgão precisa estar funcional para ser transplantado.
"Nesse caso, a situação é completamente invertida. Por exemplo, eu tenho 63 anos e adoraria ter meu cérebro num corpo de 20 anos. Afinal, nós somos nossos cérebros. Então, nestas condições, ainda precisaremos de um doador 'cadáver', isto é, alguém com morte cerebral para doar o corpo todo. O mais importante é preservar o cérebro, num corpo que estivesse tudo funcionando", aponta Sandro.
Leia também: Doação de órgãos: como funciona, quem pode doar e desafios
É possível retardar as deficiências causadas por doenças neurodegenerativas?
A impossibilidade de um transplante de cérebro atinge diretamente o campo das doenças neurológicas degenerativas, como Alzheimer e Parkinson, já que elas ainda não têm cura definitiva. Elas são caracterizadas pela degeneração progressiva das células nervosas do cérebro e/ou no sistema nervoso, o que provoca deficiências cada vez mais incapacitantes ao longo do tempo.
"Nosso cérebro envelhece junto com o corpo. Nas estatísticas atuais, pessoas com mais de 85 anos de idade terão 50% de chance de ter Alzheimer, sem falar em outras demências, como demência frontotemporal ou por corpos de Lewy. A maioria dessas doenças não têm cura, nem tratamento para retardar ou parar a evolução", finaliza Sandro.
O tratamento, nesses casos, visa amenizar os sintomas, permitindo que os pacientes tenham uma qualidade de vida melhor, mesmo em fases graves.