Doutor em cardiologia pela Universidade Federal de São Paulo / Escola Paulista de Medicina, tem título de especialista e...
iO infarto e o acidente vascular cerebral (AVC) são eventos cardiovasculares importantes. Ambos têm em comum: a ruptura de uma placa de gordura que fica entre o endotélio (revestimento interno das artérias) e a camada muscular que dá resistência a artéria.
Muitos fatores de risco, como o colesterol ruim o LDL, hipertensão não controlada, diabetes, tabagismo e componentes genéticos, entre outros, podem ajudar a criar essas placas ou rompê-las.
O componente inflamatório é uma hipótese testada e defendida de forma crescente na cardiologia. A ideia é que a placa de gordura arterial inflamada rompa com mais facilidade. Não sabemos se a inflamação é o marcador que a placa vai romper ou se é causa em si.
Há alguns anos, pesquisadores começaram a usar a proteína C reativa ultrassensível (um exame de sangue que detecta quantidades mínimas de uma proteína liberada em caso de inflamação/ infecção) como marcador de risco cardiovascular. Maiores valores significam maior risco de infarto e AVC. Identificando as pessoas com pior perfil de risco podemos atuar mais agressivamente controlando os riscos, como com medicações e mudanças no estilo de vida.
Uma pesquisa científica chamada CANTOS testou um anti-inflamatório especial em pacientes com proteína C reativa elevada e alto risco de novos infartos. Aqueles que o anti-inflamatório controlou melhor a inflamação apresentaram menor risco de infarto, AVC e doença vascular. Então esse estudo apresentado ano passado permitiu a prova do conceito.
Em 2013, pesquisadores descobriram que um estranho acúmulo de células-tronco que sofreram mutação na medula óssea aumenta o risco de uma pessoa morrer em uma década em 40 ou 50 por cento, geralmente de um ataque cardíaco ou AVC. Essa condição foi denominada de CHIP (clonal hematopoietic of Indeterminate Potential).
Essas mutações estavam presentes em portadores de neoplasias hematopoiéticas, e eram erroneamente classificadas como mielodisplasias. É um termo genérico para mutações em células encontradas no sangue e medula óssea, e podem ser encontradas em 10% das pessoas entre 70-80 anos de idade. Como aumento de CHIP existe aumento da atividade inflamatória, pois parte das células do sistema imune do paciente vem dai.
Em 2017, o pesquisador Jaiswal e colaboradores publicaram parte de sua linha de pesquisa ligando essas mutações CHIP a eventos cardiovasculares (infarto e AVC). Eles compararam cerca de 4000 pacientes com infarto prévio com pessoas sem cardiopatia. Foi possível observar que o risco em portadores de CHIP era 4 vezes maior que em não portadores. Estas teorias também foram testadas em ratos onde as mutações foram provocadas, com piora semelhante do perfil cardíaco.
Um achado interessante do estudo CANTOS foi a redução de câncer de pulmão com o uso do anti-inflamatório. Aumentando a suspeita relação entre câncer, mutações e doença cardiovascular.
Esses exames ainda são experimentais. Acredita-se que exposição a toxinas, como cigarro e a própria idade (que é um fator mutagênico) aumentam as mutações e seu significado. Talvez essa nova forma de enxergar a doença pode facilitar a explicação do porque jovens e pessoas sem os fatores de risco convencionais também sofrem de doenças cardíacas como infarto e angina. Uma compreensão melhor pode, no futuro, descobrir uma forma de reduzir a importância desses fatores no risco de morte.
Referências
1. Clonal Hematopoiesis of Indeterminate Potential - A Risk Factor for Hematologic Neoplasms. Michael Heuser; Felicitas Thol, PD; Arnold Ganser.
2. Clonal Hematopoiesis and Risk of Atherosclerotic Cardiovascular Disease. Siddhartha Jaiswal, M.D., Ph.D.;Pradeep Natarajan, M.D.;Alexander J. Silver, B.A.;Christopher J. Gibson, M.D.;Alexander G. Bick, M.D., Ph.D.;Eugenia Shvartz, B.S.;Marie McConkey, Ph.D.;Namrata Gupta, Ph.D.;Stacey Gabriel, Ph.D.;Diego Ardissino, M.D.;Usman Baber, M.D.;Roxana Mehran, M.D.