Precisamos admitir que o futebol pode trazer valiosas lições que vão além do esporte e se refletem na carreira e nos relacionamentos pessoais. Treino, equipe unida, foco e motivação são só alguns atributos para um time campeão. Fora de campo não é diferente. Na vida, para alcançar qualquer objetivo, é necessário o mínimo de estratégia.
Foco no lance!
A concentração pode ser listada como a primeira das lições que o esporte nos traz. Antes de disputar uma competição importante, comissão técnica e jogadores ficam "concentrados" em um espaço sem os prazeres "mundanos" por perto. Contrariando a afirmação recente do técnico Dunga de que "nem todo mundo gosta de sexo, de tomar vinho ou sorvete", passar dias e dias sem diversão é uma missão árdua para quem tem sangue nas veias. Entretanto, a concentração acaba sendo uma forma de terapia coletiva, que visa a equilibrar o estado emocional dos jogadores, afastando-os de distrações e ajudando cada um a focar num objetivo único: a vitória.
Na vida cotidiana, principalmente no trabalho, estar concentrado é fundamental para evitar erros e ter que refazer as tarefas. Mas, trabalhando o dia todo na frente do computador, isso se torna uma missão para craques, pois a Internet nos oferece distrações tentadoras, de fazer inveja a Vagner Love, atacante brasileiro conhecido pelas escapadelas nas concentrações. Seu colega de time, Adriano, o Imperador, apesar do talento, dizem os entendidos, ficou de fora da Seleção Brasileira por indisciplina.
Entretanto, Neném Prancha, conhecido como o filósofo da bola, é dono da máxima que traz um contraponto à rigidez das concentrações: "se concentração ganhasse jogo, o time da penitenciária seria campeão invicto". Na vida prática, viver em um isolamento parecido com as concentrações dos jogadores faz com que você não desfrute dos prazeres, priorizando apenas o trabalho.
Por que então não experimentar a Pomodoro Technique, tática do escritor italiano Francesco Cirillo para driblar as distrações que tanto atrasam nosso jogo da vida cotidiana? Consiste no seguinte: quando tiver uma tarefa que exige dedicação, comece a fazê-la e programe um despertador (por isso o nome "pomodoro", inspirado no formato popular dos timers de cozinha) em 25 minutos. Até o alarme tocar, você deve dar tudo de si àquela tarefa, com a recompensa de poder descansar cinco minutos quando o alarme soar.
Time unido
De acordo com a psicóloga Andréa Garcia, uma das maiores lições que o esporte nos dá é que devemos sempre pensar no outro. "Não somos sozinhos e não devemos agir de forma individualista, em suma, temos que ter o espírito de equipe", diz ela. Um time campeão não é feito apenas de camisas 10, cada um tem sua função e os gênios individuais não conseguem se sustentar se a equipe não estiver em sintonia. Para o administrador de empresas Alcides Beé, uma das lições do futebol para o bom profissional é: "quando um trabalho em equipe é bem conduzido os resultados são sempre os melhores", aponta.
Ou seja, fora dos campos, a dupla esquema tático e entrosamento só traz bons resultados. Assim como no futebol, em que o individualismo não exclui a solidariedade, quem não sabe repassar conhecimentos para o outro e não se preocupa com a influência de seu trabalho nos resultados finais acaba colaborando para uma derrota de lavada. Um exemplo de organização de equipe é o "futebol total", conhecido como "carrosel holandês". Nele, os jogadores saem de suas posições de jogo originais e são substituídos por outros. Neste sistema, ninguém fica com uma posição de jogo fixa, o que pode contribuir para fortalecer o time, pois se torna mais difícil de marcar - a exemplo da Holanda, que chegou, com esse esquema, a duas finais de Copa do Mundo seguidas em 1974 e 1978.
Além disso, do lado do torcedor apaixonado, vemos que muitos entram em campo, por estarem contagiados pelo espírito de equipe. "Ele é o juiz, técnico, preparador físico, jogador, enfim, experimenta muitos papéis em apenas 90 minutos", diz a psicóloga Andréa.
