Geralmente nem percebemos, mas transtornos dissociativos fazem parte do nosso dia a dia. Alguns deles são mais conhecidos pelos personagens de cinema, como o transtorno dissociativo de identidade, popularmente chamado personalidade múltipla. Outros, são mais comuns, mas de maior dificuldade de identificação, como a despersonalização. "A característica essencial dos transtornos dissociativos é uma perturbação nas funções habitualmente integradas de consciência, memória, identidade ou percepção do ambiente" (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-IV-TR). Saiba quais são as características destes transtornos e como tratá-los.
Amnésia Dissociativa
Caracteriza-se por esquecimento de fatos importantes, em geral, situações de natureza traumática ou estressante. Marcada mais pela fragmentação da personalidade do que pela formação de múltiplas personalidades. Os casos mais graves desta amnésia podem envolver toda a vida do sujeito, que costuma apresentar-se a polícia ou hospitais procurando ajuda sem saber da própria identidade.
Fuga Dissociativa
Marcada por viagem súbita e inexplicada para longe de casa. Em geral apresenta também lacunas de memória e confusão mental. Tais viagens podem durar dias ou meses e alguns casos podem atravessar várias fronteiras. Pode haver formação de uma nova personalidade que funciona nos locais onde chega. O sujeito não cria estas personalidades intencionalmente e, em geral, não tem consciência delas.
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Transtorno Dissociativo de Identidade
Há formação de duas ou mais personalidades que se revezam no controle do sujeito. Em geral, há lacunas de memória significativas. As diferentes personalidades podem apresentar até diferentes somatizações. Por exemplo, uma delas tem alergia e a outra não. Além disso, podem apresentar idade e gênero diferentes da personalidade de origem. O sujeito não cria estas personalidades intencionalmente e em geral não tem consciência delas.
Transtorno de Despersonalização
Há um sentimento de distanciamento e estranhamento de si mesmo. Indivíduos com este quadro geralmente dizem ter a sensação de não estarem vivendo a realidade apesar de saberem que estão vivendo a realidade. É como se fizessem parte de um filme, vivessem sonhando um sonho sem autonomia. É comum que digam que há alguma coisa entre eles e a realidade quase como uma nuvem, um vidro, alguma barreira invisível. Pode haver sensação de anestesia sensorial e sentimento de perda de controle, inclusive da fala.
É necessário muito esforço para prestar atenção, por isso, trabalhar e estudar pode ser muito desgastante. Frequentemente, os pacientes relatam que ouviram a vida toda que estes sintomas eram de pressão baixa e fraqueza apesar de sua saúde física em ordem.
Como seus sintomas são de difícil descrição os pacientes temem estarem "loucos". "A desrealização também pode estar presente, sendo vivenciada como um sentimento de que o mundo é estranho ou irreal. O indivíduo pode perceber uma alteração insólita no tamanho ou na forma dos objetos (macropsia ou micropsia), e as pessoas podem parecer estranhas ou mecânicas. Outras características associadas incluem sintomas de nsiedade, sintomas depressivos, ruminação obssessiva, preocupações somáticas e uma perturbação do sentido do tempo" (DSM-IV-TR, 2008, pag.507).
Os sintomas de despersonalização e desrealização também podem ocorrer em crises de pânico, ansiedade e Transtorno do Estresse Pós Traumático.
Tratamento
Pela minha prática clínica e estudos, os Transtornos Dissociativos são causados por traumas psicológicos. Considerando que o trauma é uma experiência forte demais, rápida demais ou que acontece muito cedo em nossas vidas, sendo de difícil processamento para cérebro. Experiências não processadas são como uma "ferida" no cérebro, que impede seu funcionamento integrado.
Costumo usar como metáfora a internet. Imagine que seu cérebro possui todas as informações disponíveis na internet hoje. Você pode acessar todo o material disponível no planeta, mas de repente algo acontece e você perde parte do acesso, o que pode gerar amnésia, ou passar a seguir comandos sem saber o motivo. Em casos mais graves parte do conteúdo pode tomar vida própria e competir com outros conteúdos do seu cérebro para ter espaço, o que seria o transtorno dissociativo de identidade.
Saiba mais: Por que fazer terapia?
A Experiência Somática, o Brainspotting e o EMDR (dessensibilização e reprocessamento pelos movimentos oculares) tem se mostrado técnicas eficazes para o processamento e integração das informações. Dependendo da gravidade dos sintomas e comprometimento da qualidade de vida, a ajuda psiquiátrica pode ser importante até que os traumas sejam processados e o indivíduo recupere a integridade de sua identidade, memória, consciência e percepção.