Danilo Höfling é endocrinologista e doutor em ciências pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. É Membro...
iIndependentemente da causa que tenha levado à remoção cirúrgica da glândula tireoide (tireoidectmia), o resultado será a falta de seus hormônios, ou seja, o hipotireoidismo. O organismo humano necessita dos hormônios tireóideos (T3 e T4) para funcionar corretamente, pois são eles responsáveis, entre outras coisas, pelo aumento da velocidade das reações químicas. Portanto, na falta desses hormônios, o metabolismo ficará mais lento.
Entre as várias causas de hipotireoidismo, encontra-se a tireoidectomia. Algumas vezes, apenas uma parte da glândula precisa ser retirada (tireoidectomia parcial), mas neste artigo vamos tratar, exclusivamente, da tireoidectomia total.
Diversas são as doenças que podem levar à necessidade de sua remoção (Fig. 1). Por exemplo, quando há suspeita ou confirmação de um câncer de tireoide, a opção terapêutica é, geralmente, a tireoidectomia total.
A indicação de cirurgia pode ocorrer, também, na presença de bócio. O bócio é definido como o aumento de volume da tireoide. E este aumento da glândula pode ser causado por diversas doenças, como a presença de um ou mais nódulos, as inflamações (tireoidites), a carência de iodo na alimentação, o aumento causado por estímulo de anticorpos (doença de Graves), etc. Mesmo que o bócio seja causado por uma doença benigna, a tireoidectomia pode ser necessária quando ele for grande o suficiente para causar compressão das estruturas próximas à glândula, levando à dificuldade de engolir, de respirar e, inclusive, à rouquidão.
Embora seja incomum, a tireoidectomia pode ainda ser indicada por motivos estéticos, quando o tamanho do bócio causar grande desconforto ao paciente.
A tireoidectomia é, atualmente, um procedimento seguro, que apresenta baixa taxa de complicações, quando realizada por cirurgiões experientes. Entre as possíveis complicações que, felizmente, são pouco frequentes, pode-se citar a lesão das glândulas paratireoides (quatro pequenas glândulas localizadas atrás da tireoide que produzem o paratormônio, o qual eleva os níveis de cálcio no sangue) e a lesão de um nervo, denominado laríngeo recorrente, principal responsável pelo funcionamento das cordas vocais. A lesão das paratireoides pode resultar na falta do paratormônio e, consequentemente, queda dos níveis de cálcio no sangue. Na grande maioria das vezes, a redução do cálcio é temporária, porém, em poucos casos, é persistente, necessitando suplementação contínua. O dano aos nervos laríngeos recorrentes é raro, mas é uma das complicações mais temidas da tireoidectomia, pois pode ocasionar alterações definitivas da voz.
O tratamento de reposição é realizado com a levotiroxina (T4) sintética por via oral uma vez por dia. O comprimido deve ser ingerido de 30 minutos à uma hora antes do café da manhã, já que os alimentos podem dificultar a absorção deste hormônio. Também se deve aguardar, pelo menos, 4 horas para tomar outros medicamentos que possam atrapalhar sua absorção.
Quando o hormônio tireóideo é utilizado de forma correta, sob a supervisão de um médico experiente, não haverá nenhum prejuízo à saúde ao longo do tempo. Contudo, se o indivíduo não tomar regularmente os comprimidos ou mesmo suspender o tratamento, os sintomas e sinais do hipotireoidismo (Fig. 2) inevitavelmente aparecerão.
Ainda há um grande mito relacionado ao período pós-tireoidectomia, porque, em geral, os portadores de hipotireoidismo tendem a ganhar peso. Entretanto, isso não se justifica desde que a reposição hormonal seja empregada de maneira apropriada. Dessa forma, os indivíduos que foram submetidos à tireoidectomia somente ganharão peso se não seguirem o tratamento recomendado.
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Especial atenção é necessária para as gestantes, uma vez que a falta dos hormônios tireóideos durante a gestação pode aumentar o risco de problemas para o feto e para a mãe. É imprescindível que a levotiroxina seja ingerida regularmente. Além disso, é importante saber que a necessidade dos hormônios tireóideos aumenta durante a gestação e, dessa forma, as doses de levotiroxina precisam ser corrigidas ao longo da gravidez.
Vale mencionar, por fim, que a retirada da tireoide, bem sucedida, não requer mudanças especiais na dieta ou no estilo de vida. De fato, há o inconveniente do uso continuado de hormônio tireóideo sob supervisão médica, mas, fora isso, a pessoa poderá levar vida normal.
Figura 1. - Algumas indicações para a tireoidectomia
- Câncer de tireoide suspeito ou confirmado por biopsia aspirativa
- Bócio com sintomas compressivos
- Hipertireoidismo causado pela doença de Graves ou por um ou mais nódulos
- Motivo estético
Figura 2. - Principais manifestações clínicas do hipotireoidismo
- Aumento da pressão arterial diastólica
- Aumento de peso
- Bradicardia (redução da frequência de batimentos cardíacos por minuto)
- Cabelos secos e frágeis
- Câimbra
- Cansaço
- Constipação intestinal
- Depressão
- Derrame pericárdico
- Derrame pleural
- Diminuição da memória
- Diminuição da fase de relaxamento dos reflexos dos tendões
- Dispneia (sensação de falta de ar)
- Alterações do ciclo e do fluxo menstrual
- Dor muscular
- Edema atípico da pele causado por infiltração de glicosaminoglicanos
- Edema de face, especialmente das pálpebras
- Edema de mãos, pernas (que não deprime após a compressão) e pés
- Espessamento da língua
- Fraqueza
- Aumento do colesterol total e incremento do LDL colesterol
- Redução do sódio no sangue
- Intolerância ao frio
- Mãos e pés frios
- Parestesias (formigamentos)
- Pele seca, delgada, pálida ou amarelada (excesso de caroteno - carotenose)
- Piora de apneia do sono
- Queda de cabelos e/ou pelos
- Raciocínio lento
- Redução da acuidade auditiva
- Redução da transpiração
- Rouquidão
- Sonolência.