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Mulheres são mais emocionais. Toda mulher quer ter filho. Mulheres não tem senso de direção. Mulher gosta menos de sexo do que homem. Quem é mulher já deve ter ouvido pelo menos uma dessas afirmações e deve ter decidido se entrava ou não na briga para provar o contrário.
Se hoje as mulheres podem fazer suas próprias escolhas, votar, estudar em universidades, trabalhar ou mesmo sair sozinhas nas ruas, foi porque no passado houve muita luta e descontentamento perante a desigualdade que se estabeleceu entre homens e mulheres ao longo de gerações.
Apesar de muitas conquistas, ainda existem muitos tabus que permeiam a questão do gênero e que acabamos repetindo sem perceber. No Dia Internacional da Mulher (8 de março), listamos aqui os maiores jargões sobre o comportamento feminino e conversamos com especialistas no assunto, que nos mostraram que as diferenças entre homens e mulheres são menores do que imaginávamos:
Mulheres são mais emocionais e menos racionais
Essa é uma verdade em partes, como explica o neurocirurgião do MDX Medical Center Eduardo Barreto, presidente da Sociedade de Neurocirurgia do Rio de Janeiro: "São os fatores culturais que fazem com que as áreas cerebrais relacionadas às emoções sejam mais trabalhadas nas mulheres, não sendo portanto uma característica inerente a um ou outro gênero", diz.
Uma pesquisa da Universidade de Rochester (EUA) analisou as atividades cerebrais de 13.301 homens e mulheres e não encontrou diferenças significativas em suas atividades cerebrais. O estudo analisou 122 características (que vão de empatia à sexualidade) e descobriu que todas são comuns em ambos os sexos - mesmo tópicos como relacionamentos e agressividade, que apareceram com algumas oscilações para um dos lados, não mostram diferenças suficientes para a determinação de um estereótipo baseado apenas no gênero.
Um dos argumentos para justificar a afirmação de que mulheres são emotivas é o de que elas são mais interessadas pela área de humanas por conta de um instinto mais cuidador e emocional, enquanto os homens se dão melhor com trabalhos na área de exatas, mais racional. Entretanto, essa construção pode ser uma consequência de fatores culturais passados de geração para geração, e a tendência é que esse cenário mude.
A professora Camilla Borelli, coordenadora do curso de Engenharia Têxtil do Centro Universitário da Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), conta que a área de exatas sempre foi sua preferência e o que guiou sua carreira. Ela fez um curso técnico de engenharia têxtil aos 14 anos e seguiu com a faculdade na mesma área, além de um mestrado em engenharia mecânica e um doutorado em engenharia química.
"Antes de ser professora da FEI, trabalhei muito tempo em chão de fábrica, aos 17 anos já coordenava linhas de produção e em nenhum momento deixei que meu sexo fosse motivo para desvalorizarem meu trabalho", afirma. A engenheira começou a dar aulas com 24 anos e foi a primeira mulher a lecionar para a disciplina de engenharia da FEI.
Hoje ela é coordenadora de seu curso e afirma que a procura por parte das mulheres pela área de exatas tem aumentado, e que não existe qualquer dificuldade exclusiva de um gênero ou outro no aprendizado.
Mulheres não assumem cargos de liderança
Ao lado da crença de que mulheres são mais emocionais e menos racionais, vem o mito de que o sexo feminino é mais dependente emocionalmente e fisicamente, e por conta disso não se dão bem assumindo cargos de liderança, ou então precisariam de um homem como protetor.
"A verdade é que essa relação de dependência se desenvolveu mais como um padrão social do que algo propriamente de gênero", diz a psicóloga Dirce Perissinotti, do Hospital 9 de Julho, em São Paulo. "Há inclusive sociedades chinesas em que se adota para as mulheres a chefia do lar, e inclusive os filhos adultos continuam a morar com mães mesmo depois de casados, indo para a casa da companheira somente para os momentos de intimidade", completa a especialista.
Dessa forma, entendemos que dizer que toda a mulher é mais dependente não só é um mito, como uma construção social que pode se modificar. "Assim como existem mulheres mais independentes, há homens mais dependentes", diz a psicóloga. E exemplos de mulheres fortes, independentes e em cargos de liderança não faltam, como é o caso de Tânia Cosentino, vice-presidente para América do Sul da Schneider Electric, empresa de gestão de energia.
Tânia é formada em eletrotécnica e engenharia elétrica e construiu sua carreira em um ambiente formado majoritariamente por homens. "Em 2009, tornei-me não só a primeira mulher, como também a primeira brasileira a assumir a Schneider Electric Brasil, e agora sou a primeira sul-americana a assumir a vice-presidência da América do Sul", afirma.
Tânia é casada, mas não tem filhos, e afirma que a mulher precisa acreditar mais em seu potencial e criar sua independência não só financeira como emocional. "Devemos nos sentir mais seguras e confiantes para assumir novos desafios."
Toda mulher é multitarefa
Com o surgimento da dupla e até mesmo tripla jornada feminina - trabalho, cuidados com a casa e filhos e os estudos- muitas mulheres precisaram aprender a se concentrar em diversas atividades simultaneamente e se organizar de forma a não deixar nada passar, e por isso o estigma de que apenas a mulher consegue a façanha de pensar e fazer diversas coisas ao mesmo tempo.
