Médico endocrinologista graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, com residência em Endocrinologia no Instit...
iCertamente você já ouviu falar de alguém que tem excesso de peso mas que tem exames de sangue totalmente normais. Um primo, uma tia, um vizinho ou até mesmo você.
Sabemos hoje, que cerca de 30% da população obesa apresenta-se sem qualquer alteração metabólica. Ou seja, apesar de estarem bem acima do seu peso ideal, não tem pressão alta, glicose elevada ou colesterol elevado. A este subgrupo de pacientes, convencionou-se chamar de obeso metabolicamente saudável, que chamaremos no decorrer desse artigo de OMS.
Apesar de ter sido descrita pela primeira vez na década de 80, até hoje não há uma definição universalmente aceita para a condição, o que dificulta um pouco a interpretação dos estudos publicados. Mesmo assim, estudar pessoas com esta característica pode ser muito útil, uma vez que pode abrir caminho para o tratamento dos obesos não tão saudáveis assim. Ou seja, pode permitir, no futuro, o desenvolvimento de novos medicamentos para pessoas com obesidade e que apresentam as alterações metabólicas tidas como clássicas, relacionadas ao excesso de peso.
Particularidades do obeso metabolicamente saudável
Apesar de não se saber ao certo o mecanismo pelo qual isso ocorra, acredita-se que o OMS não apresente alterações metabólicas em função de ter uma sensibilidade a insulina relativamente preservada. Ou seja, apesar de terem ganhado peso, são indivíduos que não desenvolveram a chamada resistência à insulina.
A reboque disso, não são tão propensos a fatores comuns aos diabéticos, como: a pré-diabetes, diabetes tipo 2, hipertensão arterial (pressão alta), tampouco a terem HDL baixo (o bom colesterol), elevação de triglicerídeos e esteatose hepática (acúmulo de gordura no fígado).
Sabe-se ainda que apresentam uma menor quantidade de gordura visceral (cerca de 49% a menos) do que os obesos habituais, apesar de terem uma mesma quantidade de gordura corporal total. Curiosamente há uma menor quantidade de massa magra e, apesar disso, a força muscular parece ser maior. Estranho, não?
Nem sempre, na medicina, o que faz sentido é o que se observa nos pacientes. A quantidade de gordura subcutânea em geral é a mesma, gordura essa considerada protetora contra doenças metabólicas. Sim, é possível que a gordura nos proteja.
A chamada gordura visceral - localizada mais profundamente no abdome, entremeando órgãos vitais como pâncreas, fígado, coração (gordura epicárdica) - nos torna mais propensos a ocorrência de diabetes, hipertensão e dislipidemia enquanto que a gordura subcutânea nos protege. E é, justamente por isso, que existem, por outro lado, os chamados "magros metabolicamente obesos". Pessoas com índice de massa corporal normal, porém que apresentam péssimos exames de sangue, apresentando quadros como: pré-diabetes, diabetes tipo 2, hipertensão arterial, HDL baixo e triglicerídeos elevados.
São pessoas que, de maneira geral, apresentam aumento da quantidade de gordura visceral e redução da quantidade de gordura periférica. Em outras palavras, pernas finas, pouca gordura em glúteos, culotes e braços, porém com bastante gordura acumulada em fígado, músculo, pâncreas e coração.
Existe algum benefícios da perda de peso nos OMS?
Alguns estudos mostram que a perda de peso neste subgrupo de pacientes, muitas das vezes não se associa a uma melhora no perfil lipídico e nem na sensibilidade à insulina. Em alguns trabalhos, observa-se até mesmo piora da resistência à insulina.
No entanto, não se engane! O chamado OMS, talvez não seja lá tão saudável assim. Estudos recentes, mostram que estas pessoas têm um risco de mortalidade por todas as causas maior do que o da população não obesa. Em um estudo no qual 1.758 homens de meia idade foram acompanhados por 30 anos, os chamados OMS apresentaram um risco para eventos cardiovasculares e morte maior do que os indivíduos não-obesos.
Além disso, os chamados OMS, apesar de não apresentarem complicações no âmbito metabólico relacionadas ao excesso de peso, podem sim apresentar complicações não metabólicas. Complicações ditas mecânicas relacionadas à obesidade. Por exemplo: osteoartrose de joelhos, hérnias de disco e apneia obstrutiva do sono.
Outro ponto importante a ser levado em consideração é o fato de que muitos destes pacientes, quando acompanhados ao longo dos anos, acabam desenvolvendo as complicações metabólicas, inicialmente ausentes. Daí ter ficado famosa na endocrinologia a frase: "Obeso metabolicamente saudável, até quando?"
Recomendações
Sendo assim, podemos afirmar sem medo de errar que é fundamental modificar hábitos mesmo nos obesos sem alterações metabólicas. Dieta e exercício já!
O mesmo que se recomenda para os obesos "tradicionais" deve ser indicado para os OMS. Mais uma vez voltamos ao princípio que norteia a endocrinologia: uma dieta equilibrada e um programa de exercícios são a base de tudo. Isso vale para o tratamento da obesidade, do diabetes, do colesterol elevado e da pressão alta.