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iA., oito anos, é um garoto como tantos outros. Vai à escola, vê desenho animado, gosta de brincar... Tudo como qualquer outro. Mas por que os meninos da escola de A. implicam e agridem o garoto? Porque as pessoas cochicham quando o vêem? A. tem somente um ponto que o diferencia das outras crianças: Ele tem gestos e voz semelhantes às das meninas. E os que o agridem estão, sem saber, praticando homofobia.
Afirmar que A. vai se tornar um adulto homossexual é impossível. Mas, segundo o psicólogo e sexólogo Carlos Boechat, o fato das pessoas, seja os colegas da escola, professores ou até os próprios pais, o tratarem com agressividade é motivado por uma suposição da sexualidade da criança, o que leva a uma repreensão motivada por homofobia. A sociedade é homofóbica. O pai tem medo do filho se tornar homossexual , explica o sexólogo.
S.L., 32 anos, mãe da A., que prefere não se identificar em favor da criança,
diz que o preconceito nasce dentro da família. É a família que ensina, educa. Se você permitir que o seu filho tenha atos preconceituosos, ele vai ser um adulto assim. O preconceito nasce dentro de casa , diz a mãe.
Na escola, S. também revelou que um dos lugares de maior repressão para a criança que apresenta estas características é o ambiente escolar. A mãe recorda que o filho sofria preconceito na escola anterior à atual e que, por causa disso, não participava das atividades propostas no colégio e acabava se fechando em um mundo particular.
"Na escola atual ele está mais livre, brinca mais com as outras crianças. Até futebol, que ele não jogava antes, ele está experimentando , diz S. A psicóloga e professora de psicologia da Faesa Andréa Ferreira acredita que é dever dos professores trabalhar com os alunos as questões que abordem todas as diferenças, sejam as sociais, físicas ou comportamentais. Devem tocar no assunto da diversidade, da diferença. É uma pena que muitas vezes os professores não estão preparados para tratar deste assunto, pontua Andréa. Segundo Carlos Boechat, a criança que é considerada diferente pelos colegas de classe deve ser incluída nas brincadeiras. A escola tem que promover a interação maior das brincadeiras . A psicanalista e coordenadora do curso de psicologia da UVV, Adriana Pessoa, acrescenta que as escolas devem trabalhar o respeito. A situação não pode chegar a se tornar violenta. Deve-se trabalhar as diferenças com naturalidade, acredita a psicanalista.
A psicopedagoga especialista em educação especial e supervisora pedagógica da Sociedade de Ensino Geração, Rayne De Lucide, trabalha com a idéia de escola inclusiva há mais de 10 anos. A escola tem por princípio aceitar todas as crianças, independente das diferenças. Na escola, as crianças convivem com diferentes formas de vida (físicas, mentais e comportamentais) e todas devem ser aceitas. Nós aceitamos pessoas que sejam diferentes. Não importa em quê , explica Rayne. De acordo com a psicopedagoga, tudo é discutido em sala de aula com as crianças. Até as próprias agressões que surgem entre elas são discutidas.
Quando uma criança fala um palavrão, nós discutimos o significado daquilo. Normalmente as crianças não gostam de falar novamente quando entendem o sentido literário do que dizem . Outro ponto importante para Rayne é se discutir a normalidade com as crianças. Constantemente as crianças reaprendem este sentido . Segundo a supervisora, as crianças aprendem que não são melhores que outras por conseguirem ou não andar, por falarem ou não, ou simplesmente gostarem de jogar futebol ou brincar de boneca. As crianças já acostumaram que cada um é um. Nós não temos o padrão de comparação , diz Rayne. Outra questão que deve ser abordada com as crianças, segundo a psicopedagoga, é a noção do que é uma família. Rayne acredita que elas não devem se prender a um único padrão de aceitação. Não temos um padrão de família perfeita. Cada um tem a sua família. Seja ela composta de uma mãe e um pai, ou só uma mãe, ou um avô e uma avó, ou também uma mãe e uma mãe, e um pai e um pai . Lar Doce Lar E quando o preconceito vem de dentro do próprio lar? S., mãe de A., declarou que um dos problemas enfrentados no dia-a-dia é o preconceito que o menino enfrenta dentro de casa, com os irmãos. Às vezes os meninos, quando brigam com ele, acabam usando esta característica como forma agressão , desabafa a mãe. O maior problema, entrega S., é o que eles aprendem fora de casa, na escola. Segundo a mãe, os pais deveriam auxiliar no fim destes comportamentos discriminatórios. Ela acredita que as crianças reproduzem o que vêem em casa. A criança copia o que o pai faz. E quando aprende com o coleguinha é porque outra geração ensinou àquele menino reclama. Carlos Boechat diz que é fundamental que a criança se sinta amada e protegida pela família. Quando há o caso de uma criança com o comportamento do sexo oposto, ela precisa do mesmo afeto para crescer um adulto seguro. Segundo o sexólogo, não adianta falar mal ou ordenar que a criança seja diferente. O pai que pressente este comportamento no filho e se sente ameaçado deve se aproximar desta criança. O pai deve promover ações de estreitamento de relações com esta criança, mostrar como ser homem ou mulher, como ele é . A psicanalista e terapeuta familiar Cássia Rodrigues afirma que os pais não devem chamar a atenção da criança ou dizer frases pejorativas sobre algo que a criança faz. De acordo com a terapeuta, isso só reforça o comportamento na criança. Adriana Pessoa também acredita que a criança não deva receber pressões dos pais para se comportarem de determinada maneira. Não adianta impor determinados comportamentos. Os pais têm que trabalhar na verdade a própria aceitação , explica a psicanalista. Homossexualidade Futura? De acordo com todos os especialistas consultados, o comportamento, considerado diferente destas crianças não indica uma futura homossexualidade. Não existe esta ligação direta. Segundo Andréa Ferreira, a criança que começa a se apresentar como o sexo oposto está mais ligada à admiração de comportamento, do que sexualidade. Os adultos é que dão significado ao comportamento infantil, não a criança . Não significa que um menino feminino será gay , fala a psicanalista Adriana Pessoa. Porém, segundo Adriana, também não significa que ele não será. Os pais têm dificuldade em aceitar isso, mas não é rejeitando ou inibindo que o quadro vai ser mudado , explica. Andréa Ferreira lembra que os pais que não conseguem lidar sozinhos com a situação devem buscar orientação e não pré-julgar as crianças. A psicóloga acredita que esta é mais uma questão de rótulo da sociedade. Mesmo porque a homossexualidade não está ligada ao comportamento. Tem homens gays com o estereotipo do macho , retifica Andréa. Independente da orientação sexual que a criança siga no futuro, o sexólogo Carlos Boechat acredita que é necessário que os pais trabalhem a compreensão para formarem adultos seguros e sem traumas. A homofobia em casa é terrível. Se ele for mesmo homossexual, precisa deste apoio para construir uma sexualidade saudável. Pra ele não correr risco . O sexólogo também acredita que o comportamento infantil não indica a orientação sexual e completa. Não é a criança homossexual que se comporta como o sexo oposto. É o homossexual afetado que aprendeu a se comportar assim desde a infância , acredita Boechat. Enquanto isso, A. cresce afastado deste tipo de preconceito materno. Aceito meu filho do jeito que ele é, independente do que ele possa ser , declara a mãe. E o pai? A resposta é rápida. Ele tem um pai muito legal, tem uma cabeça muito feita. Ele respeita as opções do menino. É triste quando o pai agride o filho. Não é o caso, o pai só ajuda .