Formada em psicologia pelo Centro Universitário Paulistano e em psicanálise pelo Centro de Estudos em Psicanálise.Especi...
iSabemos que ao desejarmos um relacionamento amoroso com alguém, sendo namoro, casamento ou mesmo um rolo, que seja, trazemos no conjunto nossas histórias passadas, nossas vivencias, conquistas, decepções de vida pessoal, familiar, profissional e claro, amorosa. Assumir esta bagagem do(a) parceiro(a), por mais natural que seja, nem sempre acontece de forma consciente ou mesmo de forma satisfatória. E ao mesmo tempo em que este tema pode parecer tão simples ou básico para muitas pessoas e casais, para outros já foi (ou é) a causa de muitas discussões, conflitos e até separação.
Quando nos envolvemos ou assumimos uma relação, trazemos uma necessidade de administrar as bagagens históricas, tanto a de nosso pretendente como a nossa própria. Engana-se aquele que pensa: "Eu sou assim e pronto. Essa é minha vida e pronto, o outro tem que me aceitar do jeito que sou". Esse pensamento individualista é o primeiro passo para que uma relação não dê certo e para que não haja envolvimento entre o casal.
Administrando as bagagens
Uma boa relação amorosa sugere que o casal saiba como juntar suas bagagens de vida, conseguindo administrar suas histórias anteriores, com as atuais e as futuras sem causar sofrimento ou mal estar no outro que está ao nosso lado.
Mas como fazer isso? Devemos simplesmente encarar de forma tranquila a história de vida que outro teve antes? Devemos falar sobre o passado para por um ponto final ou para tentar aprender conviver com a ideia? Melhor não falar nada e deixar cada um com sua história?
Estas são perguntas que jamais possuirão uma resposta técnica ou única. Na verdade cada pergunta só pode ser considerada a partir de cada situação, conforme a relação deste ou daquele casal. Melhor ainda, conforme cada pessoa. Já ouvi uma grande diversidade de respostas e a melhor é sempre aquela que gera o melhor para si e para o casal.
Quando a bagagem traz problemas
O tema gera conflitos, quando mal administrado. Temos que admitir que lidar com isso, naturalmente, nos leva a ideia de certa insegurança ou ciúmes. As experiências passadas da pessoa amada nos colocam em contato com um fato delicado, que este ?nosso alguém? já foi alguém de outro também. Já sorriu, sentiu prazer, talvez muito prazer e já fez planos com este(a) outro(a), isto é, já desejou outro em seu lugar de hoje. Assim como no inverso, já fomos plano de outra pessoa ou mesmo já o fizemos com outra pessoa e é natural que estas lembranças (sendo boas ou ruins) passem pela mente de vez em quando, pois possuem local especifico em nossas lembranças e em nossas vidas.
O conflito normalmente surge porque muitas vezes não abrimos de fato um espaço para a bagagem do outro em nossa vida. Por vezes ficamos desconfortáveis, inseguros e assim acabamos negando e fantasiando uma ideia de exclusividade com esse alguém daqui por diante e ignoramos seu passado, suas histórias e construção de vida. Esta atitude não costuma ser nada saudável para a relação. Ignorar, fingir ou negar, no geral, acaba tendo uma reação inversa, pois sabemos que há algo mais para ter acesso e ficar se escondendo da realidade pode gerar uma diversidade de angustias, crises de ciúmes, desconfianças exageradas, cobranças ou comparações e dificilmente uma relação sobrevive saudavelmente a isso.
Outro ponto gerador de conflito ao casal é quando nós não queremos abrir mão de nossas experiências vividas e ficamos carregando nossa bagagem por onde formos. Deixando sempre muito próximo a nós e a nossa relação ?um terceiro? mesmo que na lembrança. Sabe aqueles casos onde se vive falando, lembrando, elogiando ou mesmo criticando um ex? Isso pode demonstrar que a pessoa ainda não se desapegou do passado e não abriu espaço para o outro. Talvez tenha medo de abrir mão de parte de sua vida ou tenha receio de apostar no novo. Também pode estar utilizando essa lembrança como fuga e disfarce para não lidar de fato com os momentos delicados que enfrenta em sua nova relação. Neste caso, não somente o lado que recebe, mas também o dono da bagagem deverá aprender a administrar suas histórias. Deverá aprender a se livrar do excesso e ficar só com o necessário, liberando espaço para construir uma nova história.
Afinal, como administrar essas bagagens?
O melhor, sempre é tentar entender o que acontece com você: por que está tão difícil para você? Pois provavelmente o que mais te dói não é a história do outro e sim suas próprias questões emocionais identificadas nas histórias de seu/sua companheiro(a). Temos nossas histórias antigas e talvez nos orgulhemos ou lembremos com carinho e até saudosismo de algumas e isso parece mais que natural. Assim como podemos ter experiências tristes e traumáticas que nos impedem ou travam novas oportunidades.
O que vale considerar é que quando sobrecarregamos o outro com nossos conteúdos, isso demonstra nossa falta de organização emocional sobre nossa vida, não somente do passado. E isso merece atenção para que o casal possa ficar bem.
Acredito ser importante ressaltar, que normalmente estamos prontos para falar, analisar e apontar a bagagem do outro. Mas, já nos perguntamos o que fazemos com a nossa bagagem e nosso excesso de conteúdos? Como saber o que pode ou deve ficar ao alcance do nosso(a) novo(a) companheiro(a)e o que deve ser arquivado?
Colocar-se no lugar do outro geralmente costuma ajudar e muito a tomar nossas decisões e a respeitar quem está conosco. Pensar sobre aquilo que nos sobrecarrega e aquilo que suportamos pode nortear a administração de nossos conteúdos e nos ajudar a liberar espaço para o novo. Bem como ouvir o que outro acha, sente e pensa a respeito, ajuda muito saber como lidar.
Todas as experiências de relacionamentos que vivemos desde nosso nascer (relação com mãe, pai, irmãos, amigos, professores, chefes, namorados...) possuem interferência em nossas vidas e por vezes são fundamentais para explicar, às vezes até determinar nossos atos, gostos, medos e escolhas. Pensando por esta linha, de sugestão psicanalítica, podemos dizer que naturalmente temos ou somos uma bagagem que carregamos por toda nossa vida. E mesmo que venhamos mudar nossas atitudes e escolhas na vida, essa bagagem tende a continuar conosco, por fazer parte do que há de mais intimo em nossa existência, o nosso EU. E isso é o que temos para oferecer e para receber. O termo bagagem não precisa necessariamente sugerir peso, ou sobrecarga. Mas vai depender e muito de cada pessoa que constitui o casal.
Ouvi recentemente que para lidar com a bagagem emocional da vida em uma relação amorosa devemos ter generosidade e humildade. Generosidade para abrir espaço ao conteúdo do seu/sua parceiro(a) em sua vida e com um bom acolhimento. E humildade para levar o seu conteúdo até ele(a) também solicitando espaço e acolhimento.
Imagino assim, que juntos conseguirão através do respeito encontrar o limite ideal e a melhor forma de organização do passado em suas vidas. Podendo até tirar proveito e bem-estar de certas histórias. Por que não?