Graduado em medicina pela Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG), com residência médica em Genética Médica pelo Hos...
iHoje em dia esta é a pergunta mais comum ouvida por profissionais da Genética: devo fazer um mapeamento genético? E a resposta invariavelmente começa com um "depende". Depende de sua história familiar, dos seus hábitos de vida e da sua capacidade para ouvir e lidar com resultados indesejados.
Vou estender a resposta, ilustrando-a com quadros clínicos. Um casal já havia perdido um filho para a fibrose cística. Ambos têm a mutação genética e os 25% de chance foram fatais para o bebê, que sobreviveu apenas seis meses, depois de enfrentar seríssimos problemas de saúde. Eles só souberam que eram portadores dos genes da doença após a morte do bebê, quando se submeteram a um mapeamento genético.
A doença é incurável e ter a mutação genética não significa ter a doença, pois ela é recessiva - não se manifesta, mas pode ser transmitida aos descendentes. Antes de engravidar novamente, o casal iniciou o processo com uma consulta de aconselhamento genético. A ideia era conceber um bebê livre da fibrose cística, um desejo absolutamente natural. A recomendação foi fazer uma FIV, fertilização in vitro, para que os embriões gerados pudessem ser mapeados geneticamente com o objetivo de detectar a alteração genética responsável pela doença. Os embriões livres da mutação foram implantados e nasceu uma linda garota, hoje com 3 anos de idade, perfeitamente saudável.
Outro caso clínico que tem inúmeras similaridades é o de uma jovem de 28 anos que cresceu atormentada com a possibilidade de desenvolver o mesmo câncer de cólon que vitimou seu pai e dois tios. Há cerca de dois anos, ela resolveu submeter-se a um mapeamento genético e, sim, ela tem a modificação genética, herança da família, que poderá desenvolver-se no mesmo câncer que matou seu pai e tios. O resultado positivo não foi novidade para ela, mas trouxe alívio. Costumo dizer que, em se tratando de diagnóstico genético, o sim e o não tem o mesmo peso. Nesse caso, a identificação da mutação do gene vai alterar alguns hábitos de vida, pois a ela restam as medidas preventivas e o controle médico periódico.
Estes dois casos ilustram como o mapeamento genético pode ser utilizado e por quem. Se um membro da sua família tem ou teve a doença genética, você é um sério candidato a fazer o mapeamento genético. Mesmo que tenha sido o seu avô, ou sua bisavó, ou ainda o tio-avô. Muitas vezes a doença se manifesta esporadicamente na família por meio de uma deficiência auditiva, de visão ou mesmo uma malformação de órgãos, em diferentes gerações. Nestes casos é importante fazer o mapeamento genético, seja para implementar as medidas preventivas (para que a doença permaneça em estado de latência), seja para impedir que sua prole seja afetada por aquela alteração genética. De qualquer forma, a importância da sessão de aconselhamento genético é enorme. É nessa consulta que todas as probabilidades serão avaliadas e os adequados testes serão recomendados. É onde tudo começa.
O mapeamento genético é um poderoso meio de diagnóstico que rapidamente vem ocupando um importante espaço na medicina. A cada ano, centenas de genes associados a doenças específicas são descobertos e podem ser mapeados: do diabetes à doença de Alzheimer, passando por diversos tipos de câncer e doenças hereditárias. As modernas tecnologias de mapeamento genético conseguem detectar, com precisão muito próxima do absoluto (99,9999%) se a pessoa tem a predisposição para adquirir a doença ou se é portadora assintomática - e sem risco de desenvolver a doença -, mas com potencial de transmissão à sua descendência. Estas são indicações precisas e muito úteis do mapeamento genético, que muito em breve estará acessível a todos que dele precisarem, graças a tecnologias que permitem ler centenas de genes, identificando centenas de doenças, a custos cada vez menores.
As estatísticas mostram que a necessidade de mapeamento genético é maior do que se imagina. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) cerca de 5% das gestações resultam no nascimento de uma criança com algum tipo de anomalia congênita, ou doença genética. Só as estatísticas da fibrose cística são suficientes para dar uma amostra do problema: 1798 registros da doença em 2010, no Brasil.
Necessidades hereditárias à parte, a rigor, qualquer indivíduo pode solicitar um mapeamento genético. A questão é o que fazer com o resultado. Antes de tudo é preciso saber se você e a sua família querem realmente obter a informação, que pode ser um resultado positivo para determinada doença. Alguns pacientes estão definitivamente preparados para receber o "sim", e para compreender que a sua atitude em relação às medidas preventivas da doença, e consequente mudança de estilo de vida, fará a diferença entre ser feliz ou viver angustiados pelo medo.