Redatora de saúde e bem-estar, autora de reportagens sobre alimentação, família e estilo de vida.
A chegada do frio é sempre recebida com cautela pelos atletas em virtude das alterações fisiológicas que o corpo sofre com as baixas temperaturas. Nessa época, a atenção com relação à prevenção de lesões aumenta, principalmente entre os nadadores, que costumam sentir mais a mudança do clima por causa do freqüente contato com a água. As maiores preocupações nesse período ficam por conta das lesões musculares e dos problemas nas vias respiratórias.
Os efeitos do frio sobre o organismo seguem basicamente os princípios da física, ou seja, as moléculas tendem a se contrair à medida que a temperatura cai. O mesmo acontece com os músculos do corpo, o que conseqüentemente interfere nos movimentos do atleta. Por causa do frio e da dificuldade de adaptação do organismo ao clima, o músculo se contrai e assim compromete o gesto esportivo, o que favorece as lesões , comenta Ana Lúcia de Sá, doutora em medicina esportiva pela Universidade de São Paulo (USP) e médica do Ambulatório de Medicina Esportiva do Hospital das Clínicas (SP).
O motivo é que a execução de um movimento envolve um grupo de músculos que trabalham em sintonia. Enquanto uns se contraem, outros (os respectivos opostos) relaxam para viabilizar o movimento. Segundo a doutora, a lesão acontece pelo fato de o músculo que deveria estar relaxado, enquanto o outro está contraído para executar o trabalho, também se contrair em virtude da baixa temperatura. O resultado, dependendo do nível da lesão, pode ser uma contratura, um estiramento ou até uma distensão.
No caso da contratura, a mais leve das três, o que ocorre é a contração não controlada (espasmo) de um pequeno grupo de fibras musculares. Já o estiramento, que é considerado uma distensão de primeiro grau, compreende o rompimento de uma quantidade muito pequena de fibras. Com maior gravidade, a distensão é caracterizada quando o rompimento das fibras é parcial (segundo grau) ou total (terceiro grau, quando o músculo se parte ao meio).
As lesões musculares mais freqüentes dentre os nadadores ocorrem nas costas, tanto na região lombar quanto na dorsal. Os nados crawl e costas são os mais propensos a essas contusões, dado o tipo de movimento que o nadador executa na piscina em ambos estilos, caracterizado pela rotação do tronco. Há também casos de contusões nas pernas, mais comuns em atletas que nadam o estilo peito, modalidade que demanda um forte trabalho dos membros inferiores. Os músculos adutores (virilha) e posteriores da coxa são os mais afetados.
O ombro é outra parte do corpo muito acometida por lesões, com maior incidência nos praticantes do nado borboleta. 60% a 70% dos nadadores tiveram ou terão alguma lesão no ombro , afirma o médico Arnaldo Hernandez, presidente eleito da Sociedade Brasileira de Medicina Esportiva, alertando que quanto mais baixa a temperatura, maiores as chances de contusão.
O aumento no gasto de energia (glicogênio) em virtude da baixa temperatura é outro fator que favorece o aparecimento de lesões. Isso porque, com o frio, o corpo acaba utilizando o glicogênio que abastece o músculo para manter a temperatura interna, reduzindo o combustível destinado ao esforço físico. Isso facilita a fadiga do músculo e por conseqüência pode desencadear uma lesão , afirma Ana Lúcia, ressaltando ainda o perigo de uma queda na temperatura corporal, o que pode levar a um quadro de hipotermia quando a mesma atinge menos de 35 graus (o normal do corpo é 36,5 graus). Nesse quadro há uma diminuição do impulso nervoso nas células, o que também interfere no movimento muscular , explica.
Outra alteração provocada pela queda de temperatura do organismo é a vasoconstricção, que é o processo contrário da vasodilatação, ou seja, a contração das artérias. Essa contração diminui a circulação sanguínea e conseqüentemente a irrigação dos músculos, o que também causa a fadiga dos mesmos e aumenta o risco de uma contusão. Há inclusive diminuição na irrigação dos órgãos, o que, dependendo da gravidade do quadro, pode levar o atleta a ter um colapso e até morrer , adverte a doutora.
Mas não só os músculos sofrem nessa época. O sistema respiratório também é bastante prejudicado. A entrada do ar frio nos pulmões faz com que os brônquios se contraiam, o que resulta na chamada broncoconstricção (ou broncoespasmo), que ocorre de forma mais aguda e freqüente nos nadadores asmáticos ou portadores de bronquite ou rinite. A broncoconstricção reduz a capacidade pulmonar e provoca falta de ar no atleta (com conseqüente diminuição da performance), obrigando-o a respirar mais vezes. Isso faz com que ele tenha um maior contato com vírus e bactérias, aumentando sua vulnerabilidade em relação a alguma infecção, haja vista que no frio há uma diminuição dos organismos de defesa do corpo.
