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O racismo é uma forma de preconceito e discriminação baseada na raça de determinado grupo populacional. Um dos casos que exemplificam muito bem o racismo é o preconceito contra a população negra.
"Ao longo da história foi utilizada a desqualificação, a desumanização, a demonização combinada com a violência (coação física e moral) para consolidar a exploração e a dominação de determinados grupos. Isso tudo cria no âmbito social a ideia de que há 'superiores' ou 'inferiores' (...) O racismo é uma construção da branquitude que objetiva manter pessoas não brancas fora dos espaços de poder", afirma Bruna Soares da Rosa, mulher negra advogada e militante das causas de raça e gênero.
Mas como denunciar um caso de racismo? Como reunir provas que mostram que houve racismo em uma fala, em uma atitude e que comprovam um crime? Entenda a seguir como identificar o racismo e como denunciá-lo:
Quais são as origens do racismo?
Não é possível dizer, com exatidão, quando o racismo começou na história da humanidade. Dentro do contexto brasileiro, porém, a escravidão de povos negros corroborou para que a discriminação dessa população acontecesse.
"A escravização de pessoas negras, durante o período colonial, durou mais 300 anos. Os negros foram desumanizados e demonizados pela branquitude - combinado com a tardia 'abolição', operada de forma desumana. A inexistência de qualquer indenização ou possibilidade de estruturação econômica, política e social da comunidade negra, permitiu que fosse construída a ideia de que pessoas brancas são superiores a pessoas negras"
De acordo com a advogada, a ideia de superioridade branca em relação à população negra é perpetrada até hoje no imaginário branco. "Portanto o racismo é uma construção social, criada e perpetuada por pessoas brancas, pois está intrínseco à formação da sociedade brasileira", aponta a especialista.
Como identificar casos de racismo?
Podemos lembrar de casos como os dos jogadores brasileiros Grafite, Aranha, entre outros, que foram alvos de casca de banana e xingamento de macaco nos estádios de futebol. Mas as ofensas não estão restritas apenas aos campos de futebol.
Só no estado do Rio de Janeiro, a cada dia, duas pessoas foram vítimas de racismo no ano de 2019 segundo o Dossiê de Crimes Raciais, elaborado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP).
O perfil da violência, conforme aponta o dossiê, são agressões verbais do tipo "macaca", "macaco", "negra", "preto", "preta" e "cabelo duro". O racismo, entretanto, não está restrito ao preconceito na sua forma mais explícita.
O chamado racismo velado aparece em expressões de cunho preconceituoso ("não sou tuas negas", "boçal", entre outras) ou em comentários sobre a "beleza exótica" de uma pessoa negra ou em frases como: "eu até tenho amigos negros".
Para Bruna, não há mais espaço para se falar em racismo velado em 2021. "É imoral negar que a cor da pele em nosso país é fator determinante na distribuição de cargos e consequentemente de renda, é incoerente justificar essa ausência em estereótipos que servem tão somente para manutenção do privilégio branco."
Racismo estrutural
É importante entender que todo racismo é estrutural, pois faz parte de um processo em que a organização da sociedade leva determinados grupos a serem subalternos a outros a partir de sua identificação racial.
Consequentemente, o racismo se torna uma ferramenta de discriminação e bloqueio de acesso à educação, saúde, cultura, lazer, trabalho, segurança, entre outros direitos sociais.
"O racismo estrutural pode ser combatido por meio da construção e implementação de políticas públicas elaboradas por pessoas negras que mexam com a estrutura social e educacional desde a educação básica, trabalhando a verdadeira história dos negros no Brasil", analisa Bruna.
É possível uma pessoa negra ser racista?
Como o racismo é uma construção social, é possível uma pessoa negra tenha um comportamento racista. "Entretanto, essas pessoas somente reproduzem o racismo. Pessoas negras com opiniões e posicionamentos racistas não criam o racismo, elas somente o reproduzem", aponta.
"Desde o ingresso na escola a história que nos é contada nos traumatiza. Os estereótipos atrelados à comunidade negra são cruéis. A educação faz parte da estrutura do Estado e o modelo adotado não nos apresenta personagens e mensagens positivas. Quantos personagens da história mundial foram estrategicamente embranquecidos? Cleópatra, Machado de Assis, Jesus, Alexandre Dumas , entre outros. Paulo Freire já dizia: 'quando a educação não é libertadora o sonho do oprimido é se tornar opressor'".
Por que o racismo ainda se perpetua?
Como aponta Bruna, esse tipo de discriminação existe desde a época da Colônia e perdura até os dias atuais. O motivo? Manutenção do sistema de poder por meio da distinção racial.
"Deve-se analisar se as pessoas que ocupam lugares privilegiados de poder e decisão [gerados pelo racismo] cederiam ou dividiriam estes espaços. Questionamento que responde a pergunta: 'o que leva o racismo a persistir em nossa sociedade?'. O racismo no Brasil, infelizmente, persiste em razão da ausência de pessoas negras nos espaços de poder e de decisão, lugares extremamente estratégicos para que se enfrente e, consequentemente, se elimine o racismo", indica Bruna.
Impactos do racismo na sociedade
A marca do racismo no país, de acordo com a advogada, está na forma como a população negra é tratada pela sociedade e pelo Estado.
"A quantidade de crianças negras que são assassinadas pelo Estado; negros que são condenados em crimes que, quando cometidos por pessoas brancas, têm como resultado a absolvição; a composição do Estado em todos os níveis, Municipal, Estadual e Federal; na composição do poder Judiciário... todos de maioria indiscutivelmente branca (...). Nós negros somos alvo do Estado quando somos quantitativamente os mais assassinados, os mais pobres, os com menor nível de instrução, os que menos figuram nos espaços de poder."
Como denunciar casos de racismo?
No Brasil, o racismo é crime passível de punição pela lei nº 7716/89. Para denunciar um caso de racismo e reunir provas, o recomendado é fazer os seguintes procedimentos:
- Ligar para o 190 (Polícia Militar)
- Pegar o nome, endereço e telefone das pessoas que presenciaram
- Pedir para alguém filmar o que está acontecendo
- Anotar placa do carro e outras informações disponíveis para identificar pessoas agressoras
- Registrar Boletim de Ocorrência
- Se o caso ocorreu pela internet, faça prints da conversa/mensagem/e-mail
- A denúncia contra crime de racismo pode ser feita em delegacias comuns e naquelas especializadas em crimes raciais e delitos de intolerância. (Registre o Boletim de Ocorrência)
- Procure um advogado: o profissional irá orientar em relação às provas que devem ser apresentadas e também à punição que caberá aos criminosos
- Disque 100: serviço do Governo Federal para receber denúncias de violações de direitos humanos
- Exija que a discriminação como causa do crime conste no B.O
- Se mesmo seguindo essas orientações, você perceber que houve imprecisão no registro do B.O., entre em contato com o Ministério Público de sua cidade.