Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina do ABC (1978) e doutorado em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da U...
iDevido ao crescimento da disseminação do novo coronavírus no mundo, vivemos momentos difíceis de quarentena e isolamento social, sem termos tido tempo para nos adaptarmos à uma nova rotina de forma planejada - utilizando novos códigos de conduta, que resultam em novos comportamentos.
Como médico que cuida de dependentes químicos há 41 anos, algo que tem me deixado bastante preocupado neste período é o consumo de bebidas alcoólicas. E, depois do início da pandemia de COVID-19, temos visto três cenários que afligem todo profissional que trabalha com a saúde pública.
Consumo de bebida alcoólica na pandemia
Happy hour virtual
O primeiro cenário observado é daquela pessoa que, por vários anos, tem feito uso de álcool moderado, muitas vezes acompanhado de uma certa rotina - como nos fins de semana e com amigos, ou mesmo o consumo diário, mas não intenso, sem prejuízos pessoais ou para quem vive com ela.
Mas agora, praticamente, não temos mais fins de semana, visto que todos os dias são parecidos. Sem poder sair de casa, algumas pessoas acabaram aderindo à prática do "happy hour virtual".
Funciona assim: amigos se reúnem no mesmo horário, cada um na sua residência, para falarem sobre todo tipo de assunto e, obviamente, tendo como pano de fundo, o consumo de bebidas alcoólicas. Mais preocupante ainda, em alguns grupos, essa prática é diária.
Não é preciso ser médico, nem especialista nessa área, para entender que esse não é um hábito salutar. Isso porque o mais comum é essa pessoa aumentar o consumo de álcool durante o período de confinamento, seja bebendo em horários não habituais (quem não bebia no almoço começou a beber) ou aguardando o final do dia para começar a beber.
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Gatilhos para abstêmios
O segundo cenário envolve o grupo que já não fazia uso de álcool, por orientação médica ou por escolha própria. A recomendação, durante o atual período, se mantém a mesma, até com maior atenção: a bebida alcoólica fermentada (cerveja e vinho) ou destilada (cachaça, whisky, vodca) não é remédio.
Quadros depressivos e de ansiedade, comuns em momentos como esse, ficam agravados com o consumo de álcool. Uma ajuda importante que continua atuante, mas agora remotamente, é a irmandade de Alcoólicos Anônimos (AA) que, para evitar aglomeração de pessoas, iniciou reuniões virtuais com o propósito de manter a sobriedade. Ou seja, quem já não bebia não deve mudar o comportamento nesse momento.
Idosos no grupo de risco
O terceiro cenário, também muito preocupante, é o dos idosos (grupo de risco para a COVID-19) que, muitas vezes, já moram sozinhos e podem não ser monitorados ou acompanhados, fazendo seu próprio controle do uso de álcool.
Se esse idoso já fazia algum consumo de bebidas alcoólicas anteriormente, ele precisa ficar atento para que não ocorra um aumento. Por outro lado, para mulheres idosas, esse risco é ainda maior, especialmente pela associação com quadros depressivos.
Portanto, caro leitor, atenção para esse momento especial que estamos vivendo. É uma situação delicada em que a saúde física e mental requer cuidados. Usar o álcool como uma muleta para lidar com o estresse e outros problemas neste período é perigoso.
Por isso, é interessante lançar mão de estratégias de fortalecimento dos laços afetivos e atitudes solidárias. E, lembrando, nenhum uso de álcool é aceitável por menores de idade, mulheres grávidas, quando se dirige veículos ou seu médico pedir que você não o faça. Cuide de você!