Graduado em Medicina pela Escola Superior de Ciências da Santa Casa de Misericórdia de Vitória (2014), fez clínica Médic...
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O que é Hemofilia?
A hemofilia é um distúrbio hereditário que afeta a coagulação do sangue. Por exemplo: quando cortamos alguma parte do nosso corpo e começa a sangrar, as proteínas (elementos responsáveis pelo crescimento e desenvolvimento de todos os tecidos do corpo) entram em ação para estancar o sangramento, a chamada coagulação. Portadores de hemofilia não possuem essas proteínas, por isso sangram mais do que o normal.
Saiba mais: Hemofilia: entenda a doença que compromete a coagulação do sangue
Existem vários fatores da coagulação no sangue que agem em uma sequência determinada. No final dessa sequência é formado o coágulo e o sangramento é interrompido. Em uma pessoa com hemofilia, um desses fatores não funciona. Sendo assim, o coágulo não se forma e o sangramento continua.
Hemofilia adquirida
A hemofilia adquirida, como a hemofilia congênita, é um distúrbio causado pela deficiência de um dos fatores da coagulação no sangue. Todavia, a hemofilia adquirida não é uma doença hereditária, logo, o indivíduo com diagnóstico não nasce com o problema.
De acordo com Maria Amorelli, hematologista do centro clínico da Órion Complex, o problema se desenvolve quando, em algum momento da vida (normalmente durante a fase adulta), o sistema imunológico produz um anticorpo capaz de inativar o fator de coagulação no sangue. O mais comum é um inibidor contra o fator 8.
“A pessoa passa a apresentar sintomas similares ao da hemofilia, apesar de não ter nascido com esse problema. Ela produz o fator 8 normalmente, mas o inibidor vai e destrói esse fator 8 ou 9 da coagulação, levando a sangramentos”, explica a especialista.
Ainda de acordo com Amorelli, embora as causas da hemofilia adquirida ainda sejam desconhecidas, entende-se que ela é uma alteração no sistema imunológico que pode se desenvolver após quadros que causam sua desregulação, tais como:
- Quadros vacinais;
- Infecções virais;
- Quadros de estresse imunológico, que podem estar associados a outras doenças autoimunes.
Causas
Segundo Altamir Filho, médico hematologista do Hospital HSANP, a hemofilia é uma doença hemorrágica hereditária ligada ao cromossomo X. Ela ocorre quando há uma deficiência ou anormalidade na atividade do fator VIII (hemofilia A) ou do fator IX (hemofilia B).
Ainda segundo o especialista, ambos os tipos da doença são transmitidos majoritariamente de mães para bebês do sexo masculino. Já bebês do sexo feminino, filhas de homens com hemofilia, se tornarão portadoras obrigatórias da condição.
Em cerca de 30% dos diagnósticos a doença ocorre a partir de uma nova mutação, que pode ocorrer tanto no corpo da mãe quanto na formação do feto.
Tipos
A hemofilia é mais comumente classificada nos tipos A e B. Pessoas com hemofilia tipo A são deficientes de fator VIII (oito). Já as pessoas com hemofilia do tipo B são deficientes do fator IX (nove). Os sangramentos são iguais nos dois tipos, porém, a gravidade desses sangramentos depende da quantidade de fator presente no plasma (líquido que representa 55% do volume total do sangue).
Sinais
Geralmente, a hemofilia se manifesta através de sangramentos internos, como nos músculos. Entretanto, esse sinal também pode aparecer por via externa, na pele, provocada por algum machucado. As mucosas (como nariz, gengiva etc.) também podem sangrar, tanto após um trauma ou sem nenhuma razão aparente. Os cortes na pele levam um tempo maior para que o sangramento pare.
