Graduada em Medicina pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1984, é especialista em Nefrologia pela Soci...
i A relação entre a hipertensão arterial e a saúde dos rins é um binômio extremamente importante, pois a hipertensão arterial pode prejudicar a saúde dos rins ou os rins serem responsáveis pelo aumento da pressão arterial. Classicamente dizemos que os rins são vítimas da ou culpados pela hipertensão arterial.
A pressão arterial nada mais é do que uma força física através da qual o sangue bombeado pelo coração ?caminha? por uma via (artérias) para levar os suprimentos necessários aos órgãos. Quando a pressão está aumentada (hipertensão arterial) a força que o coração precisa fazer para bombear o sangue é maior, pois a via (artérias) está menos complacente, isto é, as artérias oferecem maior resistência à passagem do sangue. Esta força maior que ?empurra? o sangue para frente resulta em lesões na parede das artérias, e essa lesão acomete todas as artérias, de calibre grande ou pequeno (arteríolas).
Isso vale para os rins também. Frente à elevação da pressão (hipertensão arterial) as artérias e arteríolas renais são acometidas, resultando em perda progressiva da função excretora do órgão. Em outras palavras, na medida em que os vasos renais são lesados, ocorrem alterações na capacidade de excretar o excedente de volume que deveria ser eliminado, bem como de algumas substâncias (produtos do metabolismo). Então, se os rins deixam de eliminar o volume excedente, este por sua vez, pode aumentar ainda mais a pressão arterial.
É importante frisar que o comprometimento renal causado pela hipertensão arterial ocorre de maneira lenta e insidiosa, portanto, não se acompanha de sintomas ou sinais indicativos de que algum problema renal está em curso. Este é sem dúvida o principal problema da hipertensão.
Além disso, algumas populações de pacientes estão sob maior risco de evoluir para a doença renal crônica, e entre eles, além da hipertensão em si, estão os idosos, os obesos (IMC > 30 kg/m2) e diabéticos (tipo 1 e tipo 2).
Assim, a falta de controle da pressão arterial, do diabetes, dos níveis de colesterol e o tabagismo contribuem não apenas para a piora da saúde dos rins, mas também para uma evolução pior da doença renal crônica.
De que forma então poderíamos rastrear a função renal para saber se está ou não ocorrendo algum problema? Os exames iniciais utilizados para rastreamento da função renal são a dosagem da creatinina e o exame de urina tipo 1.
A creatinina é um produto da degradação das células musculares, produzida em uma taxa praticamente constante. Quando os rins estão funcionando normalmente, a creatinina é retirada do sangue e eliminada pela urina, no entanto, quando a função renal está diminuída, a creatinina não é excretada de forma adequada e seus níveis aumentam no sangue, indicando que há algum problema na função dos rins.
Uma maneira de estimar a função renal é através do cálculo da taxa de filtração glomerular estimada (TFGe). Esta estimativa é feita a partir de fórmulas propostas pelas diretrizes internacionais em nefrologia. Assim, é considerado portador de doença renal crônica a pessoa que, independente da causa, apresente por pelo menos três meses consecutivos uma TFGe < 60ml/min/1,73m².
Outra forma de avaliar é pelo exame de urina tipo 1. Minimamente o exame nos dará indícios da perda de proteína (albumina) que também é um indicativo de alteração da função renal, pois normalmente não há perda de proteína (albumina) pela urina. Caso o exame mostre uma perda mais importante, podemos lançar mão de outros exames para investigar melhor a quantidade de proteína (albumina) perdida nas 24 horas e também avaliar os rins por meio de exames de imagem como a ultrassonografia.
Em resumo, a hipertensão arterial pode lesar os rins, e consequentemente comprometer a saúde renal sem que tenhamos consciência desta situação, e desta forma, é importante a determinação da creatinina e a realização de um exame de urina em todos os hipertensos, pelo menos uma vez ao ano, para que se possa detectar e/ou acompanhar a evolução desta doença que, como dito muitas vezes, é silenciosa.
Para prevenir a evolução da doença renal é fundamental o controle da pressão arterial. Assim, para hipertensos e/ou diabéticos sem indícios de doença renal a meta preconizada é abaixo de 140/90 mmHg e para pacientes diabéticos com albuminúria é abaixo ou igual a 130/80 mmHg.
Além disso, a adoção de medidas para modificação do estilo de vida como, evitar o sobrepeso ou obesidade, reduzir a quantidade de sal na dieta, ingerindo menos de 2g de sódio/dia (5 g/dia de sal de cozinha), abandonar o tabagismo, evitar alimentos gordurosos e ter atividade física regular, praticando 30 minutos/dia (150 min/semana) são medidas extremamente importantes.
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Como se pode ver, a saúde renal associada à hipertensão requer medidas simples de rastreamento, modificações no estilo de vida e tratamento contínuo da hipertensão para se atingir e manter o controle pressórico adequado. Não espere o aparecimento de sintomas ou sinais que possam sugerir esta alteração, pois nesta circunstância, possivelmente o dano renal já se instalou e a próxima medida será evitar que ele progrida. Ao nascermos temos um número já determinado de estruturas funcionais nos rins, que uma vez perdida não será recuperada.
Referências
Diretrizes Clínicas para o Cuidado ao Paciente com Doença Renal Crônica- DRC no Sistema Único de Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Especializada e Temática. ? Brasília: Ministério da Saúde, 2014. p.: 37 p