Formada em psicologia pelo Centro Universitário Paulistano e em psicanálise pelo Centro de Estudos em Psicanálise.Especi...
iO jogo do Brasil x Chile, dia 26, se tornou um assunto muito falado, nestes últimos dias, devido à dificuldade do Brasil em vencer esta partida. Foi um momento que com certeza envolveu a todos, seleção brasileira e torcida, em uma aflição conjunta no medo e desejo pela vitória. A aflição e angústia em um momento de pressão na vida, tanto pessoal, quanto profissional, como este vivido no último jogo, é uma reação comum e humana, e atualmente até mesmo pode ser vista com bons olhos, no meio organizacional (empresas, líderes e funcionários), pois mostra o quanto estamos mais humanizados aos momentos, aos desejos e sentimentos abrindo mão daquela ideia antiga de uma relação que muitas vezes sugeria frieza e falta de afeto ao momento ou com uma equipe.
Mas é preciso salientar que antes de tudo uma angústia ou aflição intensa tende a ser geradora de conflitos e falhas, além de dificultar o alcance do objetivo desejado. Existem casos e profissões em que uma pessoa não pode apresentar instabilidade emocional frente a um momento de pressão, como um médico cirurgião ou um analista financeiro de bolsa de valores. Cargos como estes correm risco de falência e vida, caso a pessoa não possua controle sobre suas angústias. É preciso certa frieza e calculismo para poder ter sucesso.
Vejam bem não estou falando em não sentir receio, aflição ou preocupação, nestes casos ou outros. Ao contrário, me refiro a sentir e perceber que possuir tais reações torna aquela pessoa mais humana e com maiores chances de poder observar pontos e situações que oferecem riscos ou poderiam surpreender negativamente. Isto é sentir medo, e pode ser benéfico ao ser humano, tanto para si mesmo, como para sua atuação no meio. O medo humano é uma reação de preservação da espécie, é algo que sentimos e reagimos quando nossa mente percebe certa instabilidade ou falta de controle em si ou no meio, ou mesmo nos lembra que não devemos, mas podemos, falhar.
Assumir o próprio medo é saudável e permite que possamos usá-lo a nosso favor. Por exemplo: para atravessar a rua paramos na calçada e olhamos para os dois lados, pois em nossa mente sabemos que corremos risco de ser atropelados, mesmo quando o sinal está a nosso favor. O que nos faz ter esta atitude é o medo de ser atropelado, é a desconfiança com o carro que pode surgir e até a desconfiança em nós mesmo, em nossa agilidade e habilidade. Mas este receio está ao nosso favor, pois olhando para ambos os lados nos prevenimos e podemos chegar a salvos do outro lado da rua. Ou seja: sentimos o medo, percebemos esta angústia, pensamos em uma solução protetora e seguimos adiante. A autopercepção é o primeiro caminho para que possamos ter autocontrole e este não significa ausência de angústias ou aflições na vida.
O que pode preocupar e merece atenção, é quando mesmo olhando para os lados ou para o sinal que está ao nosso favor, nós travamos, nos sentimos inseguros, com excesso de aflição e este sentimento se torna um impedimento de conquistar o objetivo desejado ou necessário. O medo não entendido ou não compreendido pode gerar uma reação emocional dentro da linha ansiosa e desencadear impedimentos e confusões em nosso dia a dia, atrapalhando nosso desempenho não só profissional, mas inclusive pessoal.
Nem sempre podemos estar preparados para lidar com a pressão ou angústia, como no ato de atravessar uma rua que se torna até rotineiro. Muitas vezes a vida nos surpreende e com certeza estas são as angústias mais intensas, ao menos no princípio. Talvez este tenha sido o grande motivo da agonia estampada na seleção no jogo com o Chile. É provável que a seleção, que carrega a responsabilidade de "heroísmo", tenha sido forçada a encarar uma realidade não tão agradável. A que são apenas humanos, possuem falhas, não são tão melhores que os outros e sim poderiam perder. Não pensar nestas possibilidades e jogar estes medos no fundo do baú emocional pode nos surpreender em momentos tensos na vida e nos colocar em riscos, por não estarmos aptos para lidar com a situação. Talvez, por isso, eles tenham entrado em certo estado de choque, por terem sido dominados por tamanha certeza de vitória e poder e quando a realidade se impôs, causou um desajuste emocional.
