Psicóloga especialista em tratamento de dependentes químicos, terapia familiar sistêmica, terapia cognitivo comportament...
iManuela Pagan é jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero (2014) e em fisioterapia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2008).
iO que é Síndrome de abstinência alcoólica?
A síndrome de abstinência alcoólica (SAA) está associada com o alcoolismo. Durante as crises, a pessoa pode sentir tremores, náuseas, insônia, entre outros sintomas. Confira mais informações sobre o assunto e não deixe de procurar ajuda médica.
O que é a síndrome de abstinência alcoólica?
A síndrome de abstinência alcoólica é um conjunto de sintomas que ocorrem quando uma pessoa para de consumir álcool após um período prolongado de consumo excessivo e frequente de bebida alcoólica.
Causas
As causas específicas da síndrome de abstinência alcoólica ainda não estão completamente compreendidas, mas geralmente estão relacionadas aos efeitos do álcool no sistema nervoso central.
Quando o álcool é consumido regularmente e em grande quantidade, o cérebro se adapta a sua presença, compensando seus efeitos depressores, o que resulta em uma mudança no equilíbrio químico do cérebro.
Com o tempo, o cérebro se acostuma a funcionar com níveis mais altos de álcool e se torna menos sensível aos seus efeitos. No entanto, quando uma pessoa para de beber repentinamente, o cérebro continua funcionando em um estado de "superexcitação", causando sintomas de abstinência.
Alguns fatores que podem contribuir para o desenvolvimento da síndrome de abstinência alcoólica incluem:
- Consumo excessivo e prolongado de álcool
- Dependência física: a síndrome de abstinência clássica ocorre principalmente em pessoas com dependência física do álcool. Isso significa que o corpo se acostumou à presença do álcool e se adaptou a ele, de modo que a interrupção repentina causa uma resposta de abstinência
- Histórico de abstinência prévia: pessoas que já passaram por episódios anteriores de abstinência têm maior probabilidade de desenvolver sintomas mais graves em episódios futuros
- Fatores genéticos: alguns estudos sugerem que certos genes podem influenciar a suscetibilidade de uma pessoa à síndrome de abstinência alcoólica
- Estado de saúde geral: condições médicas preexistentes, como problemas hepáticos, transtornos psicológicos e transtornos psiquiátricos, podem aumentar o risco e a gravidade da síndrome
Como o álcool age no nosso cérebro
Esta síndrome acontece por diferentes mecanismos. Para entender melhor, é preciso saber que o equilíbrio neuroquímico do cérebro é mantido por dois tipos de neurotransmissores: os excitatórios e os inibitórios.
O principal neurotransmissor inibitório é o GABA, que atua por meio do neurorreceptor GABA-A. Já o principal neurotransmissor excitatório é o glutamato, que tem como neurorreceptor o N-metil-D-aspartato (NMDA).
E aí é que está o problema: o consumo de álcool leva ao aumento do efeito do GABA no neurorreceptor GABA-A, o que provoca uma menor excitabilidade cerebral global.
A exposição contínua ao álcool leva a uma diminuição compensatória da resposta do GABA no neurorreceptor GABA-A, que é percebida pelo aumento gradual da tolerância do corpo aos efeitos do álcool.
Saiba mais: Como o corpo sofre com excesso de álcool.
Fatores genéticos e o alcoolismo
Há evidências de que fatores genéticos desempenham um papel importante no desenvolvimento do alcoolismo.
Pesquisas identificaram certas variações genéticas que podem influenciar a maneira como o corpo metaboliza o álcool e como o cérebro responde aos efeitos do álcool.
Por exemplo, certas enzimas responsáveis pela metabolização do álcool, como a álcool desidrogenase e o aldeído desidrogenase, têm variantes genéticas que podem afetar a velocidade do metabolismo. Isso pode influenciar a tolerância à substância e a suscetibilidade a seus efeitos negativos. Pessoas asiáticas, por exemplo, tendem a ter menor tolerância ao álcool exatamente por conta da quantidade menor de enzimas presentes no corpo.
