Psicóloga formada em 1998 pela Faculdade de Ciências e Letras, com validação e equivalência de diploma pela Universidade...
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A sociedade nos faz acreditar que precisamos ser sempre campeões. Música, literatura, propagandas e filmes exaltam os momentos de sucesso e inferiorizam os reveses da vida. Parece que não existe outra opção a não ser a felicidade. Se por um lado esse ímpeto pode trazer motivação para conquistar objetivos, por outro lado, gera nas pessoas a sensação de que é necessário obter bons resultados em tudo que se faz.
A partir do momento que se cria um parâmetro do que é ser feliz e bem-sucedido, inevitavelmente surgem os sentimentos de comparação. E esse tipo de sentimento pode trazer vontade de não apenas ser melhor, mas também destacar-se mais do que os outros. Criando assim uma ânsia para sempre colher vantagens individuais e se esquecendo do coletivo. Ao fazer isto e muitas vezes sem intenção consciente, pode-se desenvolver um comportamento manipulador.
Quais são as características de um comportamento manipulador?
Apresentar um comportamento manipulador é algo que pode acontecer com qualquer pessoa e, salvo raras exceções, dificilmente será um comportamento voluntário. De acordo com a psicóloga Adriana de Araújo, nos tornamos manipuladores porque em certos momentos de nossas vidas interpretamos situações e vivências como ameaçadoras à nossa existência. "Queremos estar sempre um passo à frente de tudo, e assumir o controle total para que nos sintamos mais seguros. Mas isso nos esgota psicologicamente, e nos coloca em um estado defensivo constante", analisa.
Segundo ela, algumas características fazem com que as pessoas desenvolvam uma personalidade manipuladora. "Às vezes podemos agir de maneira egoísta e não perceber que a pessoa ao lado é alguém com sentimentos e desejos, assim como nós somos. Pensar que as pessoas estão presentes em nossas vidas apenas para oferecer algo é um sinal de que algo pode estar errado", explica a psicóloga.
Quando se manifesta um comportamento manipulador, de acordo com Adriana, o outro passa a ser visto como como peça de um quebra-cabeça. Esse tipo de estratégia de manipulação pode ser direta ou indireta.
Manipulação direta
A manipulação direta se dá pela imposição de ideias a determinado indivíduo. Nessa situação, ofensas, tom enérgico e até agressões físicas podem ser usadas para conseguir o que se quer, de forma que, em alguns casos, pessoas são colocadas em situações humilhantes apenas para deixá-las fragilizadas.
Veja exemplos da manipulação direta no cotidiano:
- "Se você não fizer o que eu quero, iremos terminar", ou então "Se terminarmos, você nunca encontrará alguém tão bom quanto eu" são frases que podem ser usadas para manipular alguém em relacionamentos, por exemplo
- "Qualquer um pode fazer isso", é um exemplo de frase que menospreza as qualidades do próximo e o inferioriza, podendo ser usada para fazer a pessoa acreditar que precisa de ajuda, que não é capaz de fazer sozinha
- "Pare de ser dramático" é uma fala que, dependendo da situação, pode ser uma forma de fazermos com que as pessoas ignorem seus sentimentos e sintam que estão reagindo exageradamente frente a um problema concreto.
Manipulação indireta
Mais frequente que a anterior, a psicóloga Adriana conta que na manipulação indireta o indivíduo que é o alvo do comportamento manipulativo tem seu poder de fala excluído, sem espaço para que suas ideias, opiniões e desejos sejam expressados. "É comum que ocorra a chantagem emocional, isto é, um indivíduo que apele aos sentimentos para conseguir o que quer, e caso não consiga, irá fazer com que o outro sinta-se culpado. Cria-se um mal-estar emocional, um estado de mente onde temos sentimentos de dúvida sobre nossa capacidade, além da insegurança para tomar atitudes", explica Adriana.
Exemplos da manipulação indireta no cotidiano:
- "Se fizermos as coisas do meu jeito, será melhor para nós" é uma frase que evidencia esse tipo de manipulação, que coloca as necessidades do outro em segundo plano de maneira sutil. Pode parecer que você está pensando no bem estar do próximo, quando na verdade, você pode estar excluindo suas opiniões e sentimentos
- "Olha o que você me fez fazer" também pode ser um dizer manipulativo, já que você transfere a responsabilidade de suas ações para alguém que não tem o poder de te fazer tomar decisões
- Dizer "eu apenas fiz isso para ajudar" quando na verdade fizemos algo intencionalmente para prejudicar alguém, é uma forma de atingirmos nossos objetivos utilizando os meios que julgarmos necessários sem que tenhamos que enfrentar as consequências disso.
Manipulação sutil
Há também quem possa manipular os outros de maneira delicada ou até mesmo doce. Podem ser usadas críticas em meio à elogios, de forma que, por mais que você se sinta confortável com seu rendimento em determinado assunto, você não terá satisfação total no que realizou, porque há entrelinhas, um defeito indicado pelo outro. Este defeito indicado pode não ser válido, sendo colocado em meio a uma fala agradável para causar o desconforto a quem os argumentos são direcionados.
Consequências do comportamento manipulador
Vale dizer que, ainda que existam diferentes formas de manifestar uma conduta manipulativa, por trás desse comportamento geralmente existe um sentimento que todos nós já experienciamos: a insegurança. Sim, indivíduos que apresentam esse tipo de comportamento são incapazes de lidar com situações em que seus desejos não foram concretizados, e portanto, usam a ferramenta da manipulação.
O comportamento manipulador é tóxico tanto para quem realiza, pois configura suas relações com base no que os outros podem lhe oferecer, quanto para quem convive com esse tipo de dinâmica. Isso porque o comportamento manipulador faz com que a pessoa tenha uma conduta imprevisível, dificultando o relacionamento.
Além de não ser uma situação confortável, muitas vezes, a pessoa que está sendo manipulada não quer mais passar por isso - o que pode culminar em um afastamento ou até um conflito maior.
Manipulador: Eu?
Quando uma pessoa descobre que pode estar apresentando um comportamento manipulador, é comum ela se sentir assustada, insegura ou em negação. Esses sentimentos são comuns. Em alguns casos, a sensação de culpa é quase instantânea. Mas acredite, de acordo com Adriana, com auxílio profissional, autoconhecimento e investigando as causas que motivam o comportamento manipulativo, é possível obter bons resultados.
É importante dizer que todos somos um pouco manipuladores nas pequenas ações do cotidiano, porque no fundo, é inevitável querer priorizar a nós mesmos - e isso é normal e até importante, porque não podemos nos colocar em segundo lugar o tempo inteiro. O problema é quando isto se torna um instinto de sobrevivência, onde só nós podemos colher os benefícios das situações.
Caso você se identifique com as características, procure ajuda e tente ser honesto consigo. Tenha em mente que ninguém se comporta de determinadas maneiras sem ter um viés por trás. Procure refletir sobre o porquê disso estar acontecendo, sem se esquecer de que sempre há alguém que é afetado pela manipulação. Perceber a situação é um primeiro grande passo para a transformação.
É importante se policiar
Ao perceber que pode estar se comportando de forma manipuladora, não sinta-se envergonhado, e sim motivado a melhorar. Grande parte de nossas culpas e aflições vêm da esfera social, e é importante trabalhar nossa autoestima, para que tenhamos confiança de ser quem somos, sem nos preocupar com a validação coletiva.
Quando deixamos de almejar estarmos sempre certos, é sinal de que somos pessoas seguras, dispostas a aprender com os erros, e que não precisaremos, de agora em diante, usar métodos que reprimam as pessoas para garantir o nosso bem estar.