Formada em psicologia pelo Centro Universitário Paulistano e em psicanálise pelo Centro de Estudos em Psicanálise.Especi...
iNão podemos negar que a mulher vem batalhando e conquistando cada vez mais espaço na sociedade. Tudo isso acontece a um custo alto, de muita dedicação, esforço, briga e adaptação. No meio profissional estamos cada vez mais em destaque e a cada momento descobrimos e mostramos o quanto somos capazes de estar presente, produzir e participar igualmente do meio, pois o gênero não é e nunca foi uma questão para limitação, além do fato do imenso tabu e histórico/cultural que ditava e ainda dita esse equívoco.
Com esse espaço alcançado as mulheres ganharam muitas possibilidades, mas em conjunto carregaram consigo as tantas responsabilidades que já arcavam antes destas conquistas. Falo aqui das rotinas caseiras, familiares e sociais do tal "papel da mulher" na sociedade.
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É fato que as tarefas do lar, filhos e família ainda são obrigações do feminino. As compras de mercado, limpeza e ordem da casa, refeições e rotina dos filhos com escola, saúde, vestimentas e até os eventos da família ficam sob responsabilidade da mulher, na maioria dos casos.
As mulheres hoje trabalham não somente por liberdade e opção, mas em muitas casas significam grande ou até maior parte da renda que sustenta a família. Sendo assim, o trabalho e conquista profissional da mulher atualmente é uma necessidade de sobrevivência de muitas famílias. Porém, apesar da mulher representar a divisão ou arcar com boa parte dos custos de vida da família, o mesmo não ocorreu com as tarefas ainda ditas como femininas. Os homens ainda se permitem a não assumir essas tarefas e mesmo as mulheres muitas vezes têm dúvidas se eles devem realmente realizar tais tarefas como lavar louça, roupa, varrer casa, cuidar do banho e lição dos filhos.
O mais comum, quando os homens participam destas tais atividades domésticas e familiares é que isso aconteça por opção de prazer, exemplo cozinhar ou levar filhos para certas atividades. E, nesses momentos, os pais/os homens ganham destaque de alto reconhecimento social como destaque e merecimento de parabenizações. Geralmente, quando um homem participa das atividades domésticas, como lavar uma louça ou ir ao mercado, olhar as crianças, isso se dá por pedido da mulher e assim fica entendido que é uma ajuda e a responsabilidade continua com a mulher.
A carga mental da mulher
Assim, sem muito aprofundar ou buscar porquês, entendemos facilmente que a mulher atualmente carrega uma carga mental e física imensa e significativa, visto que está sempre envolvida por muita responsabilidade, tanto da realidade de vida como trabalho e vida pessoal, mas também e principalmente na fantasia histórico cultural. E é essa em especial que acaba sendo a grande responsável pela estafa, pelo cansaço, estresse e adoecimento da mulher.
A sobrecarga no feminino se dá pelo excesso de atividades que a mulher deve coordenar em sua rotina, desde o acordar até o dormir, envolvendo a responsabilidade de satisfação, saúde e bem estar de outros (filhos, marido, chefe). É muito comum, por exemplo, que seja a mulher a primeira a levantar da cama e a última ir dormir em uma casa, pois a noite tem que cuidar da roupa, dos estudos dos filhos, da refeição para o dia seguinte... Mas apesar desse cansaço físico, a principal causa identificada como responsável de síndromes de estafa, estresse e depressão da mulher é resultado da pressão que os conceitos e tabus em torno do feminino causam desde sempre e há muito tempo na história.
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O papel da educação
Meninas crescem sendo estimuladas a brincar de casinha, cuidar de filhos, marido e realizar tarefas domésticas. Desde cedo, aprendem que devem ajudar na casa e que isso dita seu valor. Uma boa e linda menina, educada, caprichosa na casa, que ajuda e cuida e que um dia servirá para boa esposa e mãe. Enquanto isso, os meninos crescem jogando bola, brincando de ser heróis e podendo não saber fazer, cuidar e realizar tarefas da casa. Essa diferença na educação merece muita atenção e explica muito do conflito na vida adulta de porque os homens não se sentem responsáveis pelas tarefas da casa e família e a mulher ao contrário entende que é a responsável pela casa, pelos filhos e pelo conforto e felicidade do marido.