Além disso, estudos de famílias e gêmeos sugerem que o alcoolismo tem um componente hereditário significativo. Pessoas com familiares de primeiro grau (pais, irmãos) que têm alcoolismo têm maior probabilidade de desenvolver a doença em comparação com a população em geral. Estima-se que a contribuição genética para o risco varia de 40% a 60%.
Em resumo, embora a genética possa influenciar a suscetibilidade ao alcoolismo, o desenvolvimento da doença é resultado de uma interação complexa entre fatores genéticos e ambientais.
Sinais
Os sintomas da síndrome de abstinência alcoólica podem variar de leves a graves, e o início geralmente ocorre dentro de algumas horas a alguns dias após a interrupção do consumo de álcool.
Alguns dos sintomas e sinais comuns incluem:
- Agitação e irritabilidade
- Ansiedade
- Tremores e espasmos musculares
- Insônia
- Náuseas e vômitos (irritações intestinais)
- Suores frios
- Aumento da frequência cardíaca e pressão arterial
- Alucinações (visuais, táteis ou auditivas)
- “Delirium tremens” (DT) - uma sensação grave caracterizada por tremores intensos, confusão mental, intoxicação, alucinações e convulsões
Quanto tempo duram os sintomas da abstinência do álcool?
A crise de abstinência alcoólica pode variar dependendo de vários fatores, incluindo a intensidade do consumo de álcool, a frequência do consumo, a duração do uso e a saúde geral da pessoa. Em geral, os sintomas de abstinência do álcool começam a se manifestar dentro de algumas horas a alguns dias após a interrupção do consumo de álcool e podem durar por vários dias ou até mesmo semanas.
Há diferença da síndrome de abstinência alcoólica entre homens e mulheres?
Embora os sintomas de abstinência alcoólica possam ocorrer em ambos os sexos, existem algumas diferenças notáveis da síndrome de abstinência alcoólica entre homens e mulheres que podem afetar a gravidade e a manifestação dos sintomas.
Entre as principais, temos:
Metabolismo do álcool
As mulheres têm menor quantidade de enzimas responsáveis pela metabolização do álcool no organismo em comparação aos homens. Portanto, elas tendem a atingir níveis mais elevados da substância no sangue em consumo menor, o que pode resultar na abstinência.
Peso corporal e distribuição de gordura
As mulheres geralmente têm um peso corporal menor e uma proporção maior de gordura em relação aos homens. Como a gordura retém o álcool por mais tempo, isso pode prolongar a eliminação dele no organismo feminino, levando a sintomas prolongados.
Hormônios
Flutuações hormonais durante o ciclo menstrual e durante a gravidez podem afetar a maneira como as mulheres respondem à abstinência alcoólica, além de tornar os sintomas mais intensos em certos momentos.
Sensibilidade ao estresse
Em geral, as mulheres tendem a ter maior sensibilidade ao estresse em comparação aos homens. A abstinência alcoólica é um processo estressante para o corpo, e a resposta ao estresse pode variar entre os sexos, afetando a maneira como os sintomas são experimentados.
Diagnóstico
O diagnóstico da síndrome de abstinência alcoólica é baseado principalmente na história clínica do paciente e na avaliação dos sintomas apresentados. Não existem exames laboratoriais específicos para confirmar, mas alguns testes podem ser realizados para auxiliar na avaliação e exclusão de outras condições médicas.
Ao avaliar a possibilidade da síndrome, os médicos geralmente consideram os seguintes critérios:
- História de consumo de álcool, incluindo a quantidade e a frequência do consumo, bem como a duração do uso
- Sintomas de abstinência
- Exclusão de outras condições: o médico também pode solicitar exames de sangue e físicos para descartar outras condições médicas que possam estar causando os sintomas, como incluir análises para verificar o funcionamento hepático, níveis de eletrólitos e avaliação geral da saúde do paciente
Além disso, há alguns exames que podem ser realizados para identificar se há outros problemas de saúde decorrentes da síndrome:
Exames físicos
Ajudam a investigar complicações como arritmia, insuficiência cardíaca congestiva, doença arterial coronariana, sangramento gastrointestinal, infecções, doenças do fígado, comprometimento do sistema nervoso e pancreatite.
