Formada pela Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, com residência em Clínica Médica e em Endocrinologia e Metabolo...
iO iodo é um componente essencial para formação dos hormônios tiroidianos e a sua ingestão mínima diária deve ser atingida para o bom funcionamento da glândula tiróide. Para se ter uma idéia, a quantidade mínima para recém-nascidos e pré-escolares é de 90 g/dia, crianças devem consumir 120 g/dia, adolescentes 150 g/dia, adultos 150/200 g/dia e gestantes e lactantes 200/300 g/dia.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estimava em 1990 que, aproximadamente, um quarto da população mundial (1,572 bilhões de pessoas) apresentava riscos para doenças causadas pela deficiência de iodo. Destes, 655 milhões eram afetados por bócio, 11,2 milhões por cretinismo e 43 milhões com algum grau de rebaixamento mental. Estas complicações e morbidades dificultam o desenvolvimento social, econômico e mental da população, que se encontra em risco, incapacitando-a ao convívio social, aprendizado e trabalho. As doenças decorrentes da carência de iodo (IDD) representam um problema de saúde pública e sua prevenção e profilaxia são mais fáceis e exeqüíveis comparativamente ao enorme custo de
diagnosticar e tratar suas conseqüências. Entre elas, podemos considerar para os fetos, por exemplo, abortamento, prematuridade, anormalidades congênitas, mortalidade perinatal, alterações neurológicas, retardo mental e surdez congênita. Já para os recém-nascidos, bócio congênito é o principal problema, enquanto que para os pré-escolares é o hipotiroidismo neonatal, para os adolescentes as consequências podem atingir retardo pondo-estatural e bócio difuso e para os adultos bócio, hipotiroidismo, rebaixamento mental e surdez.
A adição de iodo ao sal tem sido a principal estratégia para alcançar a suficiência de iodo. O custo estimado do programa populacional de iodação do sal é de 2 a 8 centavos de dólar americano por pessoa por ano. Esse programa levou à dramática redução do impacto da deficiência desse halogênio nas populações de risco, com diminuição da prevalência do bócio, normalização da função tiroidiana, prevenção do cretinismo, melhorando, portanto, a sobrevida, o desenvolvimento e a escolaridade da população infantil.
Em 1953, a iodação do sal para o consumo humano tornou-se obrigatória no Brasil, para áreas de bócio endêmico. Após o primeiro inquérito nacional, em 1955, mostrando 24,6% de bócio em escolares, a iodação estendeu-se para todo o território nacional. Em 1975, estimava-se 14,7% de bócio endêmico em nossa população e foram estabelecidos padrões de qualidade e de identificação para sal de consumo humano, estando fixo o valor de 10mg de iodo por quilograma de sal. Em 1994, por portaria ministerial, o teor de iodo no sal para o consumo humano é aumentado para 40-60 mg/Kg. O terceiro inquérito nacional, de 1995, mostrou menos de 5% da população infantil com bócio, restrito na parte oeste do país. Nos estados do Maranhão, Tocantins, Mato Grosso do Sul, Amazonas e Acre constatou-se aumento do volume tiroidiano na população estudada. A partir deste inquérito, o Ministério da Saúde estabelece a correta proporção de iodo no sal consumido no Brasil e autoriza o fornecimento de iodato às indústrias beneficiadoras de sal. Em 2003, por resolução da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), há redução do nível de concentração de iodo no sal de consumo humano para 20 a 60 mg de iodo por quilograma de sal, devido à prevalência de 1,8% de bócio em escolares e uma excreção urinária de iodo com valores acima do preconizado pela OMS. Portanto, a excreção de iodo urinária refletiu uma ingestão nutricional excessiva de iodo.
O excesso de iodo consumido pela população pode levar a conseqüências como: hipertireoidismo, tiroidite auto-imune, hipotiroidismo e bócio. Em 1982, surgiu um grupo de trabalho interessado em implantar e supervisionar um programa de combate ao bócio endêmico. Neste programa o Ministério da Saúde deveria, obrigatoriamente, adquirir o iodo no exterior, providenciar sua transformação em iodato de potássio, distribuí-lo as salineiras, exigir controle rigoroso das concentrações mínimas de iodo no sal e fiscalizar o sal consumido pela população, através de dosagens periódicas do teor de iodo nos laboratórios regionais. Implantou-se, concomitantemente, acompanhamento das áreas de maior risco para endemia.
Desde 1995, o Brasil não se apresenta como país endêmico para bócio. Notou-se menos de 5% de bócio em escolares e provável melhoria da função tiroidiana. São resultados da profilaxia no programa efetivo de iodação do sal, e, possivelmente, até expostos a uma ingestão excessiva de iodo, pela maior excreção de iodo urinário descrita em nossa população, em estudos recentes.
Um novo inquérito nacional será necessário, na expectativa de delimitar as áreas insuficientes, suficientes ou mais que suficientes de iodo, utilizando a iodúria e o volume tiroidiano da população de escolares como indicadores para monitorização da nutrição de iodo. E, a partir destes dados, incrementar medidas adequadas para o controle. Em casos de
bolsões endêmicos e doenças correlatas,
a implementação efetiva do programa do sal iodado e, em casos de excesso de iodo, incentivar campanhas para diminuição do consumo de sal, garantindo que a população receberá doses adequadas de iodo. O seguimento e a avaliação do bom funcionamento da tiróide, seguramente, reverterá as co-morbidades, melhorando o nível de vida em perspectivas futuras.
Dra. Glaucia Duarte é médica endocrinologista (CRM/SP 91952), doutorada em Endocrinologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), da Sociedade Latino Americana de Tireóide e do ICCIDD (International Council for the Control of Iodine Deficiency).
Para saber mais, acesse: http://draglauciaduarte.wordpress.com