Clínico geral e nutrólogo, diretor da clínica Dr. Roberto Navarro. Formado em Medicina pela Universidade Federal de Juiz...
iAcaba de ser produzido um texto pelo Departamento de Nutrição da Escola de Saúde Pública da Universidade de Harvard (EUA), representado pelo pesquisador e renomado médico nutrólogo Dr. Walter Willet, sugerindo ao Departamento de Agricultura Americano (USDA) diretrizes que deveriam ser oficialmente incorporadas e publicadas à fim de servirem como referência de quais condutas alimentares deveriam ser seguidas pela população americana tendo como objetivo a diminuição dos riscos de doenças causadas pelo desequilíbrio nutricional, como obesidade, doenças cardiovasculares, diabetes e câncer. Entenda-se como desequilíbrio nutricional o excesso ou a falta dentro do organismo de macronutrientes (carboidratos, proteínas e gorduras) e micronutrientes ( minerais e vitaminas), além do excesso de aditivos químicos alimentares, como adoçantes artificiais e agrotóxicos. Embora ainda não aprovado pelo USDA, o que deverá acontecer em breve, este documento ajudará e muito a organizar um pouco a quantidade de informações do que realmente faz bem ou faz mal à saúde, já que a enxurrada de opiniões sobre este tema diverge até entre profissionais da saúde e o pior ainda, muitas vezes se torna fato consumado (que até parece verdade científica ) profanado por entendidos ( na verdade leigos, sem formação na área nutricional ) em seus blogs, facebooks, instagram, etc.
Vamos aos fatos conclusivos deste documento, que na minha humilde opinião, apenas concluem o que já parecia óbvio:
Muitas pessoas se preocupam em escolher alimentos considerados mais saudáveis mas acabam elegendo apenas alguns deles e passam a escolhê-los viciosamente todos os dias, que embora saudáveis, podem não conseguir suprir todos os nutrientes importantes para o organismo, pelo número pequeno de variedades. Aqui uma dica pessoal: existe um conceito importante chamado de "variabilidade alimentar", ou seja, devemos ingerir pelo menos uma variabilidade de 30 alimentos diferentes, incluindo todos os grupos alimentares, não precisando ser todos ingeridos no mesmo dia, mas que façam parte do seu hábito alimentar. Esta variabilidade garante o aporte de todos os nutrientes importantes para sua saúde e não apenas meia dúzia deles, ou seja, foco no "todo" e não só em "alguns" alimentos, mesmo que sejam "funcionais".
Uma dieta com predominância de alimentos vegetais é mais recomendada, incluindo legumes, verduras, frutas, oleaginosas e cereais integrais, já que os estudos vêm mostrando uma diminuição do risco de doenças cardiovasculares, diabetes e alguns tipos de câncer com a variedade destes alimentos na dieta, não significando por isso que você deva virar um vegetariano, mas apenas diminuindo o consumo excessivo de carne vermelha, carnes processadas (salsichas, salames, mortadelas, presuntos, etc) e laticínios, que inclusive já foram apontados por alguns estudos como elevadores do risco de doenças cardíacas e câncer intestinal, quando exageramos nestes alimentos.
Alguns consensos sugerem o limite de no máximo 300 gramas de carne vermelha por semana e leite e derivados sempre que possível desnatados, pois têm taxa menor de gordura saturada. Aliás, a gordura saturada presente em todas as carnes, inclusive as processadas e embutidas, banha de porco, leite e derivados, óleo de dendê e óleo de coco, continua sendo acusada de aumentar as chances de doenças cardíacas, quando ingeridas em excesso, pois facilitam a formação de placas de gorduras nas artérias (aterosclerose ). Por este motivo o total de gordura saturada da dieta não deve ultrapassar 10% do total calórico, diminuindo para 5 a 7% quem já tem dislipidemia (alteração da taxa de colesterol e/ou triglicérides no sangue ) uma doença cardíaca já instalada.
Esta recomendação não exclui a gordura saturada do prato, mas apenas limita seu consumo, o que nos permite vez ou outra um "tapinha" na manteiga, na picanha, e até mesmo usar uma pequena quantidade de óleo de coco ou banha de porco para refogar um alimento, desde que se respeite o limite de até 7 a 10% permitido do dia. Só para exemplificar uma conta prática usarei a referência oficial de um valor calórico considerado padrão para a maioria das pessoas ( que não estão fazendo dieta para emagrecer), inclusive impresso em todos os rótulos dos alimentos que é 2.000 Kcal/dia. Se posso comer no máximo 10% do total calórico na forma de gordura saturada, tenho então 200 calorias para desfrutar ao longo do dia. Veja então o total calórico destes exemplos:
Veja então como é fácil extrapolar na gordura saturada, isto porque considerei 10% do total de uma dieta de 2.000 cal permitidas, mas quem já tem problemas cardiovasculares deve diminuir para 5 a 7% e quem está fazendo uma dieta para perda de peso geralmente limita em média até 1.200 calorias por dia, o que permitiria apenas 120 calorias por dia na forma de gordura saturada, e não as 200 do exemplo acima. Por isso que a maioria dos estudos mostra que a substituição parcial da gordura saturada pela gordura poli-insaturada ( principalmente a família ômega 3 ) como a presente nos peixes (salmão, atum, sardinha, arenque, cavala), nos óleos vegetais (linhaça, canola, azeite de oliva, etc), nas sementes e oleaginosas ( castanhas, nozes, amêndoas, avelãs, linhaça, chia, etc) leva à uma diminuição do risco de doenças cardíacas, já que a gordura ômega 3 tem efeito anti-inflamatório e protege nossos vasos sanguíneos do efeito pró-inflamatório do ácido aracdônico presente na gordura saturada.