Exames laboratoriais básicos
Hemograma completo, testes de função hepática, exame de urina e determinação dos níveis de álcool e eletrólitos no sangue podem ser solicitados pelo profissional.
Buscando ajuda médica
A dependência alcoólica pode ser tratada por diferentes especialidades médicas e profissionais de saúde.
- Psiquiatria: especialistas em saúde mental que podem ajudar no diagnóstico e tratamento, bem como oferecer suporte para questões emocionais e clínicas
- Psicologia: realizando terapia individual ou em grupo, auxiliando na identificação e mudança de padrões de pensamento e comportamentos relacionados ao consumo de álcool
- Programas de reabilitação e aconselhamento: existem clínicas e programas especializados no assunto que oferecem suporte médico, terapia comportamental, aconselhamento e outras abordagens terapêuticas para ajudar na recuperação
- Grupos de apoio: participar de grupos de apoio, como Alcoólicos Anônimos (AA), pode ser benéfico para a recuperação, fornecendo apoio de pares e um ambiente de compartilhamento de experiências
Com relação a como procurar ajuda para a síndrome de abstinência alcoólica, é importante buscar esse auxílio quando você ou alguém que conhece apresentar sinais de um problema com o consumo de álcool.
Alguns dos principais sinais para detecção, incluem:
- Desejo incontrolável de beber
- Incapacidade de parar ou reduzir o consumo
- Tolerância ao álcool — quando você precisa consumir quantidades cada vez maiores de álcool para sentir os mesmos efeitos que antes eram alcançados com menos volume
- Prejuízos na vida pessoal e profissional
- Sintomas físicos e emocionais
Tratamento
O tratamento para a síndrome de abstinência alcoólica é abrangente e envolve uma combinação de abordagens médicas, terapêuticas e de suporte. O objetivo é ajudar a pessoa a superar o vício em álcool, alcançar a sobriedade e manter um estilo de vida saudável.
Em linhas gerais, o procedimento médico para síndrome de abstinência alcoólica vai depender sempre da melhor abordagem do profissional para identificar a dimensão e gravidade do problema.
Como principais abordagens e formas de conduta para o tratamento, temos:
- Desintoxicação: durante o procedimento, a pessoa é monitorada para garantir a segurança e o conforto durante a retirada do álcool do organismo
- Medicamentos
- Terapia comportamental: terapia em grupo, individual ou em família ajudam. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é frequentemente utilizada, tendo como objetivo auxiliar uma pessoa a identificar e modificar padrões de pensamento e comportamentos prejudiciais ao consumo de álcool. Outras abordagens, como a terapia motivacional e a terapia familiar, também podem ser excelentes
- Grupos de apoio
- Tratamento de condições coexistentes: muitas vezes, o alcoolismo está associado a outras condições de saúde mental, como depressão, ansiedade ou transtornos de personalidade. O tratamento adequado a essas condições é essencial para a recuperação completa
Saiba mais: Tratamento do alcoolismo: conheça as opções terapêuticas.
Medicamentos
Há medicamentos para a síndrome de abstinência alcoólica que auxiliam no tratamento.
O mais comum é o dissulfiram, que provoca sintomas respiratórios, como náuseas e vômitos, quando a pessoa consome álcool. Outro medicamento é a naltrexona, que reduz os desejos e a sensação de prazer associada ao álcool.
Além disso, o acamprosato pode ser prescrito para ajudar a manter a abstinência e reduzir os sintomas de abstinência.
Outros medicamentos para síndrome de abstinência alcoólica são:
Somente um médico pode dizer qual o medicamento mais indicado para o seu caso, bem como a dosagem correta e a duração do tratamento. Não interrompa o uso do medicamento prescrito sem consultar um médico antes.
Tem cura?
