Redatora especializada em saúde, bem-estar, alimentação e família.
Segundo dados inéditos da pesquisa Vigitel 2012 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) do Ministério da Saúde, aproximadamente 51% da população adulta está acima do peso ideal - sendo que 17% dos brasileiros são acometidos pela obesidade. Desse percentual, boa parte pode estar enquadrada no chamado efeito sanfona, que é o famoso emagrece-engorda-emagrece. A endocrinologista Andressa Heimbecher, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, explica que o efeito sanfona acontece quando há uma variação mair que 1 kg por semana. Também podemos considerar parte desse fenômeno aquela pessoa que sofreu oscilações de peso iguais ou maiores do que 4 kg em um determinado período.
É sabido que a obesidade pode causar diversos prejuízos ao nosso organismo - mas pouco se fala dos malefícios causados pela oscilação de números na balança. Conversamos com especialistas e descobrimos os problemas da retomada de peso e os riscos de fazer dietas sem o acompanhamento de um profissional:
Alterações metabólicas
Quando uma pessoa perde peso muito rápido, mecanismos hormonais são ativados, que sinalizam ao cérebro que a pessoa está passando fome, além de estimularem a redução do metabolismo como forma de poupar energia. "Quando acontece o ganho de peso após uma dieta muito restrita, o corpo ainda mantém o metabolismo mais lento, como se estivesse se preparando para um outro período em que 'vai passar mais fome'", explica a endocrinologista Andressa Heimbecher, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia. Além disso, quando acontece o aumento de peso, geralmente a pessoa ganha mais peso do que antes de ter começado a dieta, pelo mesmo mecanismo cerebral que fica se preparando para outro período de "passar mais fome". Segundo a especialista, o cérebro após o efeito sanfona passa a ignorar os sinais de saciedade que vem do tecido adiposo, como forma de proteção.
Favorece doenças
Aqui o problema é a sarcopenia - que é a perda muscular relacionada às dietas muito agressivas. Quando se faz uma dieta extrema que leva à perda de peso rápida, perdemos massa magra também. "Sabemos que o tecido muscular é importante para reduzir a resistência insulínica", diz a endocrinologista Andressa. Por isso, quando perdemos muito tecido muscular em uma dieta restritiva, e depois ganhamos tecido gorduroso ao engordarmos de novo, é criado um efeito chamado "sarcobesidade" que, segundo a especialista, "é justamente quando uma pessoa tem muita gordura e pouco músculo, ficando com a resistência insulínica alta, o que leva à piora dos quadros de diabetes em quem tem e muitas vezes ao desenvolvimento do diabetes em quem não tem".
Outra doença que piora com o efeito sanfona é a gordura no fígado (esteatose hepática). Quando uma pessoa faz uma dieta radical, pode entrar em estado de cetose - ou seja, o tecido adiposo começa a liberar a gordura estocada para ser usada como energia pelo organismo. A questão é que antes que essa gordura chegue aos órgãos para ser "queimada", ela passa pelo fígado, e muitas vezes quem tem esteatose hepática pode apresentar piora no quadro. "Por motivo semelhante ao da gordura no fígado, muitas vezes os níveis de colesterol ruim podem aumentar em algumas pessoas que apresentam o efeito sanfona, assim como o de triglicérides."
Dificulta o emagrecimento
O nosso tecido adiposo sinaliza ao cérebro quando está cheio e quando está vazio - ou seja, quando você está satisfeito ou quando precisa comer mais. No efeito sanfona, o cérebro passa a ignorar os hormônios que sinalizam que o tecido adiposo está cheio, permitindo que a pessoa coma mais. São adaptações do nosso corpo para não perdermos peso. "Toda vez que queremos emagrecer temos que lutar contra essa proteção do nosso organismo, que interpreta o emagrecimento como um sinal de alerta que, se não for reparado, levará a morte por deficiência de energia", afirma Paulo Giorelli, nutrólogo e diretor da Associação Brasileira de Nutrologia. De acordo com o especialista, nosso organismo foi preparado, na sua evolução, para se proteger do emagrecimento excessivo. "Possuímos mecanismos de defesa contra a perda de peso em maior número e de maior força do que àqueles que favorecem o emagrecimento - esse é um dos motivos que justificam o fato do emagrecimento ser difícil de conseguir e manter."
Implicações estéticas
"Alguns estudos mostram a relação entre alimentos com alto índice glicêmico e formação da acne, outros a ligação entre alterações hormonais e piora da acne", explica a dermatologista, Isabel Martinez, de São Paulo. Isso mostra, segundo a especialista, que o efeito sanfona pode contribuir para o aparecimento e piora do quadro, uma vez que a acne é fruto de alterações hormonais e acontece geralmente por uma ingestão excessiva de alimentos com alto índice glicêmico. Além disso, o estiramento da pele causado pelas oscilações do peso, somado a genética pessoal, pode favorecer as estrias. "A tensão em excesso exercida na área altera as fibras de colágeno da pele, levando a estrias."