Ser mulher está associado automaticamente a cuidar e servir ao outro desde sempre. Desde que se é uma pequena menina brincando, é entendido que seu valor enquanto pessoa, será reconhecido neste lugar pela sociedade. Os equivocados elogios recebidos associando sua qualidade a suas habilidades de cuidar da casa e família confundem o existir e autopercepção da mulher e seu feminino.
Por isso, é muito comum uma mulher cobrar seu marido, mas ao mesmo tempo boicotar ou não deixar o parceiro fazer as tarefas ao ficar criticando e corrigindo. Ela acaba sendo convencida por si mesma que a mulher faz muito melhor e, então, seria melhor não repassar responsabilidades. Ao mesmo tempo, muitos homens se apoiam nesta mesma ideia para justificar suas ausências nestas tarefas, transformar essa situação em elogios e assim, tanto ele, quanto a mulher, se convencem e reforçam esse tabu, que diz ter certas coisas que só uma mulher sabe fazer ou fazer melhor. Esse conceito é equivocado, arcaico e responsabiliza a mulher por mais atividades, por certas atividades e se apresenta disfarçado de elogio ou de qualidade do feminino.
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Cuidar do outro x autossatisfação
Assim a mulher vem, há muitas gerações, perdida nela mesma. A mulher se constrói e se estrutura através de suas habilidades em servir e cuidar do outro e não em ser ela mesma e se autossatisfazer. O mesmo acontece com sua aparência e estética. A mulher se forma através dos olhares que ditam quais regras de beleza e corpo dela deve ter para agradar e receber elogios e por isso é tão comum as mulheres serem tão insatisfeitas com seu corpo, aparência e ideia de beleza. No consultório é muito comum, atualmente, se deparar com mulheres insatisfeitas com elas mesmas, com suas vidas, apresentando até sintomas depressivos e ansiosos e que sofrem muito por não saberem do que gostam, o que fazer por prazer e por autossatisfação. Isso acontece porque não sabem mais quem são.
Como acabar com a carga mental das mulheres
Podemos assim entender que a carga mental e a vida da mulher vem sendo sobrecarregada há tempos e a solução para isso deverá levar tempo também. Apesar de algumas mudanças imediatas serem importantes e devem sim ocorrer para as mulheres, como dividir tarefas da casa e família com seu parceiro, tirar tempo para descansar, se divertir e cuidar de si mesma sem a responsabilidade de agradar outro alguém, não serão essas atitudes concretas a verdadeira solução para amenizar a carga mental que adoece o feminino.
Se há alguma chance desse quadro dar sinal de melhoria, será através da desconstrução de conceitos e tabus históricos, culturais e sexistas/gêneros. É preciso rever o conceito e ressignificar o lugar da mulher e do homem, desde seu nascimento. É preciso entender que uma menina pode sim brincar de boneca e casinha e um menino também, afinal assim aprendem desde cedo, pelo brincar, sobre certas responsabilidades. Assim como a menina deve ter o direito a não se preocupar em agradar família ou agradar meninos, ela deve ter o direito de agradar a si mesma e se respeitar e ser respeitada em suas particularidades. As meninas devem também brincar como os meninos e sentir-se heroínas, jogar bola, brincar de carrinhos e ao lado de meninos e meninas entender que todos podem fazer muitas coisas e todos devem aprender sobre responsabilidades da vida igualmente.
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O adoecimento do feminino é uma realidade séria que precisa de atenção e cuidado. Os consultórios psicológicos e psiquiátricos estão cada vez mais recebendo mulheres entristecidas e perdidas.
É preciso ser compreendido pelo meio, por mulheres e homens, por pais e mães, professores e escolas a importância do ressignificado do lugar e papel da menina, da mulher. O papel da mulher precisa ser entendido como além de esposa, mãe ou mulher que serve para atrair e conquistar homens. A mulher precisa ter a chance de ser uma pessoa, um ser humano que existe nela e por ela. E um dia, se assim desejar, poderá formar uma família, ter um casa ou uma empresa que seja, desde que isso signifique parceria entre as pessoas envolvidas, parceria igualitária em que ambos têm direitos e deveres em todas as áreas, desde financeira até os cuidados básicos da casa e filhos, visto que ambos escolheram esse mesmo caminho.