Nilda Jock é psicanalista, socióloga, pós- graduada em filosofia da educação pela PUC- SP, especialista em atendimento d...
iQue coisa sombria é essa que provoca o desligamento do mundo e que retira o prazer na vida, fazendo tudo perder o sentido? Nem mesmo a família e amigos podem oferecer conforto para quem está nessa situação, que dirá ir ao cinema ou encontrar algo que inspire na televisão! O mal-estar vai além.
Não deixa dormir - pois nunca se sabe quando o sono vai vencer a vigília ? faz com que o futuro pouco importe, aumenta os momentos de raiva e contribui para o afastamento de pessoas queridas. De certa forma tem-se a sensação de que o sentimento é de inveja ao ver os outros implicados no seu dia a dia, empenhados para que tudo saia bem, envolvidos com o mundo e seus afazeres.
Algo em você se desfaz. Parece vigorar uma impossibilidade de enxergar, de reencontrar algo que foi fundamental e que deu sentido até então aos dias que se foram.
Algumas vezes é possível identificar quando isso começou. Às vezes é porque a pessoa se sentiu perdida sem a presença de alguém que muito queria. Ou então, ela se dá conta de uma forma incisiva do envelhecimento e percebe que o vigor e a saúde não correspondem mais ao de uns anos atrás. Anos que trazem muita saudade, uma nostalgia de algo que nunca mais será vivido e essa constatação é cortante.
Porém, nem toda dor psíquica tem relação com um trauma específico pode identificada. Uma falha, uma negligência por parte dos pais pode levar a um sentimento crônico de abandono que nem sempre é possível pontuar, ou seja, nem sempre isso é tangível e passível de reconhecimento. E tudo isso naturalmente é muito singular. Há situações em que dentro de uma mesma família, criados pelos mesmos pais, filhos têm percepções completamente diferentes a respeito da infância do apoio ou desatenção.
O fato é que o efeito promovido por essa compressão, esse embotamento propaga uma desvitalização não apenas dos sentidos como também da linguagem. Ocorre uma espécie de empobrecimento verbal, em que não se sabe o que nasceu antes, a dificuldade em identificar o que se passa ou a capacidade de verbalização, que de uma hora para outra se torna desarticulada, incapaz de simplesmente descrever com acuidade a dor que transita ali.
Nesse momento parece que a fala vem oca sem conteúdo, como se estivesse chancelando o nada de sentimento, o vácuo de desejo, o retraimento de toda a esperança. Não podemos esquecer que esse mal-estar vai aos poucos solapando os diversos terrenos em que se circula e consequentemente promovendo fracassos no desempenho de funções próprias do cotidiano, seja no trabalho, nos estudos, nas tarefas corriqueiras ou mais complexas.
Finalmente, a própria aparência sofre uma obliteração, como um apagamento de expressão, de brilho, da capacidade de apurar-se no cuidado estético, mas vai além, a tonalidade da voz torna-se sem vibração, sem nuances de exaltação ou de dor, uma expressão espalmada, sem relevo. Pode-se resumir a impressão do que se vive como um congelamento da condição de lembrar, expressar, desejar e projetar. Ou seja, é de se perguntar aonde foram parar as potencialidades da vida psíquica. E devolver essa capacidade à sensação, à dor, à alegria e à fala é necessariamente um processo que precisa de dois.
Juntos terapeuta e paciente constroem um espaço de relacionamento, onde então o inconsciente tem chance de atuar, expondo sua forma de construir as idéias, os medos, as angústias, onde a consciência passa dialogar com o desejo e respeitá-lo. Não se pode esquecer que hoje em dia é possível desmoronar com o peso das palavras desconsideradas, das condutas obrigatórias, de aparências que precisam ser preservadas a qualquer custo. No que concerne ao psiquismo estamos falando de um estado, não necessariamente de uma doença, assim, a melhora está muito atrelada a uma transformação existencial de um sujeito que sofre.
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