Assim, repito que entrar em contato com nossas fragilidades, pontos fracos, angústia do momento, nos dá a possibilidade de fortalecermos nosso eu e descobrirmos forças internas que nos ajudam a passar por isso da melhor forma possível e, ao longo da vida, vamos nos preparando continua e interminavelmente. Não há como dizer se a seleção esta mais forte para o jogo seguinte. A atitude deles nos demonstrou despreparo para com estas situações. Mas com certeza, tiveram uma riquíssima experiência para aprendizado e se souberem assumir e analisar suas reações do dia, eles têm boas chances de lidarem melhor numa próxima vez. Se cada um deles estiver aberto para suas fraquezas e limites numa próxima partida, isso pode ajudá-los a encarar melhor os próximos jogos e ate superarem suas expectativas. Mas se em vez disso continuarem negando seus pontos a melhorar, provável que veremos nova cena de angustia.
As emoções do líder
Neste último jogo o ponto que chamou a atenção e até foi muito comentado, foi a atitude do capitão do time, Thiago Silva, que demonstrou intenso receio, abalo e sugeriu instabilidade emocional durante este momento delicado de sua equipe. Pedindo inclusive para não participar de nenhuma cobrança dos pênaltis. Assumir seu medo e por isso não participar dos pênaltis é até uma reação positiva, nem sempre na vida estamos prontos e fingir que está tudo bem pode prejudicar seriamente sua vida e a dos envolvidos.
Mas o ponto em destaque aqui ficou para sua angústia intensa e a demonstração de falta de controle. Sua reação sugeriu ter estado além do que chamamos de saudável. Sua recusa em participar das cobranças e ficar ajoelhado de cabeça abaixada no campo, nos demonstrou o tamanho do medo que sentia naquele momento. E esta sua postura transmitia a ideia de falta de confiança em si e no meio, talvez até mesmo na equipe. É nestas situações que podem surgir crises ansiosas e pânicos que nos impedem de concluir etapas na vida. Olhando unicamente como ser humano, repito a compreensão de sua aflição.
Porém, sua reação abalada além do limite mereceu atenção, por se tratar do capitão da equipe brasileira, isto é, sua presença, postura e atitudes deveriam ser orientadoras para com os demais da equipe. Logo, sua instabilidade emocional com certeza reforçou a angústia, o medo e até mesmo o pensamento de desistência dos demais membros da equipe. Pudemos notar, que a seleção brasileira, como um todo, demonstrou imensa angústia reativa à pressão do momento e também fragilidade para suportar estas situações.
Não podemos responsabilizar o capitão do time como causador deste abalo no grupo, isso não! Até mesmo, porque ao mesmo tempo em que ele se desesperava, outros da equipe surgiam, inclusive do banco de reserva com atitudes e palavras motivadoras, alguns perceberam a necessidade de dar apoio, reforço positivo e ânimo para os demais que seriam desafiados nesta intensa pressão dos pênaltis. Mas com certeza o excesso de medo de Thiago Silva deve ter sido reforçador de mais angústias nos jogadores de sua equipe, que, naquele momento, precisavam de força, encorajamento, acesso positivo em suas memórias para enfrentar seus medos.
O técnico Felipão pareceu controlado e buscou mostrar sua credibilidade na equipe, em especial com o goleiro, Júlio César, em que com certeza estaria a maior parte da pressão. Arrisco aqui, com a certeza, que o Felipão devia igualmente estar abalado e apavorado (internamente) com a probabilidade de a seleção brasileira ser eliminada naquele momento. Afinal seria o fim de seu trabalho, empenho e desejos profissionais desta Copa. Sem contar que como técnico e líder da seleção, ele carrega consigo, não só suas expectativas, mas também de todos os jogadores e torcida brasileira. Imaginar sua angústia e desespero interno não o torna instável ou inseguro, ao contrário, nos faz apenas considerá-lo humano e este conceito de chefia já é muito bem visto e até desejado atualmente no mundo empresarial. Parece que aquela ideia que gestores deveriam ser salvadores, frios e não demonstrar medos não cabe mais a realidade do mundo atual.
Porém humanizar este momento de agonia não elimina o quanto é fundamental que o líder esteja controlado em suas aflições e demonstre estar junto com sua equipe, sendo referência de apoio ou mesmo de parceria estando lado a lado, torcendo e motivando neste obstáculo a frente, ajudando sua equipe a encontrar forças de ir adiante.
Este raciocínio de autocontrole nos momentos de aflição na vida serve de análise para todos nós na vida, não somente profissional, onde temos metas, valores, prazos, mas principalmente na vida pessoal, onde também lidamos continuamente com expectativas, pressões e angústias do dia a dia, na família, casamento, namoro, com os filhos ou amigos.
Sentir e assumir que possuímos angústias e medos, nos faz humanos, ou seja, está tudo dentro do esperado. E esta percepção nos dá a chance de enfrentarmos, de forma controlada e consciente, nossas aflições, podendo sim aumentar as chances de sucesso pessoal. Este movimento é uma demonstração de uma estrutura emocional saudável e equilibrada.