Nenhum jogador pode ser maior que o jogo, ou seja, ninguém alcança nenhum objetivo sem o braço do outro e sem conhecer o trabalho como um todo, algo quase natural: é impossível ser feliz sozinho, como prega o refrão de Tom Jobim. "Muitas pessoas, no ambiente de trabalho, estão trabalhando em grupo e não em equipe, onde o trabalho é individual e cada um se preocupa em realizar apenas sua tarefa e pronto", explica a psicóloga.
Um grupo é apenas um conjunto de pessoas com objetivos comuns que, em geral, se reúnem por afinidades. A família também reflete essa situação. Há famílias em que os membros se ajudam e se apóiam de fato. Há outras que apenas servem para protagonizar belas fotos na parede.
Fome de gol
A palavra gol vem da palavra inglesa goal, que também significa meta. Saber aonde quer chegar e como irá chegar faz com que você conheça a fundo seu objetivo, trace as possíveis consequências e as dificuldades que enfrentará. Essa estratégia acaba oferecendo um motivo para assumir um compromisso com o seu próprio sucesso, pois ninguém se compromete de verdade com aquilo o que não conhece, afinal. Sem isso, é muito pouco provável que alguém consiga o que quer. Não se esquecer dos obstáculos é parte fundamental para a vitória. Entretanto, uma estratégia coerente para superá-los envolve esforços. O administrador de empresas Alcides Beé, coloca outra lição importante para a vida profissional: "os obstáculos só serão fortes se a nossa preparação tiver sido fraca".
O efeito homem-gol
Se por um lado o espírito de equipe é fundamental para a vitória, nada acontece sem o talento; não importa a função exercida, a criatividade individual é fundamental. Não adianta saber a importância de passar a bola, é necessário fazê-lo de forma certeira - e conseguir, vez ou outra, um drible desconcertante, de impacto, capaz de deixar o zagueiro adversário no chão.
O ex-jogador Zico, ídolo da torcida brasileira e atual diretor do Flamengo, dá uma lição de talento sem entrar na onda do estrelismo. Ele jogou em um pequeno time da Itália, o Udinese, onde, por ser um grande jogador, foi recebido como rei. Mesmo assim não se colocou como salvador da pátria, apesar de seu desempenho ter sido bastante importante para o clube conseguir o vice-campeonato na série A da temporada de 1983/84.
No jogo da vida, a força e as habilidades são fundamentais, porém não há um padrão, pois cada um tem suas potencialidades. Além disso, um craque é aquele que não se limita ao básico. Na vida profissional, cada pessoa tem um talento específico que contribui com o trabalho de equipe.
Sendo assim, é preciso descobrir qual é o seu ponto forte, investir nele, e observar o que falta, tanto para alcançar metas profissionais, quanto para, conhecendo melhor a si mesmo, encontrar pessoas que tenham a ver com você, ou tragam um repertório de habilidades e ideias que se somem às suas. E também vale lembrar que não basta possuir as qualidades se você não acredita nelas, pois, assim, fazer com que as pessoas as enxerguem ficará bem mais difícil.
O músico Chico Buarque, um fluminense inveterado, canta na música O Futebol: "pintura é mais fundamental que um chute a gol". Em outras palavras: vale ressaltar a importância de mostrar as qualidades, para comunicar todo o potencial, algo bastante avaliado no ambiente de trabalho. Mas não vale confundir essa jogada de classe e cair na firulagem - que te faz perder a jogada e, às vezes, a partida.
Aguenta coração!
A paixão é quase eixo central do comportamento dos torcedores fanáticos, que pode também trazer uma lição para a vida. "O futebol é um grande gerador de paixões. É claro que se o seu time perde você não fica satisfeito, mas é bom lembrar que durante aqueles 90 minutos da partida você torceu, vibrou e depositou sua confiança nele", como diz Marcelo Sadio, autor do livro "Amor Infinito, o sentimento não pode parar", de fotos que retratam o amor do torcedor do Vasco pelo seu time do coração. O fotógrafo conclui: "a lição que tiro disso é que devemos ser mais apaixonados por aquilo que fazemos e por nossa própria vida em si, pois isso é o que move os bons resultados e nossa própria crença na vida".