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Em 2020, ano de início da pandemia de COVID-19, o Brasil teve o maior número de mortes atribuíveis ao álcool desde 2010. Além disso, houve um aumento de 24% nos óbitos por álcool no primeiro ano da pandemia em comparação com 2019.
Os dados são da pesquisa “Álcool e a Saúde dos Brasileiros - Panorama 2022”, realizada pelo CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool) e publicada na última terça-feira (14). O levantamento foi feito com base em números do DATASUS.
São consideradas mortes atribuíveis ao álcool aquelas que poderiam ser evitadas sem o consumo de bebidas alcoólicas, como envenenamento por álcool, miopatia alcoólica, transtornos mentais e comportamentais, síndrome alcoólica fetal, entre outras.
Pandemia pode ser causa do aumento do número de mortes
Segundo a publicação, foram, em 2020, 8.169 mortes devido ao álcool. Em 2010, esse número foi de 7.153. Dentro desses dez anos, nenhum número foi tão alto quanto no primeiro ano da pandemia da COVID-19, o que pode indicar efeitos indiretos da crise sanitária no consumo abusivo de álcool.
“Enfrentamos com a COVID-19 uma crise de saúde mundial sem precedentes na história recente que, em populações vulneráveis, como os pacientes com transtorno por uso de álcool, pode ter provocado efeitos ainda mais impactantes”, comenta Arthur Guerra, psiquiatra e presidente executivo do CISA.
De acordo com o levantamento, a maior porcentagem de aumento no número de óbitos foi entre adultos de 35 a 54 anos (25,6%), seguidos pela faixa etária de 55 anos ou mais (23%) e por jovens entre 18 e 34 anos (19,5%). Em relação ao gênero, o crescimento foi de 24% entre os homens e de 23% entre as mulheres.
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“O afastamento de redes de apoio e mudanças na rotina podem ser gatilhos para recaídas que, se não tratadas a tempo, podem trazer desfechos negativos. Fortalecer o atendimento e garantir que esses pacientes tenham acesso aos cuidados e ao acompanhamento é fundamental”, completa Guerra.
Número de internações diminuiu em 2020
Apesar de o número de mortes por álcool ter aumentado em 2020, houve uma queda de 15% em internações atribuídas ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas no mesmo ano em relação a 2019. Essa redução foi mais expressiva entre as mulheres (-19%) do que entre os homens (-14%).
Segundo o estudo, a queda no número de internações pode estar relacionada à menor procura por tratamento, especialmente se exigisse hospitalização no período mais crítico da pandemia. Além disso, é provável também que a oferta de tratamento tenha sido prejudicada pela alta demanda recebida pelo sistema de saúde durante a primeira onda da COVID-19.
A menor procura por tratamento já havia sido apontada por pesquisa da Organização Pan-Americana da Saúde, em 2020. Segundo esse estudo, 95% dos brasileiros que relataram consumo abusivo de álcool durante a pandemia não buscaram ajuda.
Porém, o índice era próximo ao de 2019 (92,7%), sugerindo que o isolamento físico não foi o único fator impeditivo da procura por tratamento. Outros fatores, como o estigma e a falta de informação podem ser barreiras para a busca por ajuda.
Falta conhecimento para fazer escolhas mais saudáveis
A publicação do CISA também incluiu uma pesquisa qualitativa realizada pelo Ipec sobre as motivações que levam as pessoas a consumirem bebidas alcoólicas. O objetivo era contribuir para aprofundar o entendimento dos padrões de consumo de álcool no país para aprimorar a formulação de políticas públicas.
Entre as motivações, a maioria diz que bebe para ter sensações positivas; a menor parte o faz para aliviar emoções negativas. Socializar também está entre os motivos do consumo de bebidas alcoólicas. De acordo com a pesquisa, a iniciação acontece ainda no período escolar ou no âmbito familiar.
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Os participantes afirmaram que consomem a bebida alcoólica na quantidade certa, definida de modo individual a partir da percepção dos efeitos que o álcool produz no corpo. Porém, quando apresentados aos parâmetros do consumo abusivo, os entrevistados consideraram as referências “muito baixas” e desacreditaram que as quantidades fossem danosas ao organismo.
“Sem conhecimento e informação de qualidade, dificilmente as pessoas que optam por beber poderão fazer escolhas mais saudáveis e adotar padrões menos prejudiciais de consumo, diminuindo o risco de desenvolverem doenças ou ocasionar lesões”, considera Guerra.
“Quanto mais frequente for o consumo abusivo, maior o impacto negativo do álcool em diversos órgãos e sistemas, especialmente: trato gastrointestinal, fígado, pâncreas, sistema nervoso e sistema cardiovascular”, alerta o psiquiatra.