A tendência no frio é elevarem a temperatura da piscina (que segundo a Federação Internacional de Natação deve ser mantida entre 25 e 28 graus) e, quanto maior a temperatura, maior a proliferação de fungos e bactérias. Isso facilita uma infecção viral , explica Hernandez. O médico lembra ainda que a vulnerabilidade do atleta é maior após o treino ou a competição, porque ele está com a resistência imunológica mais baixa devido ao intenso esforço físico.
Essas infecções podem atingir as vias aéreas superiores (nariz e boca), olhos e ouvidos. A conseqüência é um quadro de virose, ocasionado por uma faringite, rinite, sinusite ou traqueíte, normalmente acompanhado de febre, o que obrigará o atleta a interromper a atividade por algum tempo , salienta o médico.
Os olhos podem ser acometidos por uma conjuntivite e os ouvidos por uma otite, inflamações com maior incidência no frio. Outro perigo é o vapor do cloro em virtude da piscina aquecida, que acaba sendo inalado pelos nadadores. O risco é uma irritação ou inflamação nas vias nasais, também conhecida como rinite química.
Como evitar os problemas
É preciso estar atento à temperatura da piscina, que não pode estar muito baixa, pois a água fria favorece lesões musculares, nem muito quente, porque pode comprometer a performance do atleta relaxando excessivamente a musculatura. O ideal é que ela fique entre 25 e 30 graus. Para os atletas de águas abertas, aconselha-se o uso de roupas de borracha (próprias para o nado) para manter a temperatura do corpo, além de atenção com o aquecimento e alimentação.
O aquecimento deve ser feito não só dentro, mas também fora da água, neste caso com um agasalho adequado para inibir o impacto do frio. Ele deve ser precedido de um alongamento de todo o grupo muscular. Para isso, é necessário atenção quanto ao horário das competições para que haja tempo hábil ao aquecimento e alongamento. No caso de atraso da prova, é importante manter o corpo aquecido até ela começar.
A ingestão de bebidas quentes, como café, chá ou leite com chocolate, antes ou depois das provas ou treinos, também é aconselhada para ajudar a manter a temperatura do corpo. No caso do leite com chocolate, é preciso levar em consideração o tempo necessário para digestão antes da prova. Após a prova, ele é um excelente repositor de carboidratos e proteínas. Já o café é indicado antes da prova, por ser um estimulante natural, não considerado doping.
A alimentação também é muito importante nessa época, pois há um maior de gasto energia. O indicado é aumentar a quantidade de carboidratos na dieta, de acordo com a necessidade de cada atleta. O carboidrato é a principal fonte de glicogênio muscular, que fornece energia para o esforço físico e para manter o corpo aquecido. A hidratação também é outro aspecto importante, pois o atleta acaba se desidratando mais rápido em virtude da necessidade de respirar mais vezes.
A dica para evitar o contágio de alguma virose após o treino ou prova é procurar não ficar em aglomerações, pois a resistência menor deixa o atleta vulnerável a qualquer infecção pelo ar nessa época. Os problemas com o ouvido podem ser evitados com a utilização de um protetor de borracha porosa ou silicone durante o nado. Para proteger os olhos são indicados os tradicionais óculos de natação. Após sair da piscina ou do mar, deve-se lavar bem os olhos e ouvidos no banho. O soro fisiológico (0,9%) é muito utilizado para diminuir a irritação do cloro nas vias nasais. A vias devem ser lavadas com o soro por meio de conta gotas ou spray. Para aqueles atletas que já sofrem de problemas como asma, rinite ou bronquite, o conselho é manter os medicamentos para evitar crises e seguir a rotina de recomendações do especialista.
Principais problemas: Contusões musculares
Soluções: Aquecer e alongar os grupos musculares do corpo antes dos treinos ou competições
Principais problemas: Vias respiratórias
Soluções: Evitar piscinas demasiado quantes e aglomerações após intenso esforço físico
Principais problemas: Perda de glicogênio
Soluções: Aumentar a quantidade de carboitdratos na dieta
Principais problemas: Rinite Química
Soluções: Lavar as vias nasais com soro fisiológico após contato com o cloro
Principais problemas: Hipotermia
Soluções: Ingerir bebidas quantes e usar roupa de borracha em águas de baixa temperatura
Principais problemas: Conjuntivite
Soluções: Usar óculos para natação
Principais problemas: Otite
Soluções: Utilizar protetor de ouvido durante o nado