Diagnóstico
De acordo com Altamir Filho, o diagnóstico das hemofilias é clínico laboratorial. Após a manifestação dos sintomas, é solicitado um exame de sangue para a observação do TTPa (tempo de tromboplastina parcialmente ativada) e TP (tempo de protrombina). Também é realizada a dosagem da atividade coagulante do fator VIII (hemofilia A) ou fator IX (hemofilia B).
Tratamento
Hemofilia tem cura?
Até agora, não há uma cura para a doença, mas uma possibilidade de tratamento é a reposição intravenosa (pela veia) do fator deficiente (fator VIII na hemofilia A ou fator IX na hemofilia B).
Para que o tratamento seja completo, o paciente deve fazer exames regularmente e jamais utilizar medicamentos que não sejam recomendados pelos médicos, pois há o risco de desenvolvimento de inibidores, que neutralizam o fator coagulante. O tratamento de hemofilia é na maior parte das vezes realizado pelo SUS (Sistema Único de Saúde).
Doação de sangue para hemofilia
As doações de sangue são importantes no tratamento da hemofilia. O sangue é um composto de células que cumprem funções como levar oxigênio a cada parte do corpo, defender o organismo contra infecções e participar na coagulação. O plasma coletado no sangue é transformado em fatores, os quais são utilizados no tratamento de pessoas com problemas de coagulação.
Tratamento de hemofilia adquirida
Tanto o tratamento de hemofilia adquirida quanto o de hemofilia congênita consistem na reposição intravenosa do fator deficiente. Porém, a hematologista Maria Amorelli explica a necessidade da administração de medicamentos para tentar “curar” o autoanticorpo.
Logo, o tratamento inclui o uso de imunossupressores associados como método para controlar a doença.
Terapia não substitutiva de hemofilia
Pesquisadores em hemofilia desenvolveram novos produtos que têm uma administração mais simples e, por consequência, garantem maior adesão ao tratamento, com efeito semelhante à reposição do FVIII, e sem o risco de desenvolver inibidores (que neutralizam o fator coagulante e reduzem a eficácia do tratamento).
A hemofilia adquirida, ao contrário da hemofilia congênita, é uma doença que pode entrar em remissão, ou seja, é possível que o paciente não apresente mais sintomas após o tratamento. Isso pode ocorrer, segundo Amorelli, quando o inibidor desenvolvido cai para títulos baixos.
São fármacos com agentes que impedem a função de anticoagulantes naturais, como o fitusiran e concizumabe, e com um anticorpo que simula as ações do fator coagulante, o emicizumabe. Porém, também é possível que a doença recidiva, ou seja, volte à atividade devido a outras alterações no sistema imunológico do paciente.
O tratamento com fármacos é chamado de terapia não substitutiva, pois não envolve a infusão de fatores coagulantes para promover a prevenção dos sangramentos, e serve para pacientes sem e com inibidor.
Todos os três estão em fase de estudos em seres humanos, mas apenas o emicizumabe já foi aprovado para uso nos Estados Unidos e segue em tramitação noutros países. No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) aprovou o medicamento para tratamento da hemofilia tipo A para hemofílicos com e sem inibidor.
Convivendo (Prognóstico)
Além do tratamento de profilaxia, é fundamental que pacientes diagnosticados com hemofilia sejam acompanhados regularmente pelo seu médico hematologista ou hematerapeuta a fim de evitarem complicações e riscos, tais como problemas articulares ou procedimentos cirúrgicos.
Também como forma de prevenção, recomenda-se, na infância e também na vida adulta, a prática de atividades físicas, mas com a devida orientação médica. Os pacientes com hemofilia podem realizar exercícios leves, como natação, ginástica, ciclismo, caminhada e musculação, desde acompanhados por medidas de prevenção e controle de traumas.
De modo geral, com o tratamento médico adequado, os pacientes hemofílicos conseguem levar uma vida normal, com qualidade, bem-estar e segurança.
Referências
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Altamir Filho, médico hematologista do Hospital HSANP
Maria Amorelli, hematologista do centro clínico do Órion Complex