Formada em psicologia pelo Centro Universitário Paulistano e em psicanálise pelo Centro de Estudos em Psicanálise.Especi...
iAs relações e comunicações virtuais são uma realidade, e tudo indica que vieram para ficar e transformar. Por conta desta nova realidade global, estamos também vivendo ou presenciando muitas questões, conflitos e claro sucessos ligados diretamente à facilidade que este avanço nos trouxe.
Costumo receber muitas perguntas e relatos, às vezes positivos e outras vezes o inverso, envolvendo a vida das redes sociais e a vida amorosa das pessoas. E o mais comum que percebo é que as pessoas acabam tentando explicar seus conflitos ou suas conquistas de uma maneira técnica, ou seja, acabam acreditando ou pensando que a vida virtual é a salvação ou a destruição de suas vidas.
Nessas situações, a virtual se torna a garantia para se ter alguma relação (amorosa ou amizade) ou então é apontada como o grande problema das relações reais, pois impede ou atrapalha a convivência das famílias ou casais.
Na verdade, as duas situações são um problema! Viver uma vida virtual e de redes sociais para se satisfazer é muita fantasia, é um grande sinal de que há dificuldades em suas relações na vida real. Assim como acusar que a vida virtual seja a causadora dos problemas é negar suas responsabilidades reais frente a seu relacionamento.
Se há conflitos entre o casal por conta das redes sociais ou vidas virtuais, o que devemos refletir é que provavelmente já possuíam alguma dificuldade em suas vidas íntimas. Talvez questões que gerariam adiante ou até já geravam algum conflito na vida amorosa, mas que ganharam força ou apoio para aparecer com a facilidade da tecnologia e das vidas virtuais e redes sociais.
Há histórico de casais e famílias que mal se falam, que se traem, que tem vidas paralelas, segredos e etc - e através das redes sociais essas questões podem ganhar força. Assim como também há pessoas muito ciumentas, perseguidoras, possessivas, que querem/precisam das senhas, querem ter livre acesso a vida virtual de seus companheiros, ou querem uma conta conjunta pois temem perder seus amores, sentem ou acham que estão sendo deixados, que correm riscos, pois se sentem pouco valorizados.
E aqui chamo a atenção para pensar: vocês acreditam mesmo que esses históricos somente acontecem porque estamos na vida virtual ou redes sociais hoje em dia, ou já acontece na história da humanidade há tempos?
O que chama e muito a atenção é o fato das pessoas redirecionarem ou terceirizarem suas responsabilidades, seus medos, suas atitudes ou falta delas na sua vida amorosa acusando uma via de comunicação! Hoje são as redes sociais, mas já foi a TV, já foi a roda de amigos, o trabalho...
O que na verdade é a questão real no conflito deste casal, é a curiosidade do que o seu/sua companheiro/a faz e com quem faz, quando não está com você! Muitos casais apresentam dificuldades de lidar com essa ideia de que seu/sua companheiro/a possui outros interesses além do amor do casal.
Há casais que não suportam e não permitem a ideia de saírem sozinhos, pois necessitam de certos poderes e controles sobre a relação e sobre os movimentos que o outro tem ou terá, determinando onde, com quem e quando estarão, inclusive na vida das redes sociais. São pessoas que sofrem com a ideia de perda e insegurança.
Um grande fator da insegurança na relação é uma necessidade básica de todos nós, independente cultura, gênero e idade: A atenção!
Necessitamos em todos os momentos da vida (em alguns mais, e outros menos) receber o olhar, o interesse, a participação e a atenção de outra pessoa em nossa vida. Pois é através deste olhar que podemos perceber se somos amados, queridos, importantes. Se estamos errados, se precisamos melhorar, se vamos continuar juntos...
Logo o que estou propondo aqui para pensar, é que a ideia de que dificuldades, conflitos, controles e ciúmes nas relações não são provocadas pelas redes sociais em si, como muitos veem apontando de uns tempos para cá. Mas através delas podemos sim enxergar muitas questões que podem estar assombrando nossas relações há tempos.
A experiência de dividir uma relação a dois, com mais alguém/o mundo, acontece em nossa vida desde que somos muito pequeninos (bebês) e desde esta época é muito comum demonstrarmos que não gostamos da ideia. Basta olhar um bebê com sua mãe: durante um bom tempo de vida eles se bastam, e quando o bebê começa a notar que a mamãe possui outros interesses além dele (como o papai, irmãos, trabalho...) é muito comum que chore e demonstre bronca desses outros, pois sente que está perdendo ou correndo riscos na sua relação de amor e procura fazer de tudo para estar com ela, tomar posse e afastar os demais.
Todos nós temos registros e experiências de posse, ciúmes, medos, perdas, conquistas na vida e a forma com que esses registros acontecem é que poderão dizer se terão interferência ou não durante nossa vida. E são experiências que continuam acontecendo durante toda a vida se repetindo ou tendo a chance de mudar algo.
Levando em consideração este conteúdo, acredito valer algumas reflexões aqui:
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- Será que eu aguento ver meu companheiro desviando seu olhar para outras pessoas? (E não falo aqui de traições, mas sim de convivências sociais, amigos, trabalho, família, redes sociais)?
- Será que sei/consigo dividir e confiar que não estou perdendo, sendo traído, enganado, esquecido?
- Será que consigo manter relações diversas (ter amigos, colegas...) e ainda sim direcionar um olhar atencioso para um alguém mais especial?
- Será que consigo me dividir, ter relações amistosas na vida real ou redes sociais e ainda sim não me perder ou não esquecer daqueles que estão em minha vida real?
Hoje em dia, as redes sociais testam essas perguntas com muita intensidade. E as perguntas ou respostas são formas de pensarmos sobre nossas reações e atitudes (assim como de nossos parceiros) diante de nossas relações amorosas.
O que garante a tranquilidade do casal para conviver com o mundo externo, real ou virtual, é a confiança. E esta não é algo que se sinta ou acredite, simplesmente porque quer, pois não é algo pronto ou algo que se possa cobrar ou esperar de alguém. A confiança é algo construído conforme a historia que vivemos e os registros dela em nossa vida. Tanto durante nossa infância, como também na fase adulta, conforme as pessoas que convivemos e conforme nossos amores. A confiança surge quando um outro demonstra ser confiável e isto é acontece através de uma atenção real recebida. Agora, quando estamos nos esforçando para confiar, vale e muito pensar que isso já é um sinal de que não confiamos no outro ou em nós mesmos, e este talvez seja esse o maior conflito da relação. Faz sentido?