Dra. Danielle H. Admoni, psiquiatra geral, da Infância e Adolescência, preceptora na residência da Universidade Federal...
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Usar a internet para documentar aspectos da vida dos filhos e a rotina de maternidade e da paternidade é uma prática cada vez mais comum. Compartilhar fotos pode ser uma forma de registrar momentos importantes, mas a superexposição, conhecida como sharenting, pode envolver alguns riscos à privacidade do menor de idade.
“Às vezes, os pais têm uma necessidade muito grande de ficar mostrando a vida nas redes sociais e isso acaba afetando muito a vida das crianças”, aponta Danielle H. Admoni, psiquiatra geral, da Infância e Adolescência, preceptora na residência da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP/EPM) e especialista pela ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).
Em alguns casos, o compartilhamento de dados ocorre através de um perfil criado pelos pais com o nome do menor de idade, em que há postagens e interações de forma a apresentar o cotidiano deles. Também é recorrente a criação de perfis em redes sociais de crianças que sequer nasceram.
“Alguns dos riscos que as crianças e adolescentes encontram na internet são criados pelos próprios pais ou responsáveis que, provavelmente por ingenuidade e desconhecimento dos riscos e perigos do mundo digital, permitem que seus filhos sejam expostos de maneira excessiva”, aponta a cartilha de Proteção de Crianças e Adolescentes na Internet do Governo Federal.
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Quais os riscos do sharenting?
A superexposição nas redes sociais pode ser prejudicial por vários motivos. O principal risco envolve o mau uso dos dados pessoais de terceiro e segurança, tais como:
- Fraude: ao compartilhar informações como fotos e vídeos, pode ocorrer o roubo de identidade — em que as crianças têm seus dados usados ilegalmente sem que isso seja detectado.
- Colocar a segurança em risco: tirar fotografias em locais específicos, como na porta de casa ou na escola, pode ser suficiente para revelar a moradia ou estabelecimento de ensino que ela frequenta. Isso permite que criminosos conheçam a rotina do menor, colocando sua segurança e da família em risco.
- Cyberbullying: documentar situações constrangedoras e embaraçosas, embora possam ser consideradas engraçadas para os pais, pode desencadear situações de bullying no futuro, o que prejudica diretamente a autoestima e a saúde mental;
- Uso do conteúdo para fins sexuais: não é incomum a postagem de crianças nuas ou seminuas, tomando banho ou brincando na praia. Contudo, esse tipo de conteúdo pode ser utilizada por redes de pedofilia para exploração sexual e comercial;
- Prejudica a formação de identidade: crianças estão em processo de formação de identidade. Publicar fotos ou vídeos associando-as a determinadas causas ou partidos é prejudicial pelo fato de, na idade adulta, elas poderem não se identificar com aqueles valores.
Sharenting e a saúde mental de crianças e adolescentes
O sharenting também pode afetar diretamente as emoções das crianças. Na maioria das vezes, os pais compartilham informações dos filhos sem consultá-los — o que, além de expor uma privacidade que lhes pertence, causa prejuízos no futuro. Quando crescerem, eles podem não concordar com o que foi publicado e se sentirem constrangidos, insatisfeitos ou envergonhados.
Além disso, de acordo com Danielle, o adolescente não possui a capacidade psíquica de lidar com rejeição que pode acontecer devido à presença nas redes sociais, ao contrário do adulto — o que prejudica diretamente a sua saúde mental e pode resultar em problemas maiores, como depressão e ansiedade.
Como usar as redes sociais de forma adequada?
A preservação da imagem é uma das principais formas de efetivação ao respeito assegurado ao público infanto-juvenil, segundo o Estatuto da Criança e Adolescente. Desse modo, a presença constante dos pais e responsáveis é primordial para tornar a internet um ambiente seguro para os filhos.
“É importante que eles sejam orientados sobre as melhores formas de uso da internet, para que se sintam seguros ao usarem as tecnologias. Além disso, é importante acompanhar o comportamento das crianças e adolescentes. Atitudes como fechar ou minimizar aplicativos, trancar a porta do quarto, nervosismo, isolamento etc. podem indicar que algo não vai bem”, aponta a cartilha do governo.
A princípio, embora seja difícil erradicar os dispositivos eletrônicos da rotina, bebês com menos de dois anos não devem ter acesso a eles e o uso por crianças com menos de cinco anos deve ser minimizado ao máximo. O tempo máximo recomendado deve ser de uma hora por dia, de acordo com a Academia Americana de Pediatria.
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Já para os pais ou responsáveis, o ideal é reduzir ao máximo a exposição dos filhos nas redes sociais. Algumas medidas devem ser tomadas para proteger a imagem e garantir a segurança da criança, tais como:
- Fique de olho nas políticas de privacidade das redes sociais para saber como proteger a privacidade do menor de idade;
- Crie um perfil fechado, limitando as pessoas que podem ter acesso às fotos, como familiares e amigos próximos;
- Não publique a data de aniversário da criança;
- Não publique fotos das crianças nuas ou com poucas roupas;
- Os pais podem utilizar alertas do Google para saberem quando o nome do filho aparecer nos mecanismos de pesquisa;
- Não compartilhe dados específicos, como a localização da criança.
“É preciso ter cuidado com o que, como e para quem a gente posta. Principalmente no Brasil, é uma questão da segurança física. Nós sempre orientamos não publicar a rotina da criança”, aponta Danielle. “Essa criança cresce vendo todo mundo tirar foto e postando a vida em vez de viver a vida. [...] Nós estamos passando essa imagem para elas, de que a gente só vive a rede social — e isso é uma questão muito arriscada, porque as redes não são a nossa vida real”, finaliza a psicóloga.