Formada em psicologia pelo Centro Universitário Paulistano e em psicanálise pelo Centro de Estudos em Psicanálise.Especi...
iFalar sobre perda ou morte é sempre um ponto delicado e muito amplo para todas as idades, além da representação diferenciada que temos sobre ela em cada fase de vida. O medo da morte é sem dúvida um tema que desperta muita curiosidade e talvez seja um dos mais estudados. Mas, nem sempre a ideia de morte é vista com sofrimento ou tabus doloridos. Existem filosofias e hábitos de vidas, pelo mundo, onde a morte é entendida como um processo muito natural e às vezes até mesmo esperada e de certa forma comemorada. Devemos, portanto e com toda certeza, incluir em nossas análises frente a ideia de morte, os processos culturais, o desenvolvimento emocional, religião, família, meio que se vive, bem como o quadro de saúde clinica e saúde financeira (durante a vida da pessoa) para compreendermos de fato as reações frente a morte para cada ser humano, em qualquer idade.
Falar de morte para idosos nos faz crer que primeiramente devemos entender quem são estes idosos, de onde vem, suas crenças e condições de vida, para depois falarmos de suas reações frente a morte, conforme mencionei acima. A fase idosa é um processo de amadurecimento da vida adulta, onde notamos claramente as mudanças físicas. Mas nem sempre as mudanças internas são percebidas com tanta facilidade. É comum as pessoas se surpreenderem com os idosos e suas capacidades de analisar a vida e entender as realidades, com muito mais consciência e, portanto, facilidade que os adultos mais jovens, mesmo que muitas vezes eles tenham suas limitações clínicas.
Questão de perspectiva
A finitude de vida, por exemplo, é normalmente melhor encarada e menos sofrida de se compreender pelos idosos, do que por um jovem adulto ou um adulto de meia idade, pois nesta fase anterior de vida ainda enfrentamos uma forte influencia e pressão do padrão social e cultural que devemos seguir e conquistar. Falo aqui das responsabilidades de ser mãe/pai, esposo(a), profissional. Já com o idoso, este processo de reflexão acaba gerando, normalmente, um fechamento destes papéis impostos pelas sociedade. Os idosos acabam se dando conta de não ter mais que seguir estas obrigatoriedades e o medo de não cumprir tarefas ou atender alguém ou algo tende a diminuir muito.
É bem comum os idosos reagirem com alivio e leveza, com este fechamento de obrigações sociais da vida e se perceberem mais "livres" das pressões. Normalmente estes idosos possuem uma reflexão satisfatória de suas vidas, e por isso tendem apresentar maior facilidade com esta aposentadoria e consequentemente menos receio da morte. Não que eles apresentem menos preocupação, com a morte, mas sim possuem um maior entendimento dela como um processo natural e inevitável de vida. Diferente dos adultos mais jovens e de meia idade que normalmente apresentam maior temor e relutância com esta ideia.
Uma ideia de boa morte, normalmente está ligada a ideia de uma boa vida, boas construções e não ter pendências / dívidas consigo ou com o com outro. Esta satisfação com a vida permite a aproximação da morte com menos tensão e temor. A religião, as tradições ou filosofias de vida tem forte impacto e podem até mesmo ser determinantes nesta análise sobre si mesmo e sua historia.
Alguns idosos podem sentir angustias ou aflições, com o fim destas pressões sociais e esta reação é mais comum com idosos que possuem insatisfação com sua historia de vida (sendo dificuldades financeiras ou saúde ou emocional). Estas pessoas tem a tendência a enxergar este período como uma grande angustia e costumam não aceitar muito bem este fechamento, relutando e sofrendo com o processo. A morte para estes idosos, também costumam ter uma reação muito similar de angustia e relutância.
O outro lado da moeda
Apesar de a morte, muitas vezes, ser entendida como menos tensa pelos idosos, ela possui também uma grande relevância, neste período, visto que sua vida acaba sendo quase toda reorganizada para lidar com esta aproximação da finitude, tanto sua como de seus conhecidos. A morte fica mais clara e passa a ser mais uma das tantas tarefas, de vida, que temos.
Para os idosos um cônjuge costuma ser um importante aliado, portanto a morte de um deles é sem dúvida o luto mais difícil de ser vivido, principalmente se for inesperada ou repentina. Já quando há um processo de adoecimento, a ideia da possibilidade de perda se torna mais evidente, e a realidade se impõe mostrando a necessidade de se preparar para o fim. Ambos, no casal, precisam se preparar e é comum viverem a ideia de luto em vida como despedida.
Quando ocorre a morte de um deles, o sofrimento é intenso e deve ser acolhido pacientemente. Não devemos fingir ou negar este sofrimento, nem mesmo agradecer por este fim, visto que a pessoa estava doente ou possuia muita idade, como tantas vezes ouvimos por aí. Não existe palavra que console ou etiqueta a ser seguida, mas atitudes como estas provocam mais angustia em quem já esta sofrendo. O que devemos fazer é ajudar o idoso a passar por este momento, falar e às vezes chorar, sobre aquele que morreu, resgatar as boas lembranças e desta motivação ajuda-lo a se reencontrar em sua vida, agora, sem sua parceria. Atividades e amigos ajudam muitos a seguir adiante.
É também, comum esperar por certos desejos de que sua morte chegue logo, para se livrar do sofrimento ou para poder ter a chance de reencontrar aquela pessoa querida e necessária em uma pós-vida. Este desejo de morrer, quando se está de luto, aparece mais claramente nos idosos do que em outras fases de vida, visto que eles normalmente já convivem com esta ideia de aproximação do fim, mais que nas outras idades.
Os homens costumam sofrer mais com a morte da esposa, pois normalmente se apoiam com o passar dos anos em suas mulheres para cuidados, rotinas, passatempos e família. Portanto é mais comum uma reação depressiva intensa nos idosos homens, podendo até mesmo adoecerem. As mulheres também sofrem com a perda de seu parceiro, porém desde muito antes do envelhecer a mulher tende a ter outras fontes de relacionamentos com significados fortes, além do marido, como: seus filhos, netos e amigos e familiares. E estes relacionamentos já existentes parecem ser uma forte justificativa para as mulheres enfrentarem com menos sofrimento a perda do esposo. O mundo demonstra, ainda, ter outros motivos para continuar. Assim podemos entender que quem constrói ao longo da vida uma base social, importante, de relacionamentos parece conseguir passar pelo processo de finitude com menos temor.
Volto a lembrar que o modo como lidamos com o processo de morte (nosso ou dos próximos a nós) é resultado de nossa estrutura interna, nosso EU. Os padrões para as reações são firmados desde nossa infância e através de todo nosso aprendizado de vida, inclusive na fase idosa. Talvez a vida, vivida, seja um grande aliado para lidarmos com a morte e que nosso entendimento e reação com a morte é similar ao nosso entendimento e reação com nossa vida.