O consumo de alimentos com alto índice glicêmico e o efeito sanfona também são vilões da pele jovem. Segundo a dermatologista, o envelhecimento da pele nesse caso se dá por um processo chamado glicação. A reação é simples e todo mundo conhece: na cozinha, os alimentos que formam a cor marrom quando expostos a altas temperaturas - como o pão torrado ou a calda de caramelo ? sofreram uma reação não-enzimática entre açúcares e proteínas. O produto final tem essa cor pois o alimento passou por alterações profundas na sua integridade e nas suas funções.
Esse fenômeno também pode acontecer em nosso corpo. Quando ingerimos uma grande quantidade de açúcar ele se concentra no sangue, podendo entrar em glicação com as nossas proteínas. "Isso danifica nutrientes importante dessa classe, como colágeno e elastina, resultando no envelhecimento da pele, flacidez e outros", diz a dermatologista Isabel.
O efeito sanfona também irá desencadear uma série de processos inflamatórios no organismo, uma vez que a oscilação de peso irá aumentar a quantidade de radicais livres no corpo. "Esse excesso de oxidantes na circulação pode reagir com outras moléculas, danificando células, DNA e novamente as proteínas como o colágeno e a elastina, responsáveis pela sustentação e elasticidade da pele."
Afeta a autoestima e autoimagem
"O ganho de peso após o emagrecimento pode ser visto como um fracasso pessoal, e não como consequência de uma doença crônica, a obesidade", diz o psiquiatra Adriano Segal, diretor de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade (ABESO). Esses julgamentos morais podem ser próprios, como dizeres como "eu sou incapaz", ou vindo de outros, que podem dizer "é só controlar sua boca que você consegue", ou algo no gênero. "É importante que a pessoa se conscientize de que a obesidade é uma doença e que precisa de tratamento crônico, uma vez que não tem cura."
O psiquiatra também explica que há um atraso neurofisiológico para percebermos nossa imagem corporal - normalmente, leva alguns anos para notarmos grandes mudanças em nosso corpo, como a perda de peso. "Assim, emagrecer e engordar rapidamente é mais prontamente percebido por meio de roupas, fotos ou comentários externos do que pela percepção da pessoa, como olhar-se ou no espelho ou para si mesmo", diz. Sendo assim, o efeito sanfona pode nos deixar confusos sobre nossa autoimagem, ou seja, a forma como acreditamos ser. Isso, somado ao sentimento de fracasso que pode aparecer, torna o período do efeito sanfona extremamente difícil para quem o sofre. "Por isso o emagrecimento deve ser acompanhado por profissionais sérios, com avaliação global da saúde e não apenas do número que aparece na balança."
Afeta a imunidade
"Podemos dizer com certeza que engordar além do normal faz sempre mal para a saúde", diz o nutrólogo Paulo. O os processos inflamatórios causados pelo excesso de tecido adiposo podem causar alterações no sistema imunológico, favorecendo o aparecimento de doença. Caso a pessoa não esteja se alimentando bem ou fazendo uma dieta restritiva buscando perder os quilos recuperados, pode haver uma deficiência nutricional que agravará ainda mais esse quadro.
Consequências da falta de acompanhamento
É certo que todo mundo que emagrece corre o risco de ganhar o peso perdido - seja fazendo uma dieta saudável ou um plano de emagrecimento maluco, sem acompanhamento médico e com muita restrição. Entretanto, esse último grupo certamente está mais vulnerável aos efeitos nocivos que esses acontecimentos podem causar.
Restringir grupos alimentares, ingerir uma quantidade muito baixa de calorias ou mesmo ingerir suplementos e outras medicações sem prescrição são atitudes extremamente perigosas. E, mesmo com acompanhamento médico, a necessidade de medicamentos deve ser muito bem avaliada pelo próprio paciente. Além do efeito sanfona e os riscos que o acompanham, você pode sofrer outros efeitos colaterais, como doenças relacionadas à baixa ingestão de nutrientes, problemas renais consequentes do uso excessivo de suplementos e tantas outras complicações. "A escolha tanto de uma modificação alimentar quanto o auxílio de uma terapia medicamentosa devem se apoiar obrigatoriamente na ajuda de um médico", diz o nutrólogo Paulo, da ABRAN.
Para que um tratamento possa fazer bem, é preciso que ele seja prescrito para quem precisa e por quem sabe. Cabe ao paciente relatar ao médico o que está sentindo durante o tratamento para fazer possíveis ajustes nas medicações e recomendações, pois ainda que haja o benefício da perda de peso, o processo de emagrecimento não pode ser algo sofrível, que afete o bem-estar da pessoa.