Sabe-se que o primeiro degrau do adoecimento de um vaso sanguíneo é a lesão endotelial, traduzindo mais claramente como uma inflamação da parede interna das artérias, incluindo as do coração e as do cérebro. Após esta lesão inicial é que passa a ser formada nesta região afetada as placas de gordura (formadas pelo colesterol ruim- LDL ) que com o aumento de tamanho culmina no infarto agudo do coração ou no derrame cerebral.
A boa notícia é que os estudos atuais parecem inocentar o colesterol que ingerimos pelo alimento, presente na gordura animal, como o principal culpado da elevação do colesterol no sangue, mas sim o colesterol que é produzido pelo nosso próprio corpo, no nosso fígado, que eleva seus níveis sanguíneos, contribuindo para a aterosclerose. Talvez a limitação de no máximo 300 mg de colesterol por dia, ingeridos via alimentação (200 mg para quem já está tratando de colesterol alto), venha a cair por terra. Mas lembre-se: a gordura saturada que ingerimos, que é fonte de colesterol, também é fonte de ácido aracdônico, ou seja, continua sendo pró-inflamatória e devemos continuar a limitar seu consumo em até 10% do total calórico do dia, conforme citado antes.
Substituir carboidratos com alta carga glicêmica como açúcares e doces, farinhas refinadas, refrigerantes e bebidas alcoólicas por porções de alimentos fontes de gordura poli-insaturada como castanha, nozes, sementes de linhaça, de gergelim, de girassol, de chia e peixes ricos em ômega 3, pode trazer grandes benefícios, pois a gordura tem um efeito "sacietógeno" maior (mantem você sem fome por mais tempo) em relação aos carboidratos citados acima, que além disto também podem desencadear mais compulsão alimentar. Vale então trocar um biscoito recheado por uma castanha e adicionar as sementes (linhaça ou gergelim ou chia ou girassol) na sua salada, obviamente sem exagerar nos volumes pois também toda fonte de gordura é rica em calorias, o que pode levar ao ganho de peso.
O limite de sódio mais adequado na alimentação é de 2.300 mg por dia, já que seu excesso está ligado ao aumento da pressão arterial ( como consequência doenças cardiovasculares) e formação de cálculos renais. Na forma de "sal de cozinha" (cloreto de sódio) seu limite é de 1 colher de chá ao dia, o que é facilmente extrapolado se não tomarmos cuidado. Uma dica é tirar o saleiro da mesa (o que já é feito nos restaurantes de muitos países da Europa ) e ler o rótulo dos alimentos: se para cada grama do alimento houver 4 mg de sódio ou mais, este alimento é exagerado no sódio. Para ficar mais fácil é só ver o total de gramas do alimento por porção (vem descrito no rótulo) e dividir pelo total de sódio por porção, e ver se está dentro do limite citado acima. Quanto se tem de sódio por porção do alimento também vem descrito no rótulo. Não é só o sal de cozinha o vilão do sódio na dieta, mas alimentos processados e embutidos (salame, mortadela, etc), sopas prontas em pó para preparo, cubinhos como caldos de carne ou frango usados como tempero, alimentos em conserva, molhos prontos e os de soja, são bons exemplos aonde o sódio vem escondido.
O açúcar simples deverá ter seu limite em até 10% do total calórico do dia, embora a Organização Mundial da Saúde ( OMS ) já diminuiu esta referência para 5%, já que o açúcar e seus derivados (doces, etc) acima deste limite está ligado ao maior desenvolvimento da obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares e cáries dentárias. Também cuidado para o açúcar escondido nos alimentos, como a dextrose, maltose e frutose utilizados pela indústria alimentícia no preparo de sucos artificiais, molhos prontos para salada, cereais matinais e até em alimentos processados e embutidos.
Tomar um pouco de água substituindo refrigerantes e sucos artificiais seria mais saudável para o organismo, segundo este documento. O uso de adoçantes artificiais também deve ser limitado na sua quantidade, pois os estudos que garantem ausência de riscos do seu consumo foram feitos em pequenas populações e por um tempo curto de uso, não havendo estudos que garantam sua segurança no consumo de longo prazo. Como limite no máximo 10 gotas ao dia ou até 6 sachês (em pó) ou 1 lata de refrigerante diet ao dia, mesmo assim só para quem é diabético ou está com excesso de peso e precisa fazer uma dieta hipocalórica para emagrecer e precisa cortar o açúcar. Não estando nestas condições o uso de adoçantes artificiais deveria ser contraindicado.
Espero ter conseguido passar para os leitores a essências destas diretrizes atuais e continuo usando a expressão que a melhor dieta ainda é a do bom senso. Cuide-se!