A abstinência alcoólica pode variar de um distúrbio moderado até uma condição grave e potencialmente fatal – depende muito dos órgãos que foram comprometidos pelo consumo exagerado de álcool e das complicações decorrentes.
Alguns sintomas, como alterações no sono, mudanças rápidas de humor e fadiga, podem permanecer por meses. Também pode haver recaídas durante o processo de reabilitação.
Muitos pacientes com síndrome de abstinência alcoólica conseguem se recuperar totalmente com a ajuda do tratamento e dos familiares e amigos.
Saiba mais: Tratamento previne recaída de dependentes alcoólicos.
Prevenção
A prevenção do alcoolismo envolve uma série de abordagens e medidas que podem ajudar a reduzir o risco de desenvolver um problema com o álcool.
Como principais ações para a prevenção:
- Educação e conscientização: é fundamental fornecer informações precisas e educar as pessoas sobre os riscos e consequências do consumo excessivo de álcool.
- Ambientes saudáveis: promova ambientes saudáveis, como escolas, locais de trabalho e comunidades, onde o consumo excessivo de álcool não seja incentivado. Isso pode incluir políticas de consumo responsável, restrições à publicidade de bebidas alcoólicas e promoção de estilos de vida saudáveis e alternativas não relacionadas à substância.
- Fortalecimento das habilidades pessoais: isso envolve ensinar estratégias de resolução de problemas, habilidades de comunicação eficazes e a importância de estabelecer limites pessoais.
- Apoio familiar: o apoio e a comunicação aberta dentro da família são cruciais. É necessário fornecer orientação e modelar um comportamento saudável em relação ao álcool, evitando o consumo excessivo e mantendo uma atmosfera familiar positiva.
- Acesso a tratamento e suporte: isso inclui serviços de aconselhamento, grupos de apoio, programas de reabilitação e intervenções médicas quando necessário.
Convivendo (Prognóstico)
É importante destacar que a SAA pode ser perigosa e, em casos graves, requer atenção médica imediata.
No entanto, existem algumas medidas que podem ser tomadas para lidar com as crises.
- Busque orientação médica
- Evite a auto reabilitação
- Procure apoio emocional
- Evite gatilhos
Quais sequelas e danos podem ocorrer com quem tem alcoolismo
O abuso do álcool, em qualquer um dos estágios, pode trazer consequências e danos muitas vezes irreparáveis. Além da questão psicológica e social, também pode trazer prejuízos à saúde física, como:
- Danos ao fígado: hepatite alcoólica, esteatose hepática (acúmulo de gordura no fígado) e cirrose hepática
- Problemas no sistema digestivo: inflamação do pâncreas (pancreatite), gastrite, úlceras no estômago e câncer gastrointestinal
- Danos ao sistema nervoso: problemas neurológicos, como neuropatia periférica, encefalopatia, entre outros
- Problemas cardíacos: pode causar hipertensão, arritmias cardíacas, cardiomiopatia alcoólica e aumentar o risco de doenças cardiovasculares
- Complicações psicológicas: depressão, ansiedade e transtornos do uso de substâncias psicoativas
Saiba mais: Consumo de álcool está ligado a 14 tipos de câncer.
Há hábitos e alimentos que ajudam na abstinência de álcool?
Há alguns outros autocuidados para síndrome de abstinência alcoólica que implicam em mudanças de hábitos. Anote as dicas:
- Mantenha-se hidratado: beba bastante água para evitar a desidratação, que é comum durante a abstinência alcoólica. Isso também ajuda a eliminar as toxinas do seu corpo.
- Repouso adequado: durante a abstinência, é comum sentir fadiga e problemas de sono. Tente descansar o máximo possível e estabelecer uma rotina de sono regular.
- Alimente-se bem: consuma uma dieta equilibrada e saudável. Isso ajuda a fornecer nutrientes essenciais ao seu corpo e pode ajudar a reduzir alguns sintomas da abstinência.
Referências
American Family Physician
Organização Mundial da Saúde (OMS)