No entanto, essa característica é comum a todo o ser humano, bastando apenas ser desenvolvida. De acordo com o neurocirurgião Eduardo, toda pessoa é multitarefa - a palavra chave é o equilíbrio. "A exceção reside em pessoas com maior grau de ansiedade, que se perdem e não conseguem realizar diversas tarefas", diz.
A psicóloga Dirce explica que, nos casos em que as tarefas incluem questões do casal, como trabalhos domésticos e filhos, uma simples divisão poderia desafogar a mulher e até mesmo elevar o homem ao papel de companheiro e cuidador, deixando de ser apenas um procriador ou provedor. "Homens que precisam trabalhar e cuidar dos afazeres da casa no geral também se tornam multitarefa e podem ficar sobrecarregados, por isso a divisão é importante."
Mulher gosta menos de sexo
A psicoterapeuta Evelyn Vinocur, de São Paulo, explica que a educação rígida gera crenças falsas em relação à sexualidade, masturbação e orgasmo, e que muitas mulheres se sentem reprimidas e culpadas por gostarem e sentirem vontade de fazer sexo.
"Muitas mulheres que acreditam ser o sexo uma atividade feita para satisfazer apenas o homem se sentem culpadas por fazerem, ficam preocupadas demais e não conseguem chegar ao orgasmo", diz.
Outro ponto importante é o que diz respeito à castidade - muitas sociedades através dos anos criaram a crença de que uma mulher virgem e casta é mais pura do que uma mulher que já praticou sexo, e por conta disso muitas mulheres se recusam a conversar sobre sexo ou até mesmo fazê-lo.
"A verdade é que o sexo é uma necessidade fisiológica, e qualquer ser humano pode sentir mais ou menos prazer ao praticá-lo, independente do gênero", completa. Reservar essa necessidade apenas ao homem, como se ele tivesse a obrigação de estar constantemente excitado e pronto para o sexo, e restringir esse direito à mulher, é uma forma de opressão aos dois gêneros, já que ninguém é feito de extremos o tempo inteiro.
Toda mulher que ter filhos
Basta uma mulher dizer que não pensa em ter filhos para receber olhares de estranhamento. Parece tão comum em nossa sociedade que as mulheres queiram ter e cuidar de seus bebês, que imaginar que algumas delas não têm essa ambição soa diferente aos ouvidos.
No entanto, essa realidade parece estar bem mais próxima do que imaginamos: uma pesquisa feita pelo site de relacionamento Par Perfeito avaliou 18.862 solteiros brasileiros cadastrados no domínio, e mostrou que na verdade a maioria dos homens quer casar e ter filhos, enquanto as mulheres preferem a independência financeira.
Segundo o estudo, 58% dos homens querem ter filhos com certeza, enquanto apenas 43% das mulheres partilham dessa ideia. Além disso, apenas 16% dos homens disseram que não pretendem ser pais, enquanto 32% das mulheres deixaram claro que não querem filhos. Um exemplo é a engenheira têxtil Camilla, que afirma não querer ter filhos agora, pois isso não é uma prioridade no momento:
"Preferi me dedicar à carreira, pois acho que os filhos demandam muitos cuidados e um tempo que não tenho, com as aulas e o doutorado em curso", explica. "Lidei com os olhares estranhos diversas vezes e tive que me explicar, mas não acho que o fato de não querer filhos me faça menos mulher."
Mulheres são mais fracas fisicamente
"A verdade é que os hormônios masculinos fazem com que atividades que necessitam força física sejam mais facilmente realizadas pelos homens, se compararmos duas pessoas com as mesmas características como peso e estatura", explica o neurocirurgião Eduardo.
No entanto, iniciar treinos de resistência física pode tornar qualquer estrutura muscular mais forte - seja homem ou mulher - e a falta de atividade física pode causar o efeito contrário também para ambos os sexos.
E para ser uma mulher forte não é necessário nem mesmo chegar a extremos, como as halterofilistas - basta fortalecimento muscular adequado.
Mulheres dirigem mal
"Mulher no volante, perigo constante". A mulher que nunca ouviu esse ditado que atire a primeira pedra. Mas será que ele é mesmo justificável? O presidente da Sociedade de Neurologia Eduardo declara que isso não passa de um mito e que essa afirmação não tem qualquer afirmação científica.
"O argumento de que os homens possuem uma inteligência espacial mais desenvolvida e que isso ajuda na direção é verdade em termos, uma vez que as mulheres tendem a ser mais cautelosas no trânsito, evitando acidentes com mais facilidade", diz a psicóloga Dirce.
Mais uma vez, não é o gênero que irá determinar se uma pessoa dirige mal ou não - qualquer ser humano está submetido a essas características.
Mulheres falam demais
Apesar de existir a crença de que as mulheres falam mais que os homens, as evidências científicas mostram o oposto. Pesquisadores canadenses da Universidade de Oxford analisaram 63 estudos sobre o assunto e descobriram que quando mulheres e homens estão juntos, são os homens que mais falam.
Uma pesquisadora da Universidade de Waikato, na Nova Zelândia, sugere em seus trabalhos que os homens geralmente dominam o tempo falando em discussões públicas nas quais é necessário se posicionar, enquanto as mulheres não se sentem encorajadas a entrar nesse tipo de discussão, pois têm medo de serem desconsideradas pelos homens.
Ainda segundo a pesquisa da Nova Zelândia, as mulheres tendem a falar mais em situações pessoais, para auxiliar outras pessoas ou desenvolver relações interpessoais.