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Uma idosa de 81 anos morreu na última sexta-feira (15), em Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, após descobrir que carregava um feto calcificado por mais de 5 décadas. De acordo com informações do G1, a mulher foi encaminhada para o Hospital Regional de Ponta Porã com dores abdominais intensas e um quadro de infecção grave. No mesmo dia, foi realizada uma tomografia 3D, em que foi constatado o bebê calcificado em imagens impressionantes.
Após passar por uma cirurgia para retirada do chamado "bebê de pedra", a idosa foi encaminhada para uma Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), mas faleceu no dia seguinte em decorrência de um quadro de infecção generalizada, que ocorreu a partir de uma infecção urinária.
A suspeita da equipe médica é que o feto estivesse presente no abdômen da mulher desde sua última gestação, há 56 anos. O quadro, conhecido como litopedia, é raríssimo e pode ocorrer quando há falta de conhecimento e acesso à saúde por uma população mais pobre, o que dificulta o diagnóstico na fase aguda.
O MinhaVida conversou com uma especialista e apontou, abaixo, como o litopédio se desenvolve e os principais sinais de alerta do problema. Confira!
O que causa a litopedia?
A litopedia ocorre como consequência de uma gravidez ectópica abdominal não reconhecida, que é quando o óvulo fertilizado se desenvolve fora do útero. Após a morte do feto, eventualmente, o sistema imunológico o reconhece como um corpo estranho e o encobre com uma substância calcificante, preservando-o por longos períodos, até mesmo décadas.
"É uma situação extremamente rara e ocorre quando feto cai na cavidade abdominal e continua a se desenvolver por um tempo, até a interrupção de seu desenvolvimento. Logo, ele vai a óbito e, como não é detectado, ocorre a calcificação com o tempo", explica a ginecologista e obstetra Mariana Rosário.
A maioria dos casos de litopedia é assintomática, então a condição pode não ser detectada, o que aumenta consideravelmente o risco de complicações futuras, como infecções, dores fortes e danos a outras estruturas em que o feto pode estar aderido — como obstrução intestinal, segundo Mariana.
Afinal, como identificar a litopedia?
Normalmente, o diagnóstico da litopedia é feito acidentalmente em exames de imagem, como tomografia, até anos mais tarde. Em alguns casos, a pessoa pode apresentar sintomas associados à presença da massa calcificada, como:
- Dores abdominais
- Indigestão
- Sensação de peso no abdômen
- Constipação crônica
- Abscesso pélvico
Esses sinais já indicam a necessidade de procurar atendimento médico imediato.
Casos apontam o impacto do acesso limitado a cuidados de saúde
Em um caso recente, documentado no periódico BMC Woman's Health, uma mulher congolesa morreu após carregar um feto de 28 semanas por nove anos. Ela descobriu o quadro após cólicas estomacais fortes e indigestão, pois o feto aderiu ao seu intestino, o que interferiu na entrada de nutrientes vitais para a sobrevivência.
A mulher, que era uma refugiada que residia nos Estados Unidos, foi mãe de oito crianças, mas três delas não sobreviveram ao pós-parto. A nona gravidez não foi completa, com a morte intrauterina acontecendo com 28 semanas. Na época, ela revelou ter sido hostilizada e acusada de negligenciar a saúde, o que deixou-a insegura em prosseguir com a remoção cirúrgica do feto.
Uma semana depois, durante uma consulta médica para entrada nos Estados Unidos, a paciente realizou exames abdominopélvicos que confirmaram o diagnóstico de litopédio — além de distensão e obstrução intestinal. Ela foi encaminhada para internação, mas recusou a intervenção por medo de cirurgia e optou pelo monitoramento dos sintomas. A paciente faleceu 14 meses depois devido a desnutrição severa.
"Esse caso demonstra um fenômeno médico raro e o impacto da desconfiança no sistema médico, do baixo conhecimento sobre saúde e do acesso limitado a cuidados de saúde entre populações mais propensas a serem afetadas por um litopédio", aponta o documento.
Casos como esse são possíveis, mas bastante raros. Após um aborto, normalmente é realizado um ultrassom para garantir que o corpo expeliu todo o feto. Um pré-natal adequado também é um fator determinante para prevenir o desenvolvimento de um litopédio.
Referências
Sous, W., Sous, M., Soipe, A. et al. A 50-year-old refugee woman with a lithopedion and a lifetime of trauma: a case report. BMC Women's Health 23, 89 (2023). Disponível em <https://doi.org/10.1186/s12905-023-02244-z> Acesso em 19 de março 2024.