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Ouvir que nascemos sozinhos e morreremos sozinhos pode ecoar dentro de nós de maneira assustadora. Ao refletir sobre nossos vazios, nos deparamos com o medo da solidão. Para cessar este tormento, buscamos por saídas. E para muitos de nós, a resolução definitiva para nossos desconfortos pode ser ter alguém ao nosso lado.
Então, partimos em uma jornada de expectativas quebradas a procura de alguém, um caminho que nos deixa com marcas de frustração. Mas a vida não precisa ser sempre assim. Optando pelo caminho da autoaceitação, você pode construir forças ao longo do tempo, olhar para dentro de si, gostar do que vê e ter a consciência de que somos tudo o que precisamos.
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Por que temos a necessidade de ter alguém ao nosso lado?
Para a psicóloga Milena Lhano, é comum que as pessoas sintam dificuldade em estarem sozinhas. Como consequência, acabamos adquirindo uma necessidade de ter relacionamentos que preencham nossas lacunas. "Sentir-se abandonado e desprotegido também potencializa a vontade de possuir um vínculo amoroso", explica.
Entretanto, estes sentimentos não vão embora com um relacionamento. É possível cobrir alguns vazios, mas eles ainda estarão lá, como a poeira debaixo de um tapete. Lidar e aceitar estes vácuos é um processo doloroso, porém necessário. Segundo Dayane Fagundes, psicóloga chefe da FalaFreud, o primeiro passo para a autoaceitação é o autoconhecimento.
A especialista afirma que, quando conhecemos quem somos, não projetamos nossas frustrações e desejos no próximo. "O outro não será capaz de te fazer feliz, isso só você pode fazer. E mesmo assim, às vezes nem nós mesmos conseguimos", reitera.
Abandonar a idealização de que o próximo irá nos completar é um passo imprescindível para ancorar nossa autoestima. Segundo Dayane, sentir-se completo é abraçar todas nossas polaridades, isto é, todos aspectos de nossa essência. Dessa forma, não nos sentiremos vazios, pois estaremos vivendo em nossa totalidade.
Milena Lhano afirma que uma parcela de nossas idealizações amorosas se originam pela cultura. Contos de fada, novelas, livros e filmes vendem um modelo de felicidade. Mas acima de tudo, o convívio familiar, as cobranças sociais e as necessidades emocionais são as que mais nos tornam dependentes do outro.
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Criando independência e amor próprio
Independência e amor próprio são processos graduais. Dayane Fagundes afirma que descobrir o que gostamos de fazer, o que nos faz felizes e como queremos viver são etapas importantes na descoberta de nossa autonomia. "Tudo isso deve independer de um relacionamento", afirma.
Reformular o que não está bem é necessário. Segundo a psicóloga, algumas pessoas podem, de maneira inconsciente, procurar relacionamentos em momentos de insatisfação para balancear os sentimentos. "Se estiver descontente profissionalmente, ao invés de aliviar a angústia com uma pessoa, você pode trabalhar a força de procurar a profissão ideal ou um local que reflita seus valores", exemplifica.
Cultivar nossa autenticidade também é importante. Devemos estar com alguém que nos aceita pelo o que somos. Para Dayane, isto não significa inflexibilidade ou egoísmo. Mas sim, que precisamos nos posicionar sempre que sentirmos a necessidade.
Relacionamentos perfeitos não existem. Todos eles vêm com grandes desafios. Mas segundo a psicóloga, é importante que o amor e o respeito supere as diferenças. "O amor é de graça, ele não cobra e não impõe, ele apenas acontece", conclui.
Confiando que podemos ser felizes sozinhos
"A sociedade reforçou a crença de que o certo é construir uma família. Mas o certo é existir todos os tipos de pessoas no mundo: Solteiros, casados, pais e não-pais. Isso significa equilíbrio", afirma Dayane.
Segundo a psicóloga, iremos depender menos de relacionamentos quando descobrirmos que não precisamos ser perfeitos para nos amar. Há momentos em que nossos planos não se concretizam. Entretanto, a possibilidade de sermos felizes encontra-se em nenhum outro lugar, senão no agora.
Perguntas como "O que posso fazer para ser feliz hoje?" instigam uma faísca de autocuidado. Simples atos como ouvir uma música que gosta, aprender a relaxar e evitar pensar em problemas o tempo todo já nos fornecem certa independência emocional.
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Devemos ser responsáveis por nosso bem-estar
Todos nós carregamos traumas e marcas que nos causam mal-estar. Entretanto, precisamos tomar cuidado para que nosso humor não dependa exclusivamente de fatores externos. Dayane afirma que viver do passado ou do futuro pode potencializar a busca de nossa felicidade em outras pessoas.
"Quem vive de passado não consegue esquecer ou perdoar quem errou com ela. E quem vive de futuro está sempre preocupado com o que pode acontecer", explica a psicóloga. Por esse motivo, é importante viver no presente. É compreensível criar expectativas para que o próximo apague nossos medos, entretanto, essa missão está sob nossa responsabilidade.
Segundo Milena Lhano, não é errado que outra pessoa nos ofereça um sentimento de proteção, segurança e amparo para os momentos ruins. Entretanto, quando acreditamos que o próximo deve fazer o que for preciso para nos fazer feliz, é necessário reflexão. Segurar as rédeas de nossas vidas deve ser um ato de empoderamento, não de solidão.
Quando somos pressionados a iniciar uma relação
É comum que as pessoas nos questionem sobre quando teremos uma relação, especialmente durante as festas no fim de ano. Essas perguntas acabam potencializando a necessidade de ter alguém ao nosso lado. E segundo Dayane Fagundes, as cobranças externas só nos afetam quando as internas já existem.
Como solução, a psicóloga indica trabalhar nossa autoestima. "É preciso cuidar bem de si mesmo, ter certeza sobre quem você é e se sentir digno do amor, do merecimento. A culpa de não estar agindo como a sociedade prega deve ser trabalhada", afirma.
Lidando com as expectativas ao conhecermos alguém
Ao conhecermos alguém, é normal idealizar algo estável para o futuro. Entretanto, Dayane indica que trabalhemos nosso autoconhecimento para não atribuirmos um peso desnecessário sob um possível namoro.
"É necessário entender o que queremos, nos posicionar no mundo. A terapia é o melhor caminho para esse desenvolvimento do 'eu'", diz.
Milena Lhano também alerta sobre os perigos da ansiedade em fazer uma relação "dar certo". Para a psicóloga, a ânsia pelo vínculo amoroso pode nos fazer ignorar os defeitos do outro e os sinais de incompatibilidade.
"Fica difícil olhar para o outro quando estamos olhando apenas para o nosso vazio que vai ser preenchido ou o desejo que será atendido", afirma a psicóloga.
Naturalidade é a chave
Segundo Dayane, parar de buscar um relacionamento significa que estamos nos nutrindo sozinhos e que o próximo não é mais a solução para nossas angústias. "Você não procura externamente o que já está preenchido internamente, então se o relacionamento vier ele irá somar e não preencher, o que é maravilhoso", reitera.
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