Anna Hirsch Burg é psicóloga formada pela Pontifícia Universidade Católia de São Paulo. Fez sua formação em psicanálise...
i"Tentar ser feliz é obrigatório. Realizar é uma sorte."
Jorge Forbes
A procura pela terapia de casal aumenta anualmente nos consultórios, mesmo assim o tema ainda permanece obscuro para muitos. Tentarei, primeiramente, responder brevemente às perguntas que me são feitas com maior frequência e, na sequência, esclarecerei também o porquê acredito que o trabalho feito com os dois membros do casal traz alento a inquietações e questões próprias dos relacionamentos contemporâneos.
1. Uma terapia de casal serve só para casados ou também para namorados?
A terapia de casal é útil tanto para casais formalizados quanto para namorados que moram juntos, ou seja, não precisa da formalização do estado civil.
2. É melhor fazer a terapia de casal no início do relacionamento, como um trabalho preventivo, ou só quando o relacionamento já esta se desgastando?
Quando tudo esta bem não tem porque fazer terapia de casal. Porém, se um dos membros tem um histórico de relacionamentos que acabam naufragando sempre pelo mesmo motivo é importante que busque uma terapia individual para entender quais mecanismos inconscientes o impediram de dar outro destino aos relacionamentos anteriores e obter maior compreensão e consequente liberdade de escolha em relação ao atual.
3. Casais homossexuais também podem se beneficiar da terapia de casal?
Obviamente que sim. Os mecanismos psíquicos dos relacionamentos amorosos são os mesmos, independentemente da orientação sexual.
Saiba mais: Constelação familiar: O que é, como funciona e para que serve
Estruturas que moldam um relacionamento
Não é fácil estabelecer um padrão geral de comportamento nem abstrair um protótipo estrutural das relações de casal de nossa época. Mas é indubitável que as mudanças nos pactos entre homens e mulheres trazem ao vínculo uma sensação de fragilidade desconhecida em décadas passadas.
Cada um espera encontrar no outro um colo, uma pessoa com maturidade emocional suficiente para atender suas carências afetivas. Paradoxalmente na atualidade tanto o homem quanto a mulher estão sujeitos a elevados níveis de tensão: a competição no trabalho, a ameaça de desemprego, o trânsito - estresse em geral.
Em tal contexto, sem dar-se conta, esperam encontrar no casamento uma espécie de oásis, uma fonte de conforto, um parceiro atento, meigo e compreensivo além do sexo cinematográfico... Deseja-se apoio, proteção, reconhecimento.
A necessidade de muito receber do outro entra em confronto com a pouca disponibilidade para dar.
Os parceiros se revezam num eterno conflito: quem recebe sente que recebe pouco e quem dá acha que dá demais.
Nesse panorama, a procura por terapia de casal cresce ano a ano.
Acrescido ao dito acima, os mitos que definiam os relacionamentos nos casamentos tradicionais tais como o mito de que "só se ama uma vez" e o mito do "amor eterno" foram dando lugar a mitos modernos, mais complexos e "confusos" no sentido do que se pode ou não esperar do parceiro amoroso.
Se os mitos modernos contribuíssem para o crescimento individual ou para o desenvolvimento do casal seria maravilhoso, no entanto o que vemos são casais cada vez mais inseguros, cobradores, "grudados" e ciumentos.
Mitos modernos
Para melhor elucidar, citarei alguns dos mitos dos casamentos modernos que foram substituindo os mitos tradicionais: o mito da "Verdade Total", que compreende em contar tudo ao parceiro (pacto que muitas vezes chega às raias da crueldade); o "Mito da Liberdade": nesse ideal cada um tem a liberdade de fazer o que quiser, quando quiser e como quiser. Algo muito "moderninho", mas que no fundo não passa de uma falsa noção de independência que acaba ferindo o outro; o mito da "paixão avassaladora": aqui passado o arrefecimento da paixão, o furor do sexo, parece que há um "erro" no relacionamento; mito da "perfeição eterna do parceiro": nada mais falso, ou seja, ao se perceber que o parceiro tem imperfeiçoes, percebe-se também que é chegado o momento de romper. Reina a fantasia de que só pessoas perfeitas se relacionam.
Uma chance
As estatísticas não mentem: quando um casal chega ao consultório é porque a via de comunicação entre os dois já se esgotou. Mas, obviamente, ainda há o que ser dito senão não estariam procurando ajuda para alguém interpretar o que não estão conseguindo dizer um ao outro.
A terapia de casal geralmente é procurada em meio a uma crise suficientemente grave para ter levado ao menos um dos parceiros a falar em separação. Separação é um processo doloroso, mesmo para o parceiro que se diz decidido.
A suspeita de traição ou a traição confirmada por um dos parceiros é a causa que traz mais casais ao consultório, além de questões ligadas à sexualidade, filhos, falta de amor estariam entre as outras queixas mais frequentes.
A terapia de casal dura em média de três a quatro meses, um trabalho breve para os padrões da psicanálise e o rumo que o relacionamento vai tomar a partir do processo analítico não pode ser defindo a priori.
O terapeuta ajuda o casal a desvendar o que está encoberto por trás das brigas repetitivas e aparentemente fúteis que normalmente impedem que o casal consiga ter uma conversa minimamente civilizada.
Os dois membros do casal terão clareza dos processos inconscientes que os levaram a se escolherem como parceiros e como chegaram ao ponto de desencontro. Essa consciência proporciona uma clareza dos mecanismos em jogo nas tramas da relação. Haverá a consciência de que num casal não existe um único culpado nem um único santo. Há sempre dois em jogo...
Não há garantias no amor, amar é um projeto arriscado. Mais arriscado ainda é riscar da vida o amor.
Concordo com Jorge Forbes quando diz que a felicidade amorosa não tem garantia. Ele acredita que buscá-la é obrigação de todos. Mesmo sabendo o risco de se machucar no caminho.