Luciana Regina de Oliveira é mestre em Linguistica Aplicada e Estudos da Linguagem pela PUC-SP. Especialista em Motricid...
iDurante uma consulta fonoaudiológica infantil, quando perguntamos aos pais se há alguma queixa quanto à respiração e a resposta ser "não", ou ao perguntarmos "como seu filho respira?" a resposta ser "Ah! Normal!" ou então "Nunca observei". Mas é necessário entendermos e compartilharmos a importância de ficarmos atentos e investigarmos melhor esta questão, pelos motivos que conto mais adiante.
É comum ainda que os pais não saibam ou não entendam muito bem o motivo pelo qual o médico otorrinolaringologista ou o ortodontista encaminhou o filho para uma avaliação fonoaudiológica, se perguntando exatamente porque os filhos devem respirar pelo nariz, e qual importância e as vantagens disto.
Respirar pela boca não faz parte do desenvolvimento normal da criança. Ao contrário, a respiração oral causa uma série de distúrbios para o indivíduo, desde uma simples mudança da postura corporal até interferências no crescimento craniofacial.
A respiração nasal é condição ideal para o bom funcionamento de outras funções, ela permite aquecer, filtrar e umidificar o ar e se isso não ocorrer, o respirador oral pode desenvolver infecções das vias aéreas superiores (ouvido, nariz e garganta).
O que pode levar uma criança a ter um padrão de respiração oral?
Em geral, a respiração oral pode decorrer de dois fatores: obstrução ou hábito. O primeiro ocorre quando há alguma doença obstrutiva do nariz ou da faringe que impeça a respiração nasal. Comumente, nos recém-nascidos esta doença é a atresia de coanas, nas crianças pré-escolares as principais causas são os quadros alérgicos (rinites) e a hipertrofia das tonsilas (aumento da adenoide e/ou amígdalas). Já nos adultos é comum graças a desvios de septo ou pólipos no nariz.
O segundo fator, o hábito, ocorre quando o respirador continua utilizando a via oral mesmo depois de ter a doença obstrutiva sanada.
As crianças que respiram pela boca por muito tempo podem apresentar algumas alterações, tais como:
- projeção dos dentes para frente
- mordida aberta ou cruzada
- o pálato (céu da boca) fica mais alto e estreito
- o rosto fica alongado, lábios ressecados,lábio inferior evertido
- lábio superior hipodesenvolvido
- narinas estreita
- musculatura perioral hipotônica (com pouca força)
- músculo do queixo (mentual) exerce força excessiva ao tentar fechar a boca
- acúmulo de saliva na cavidade oral ou nas comissuras labiais (?canto? dos lábios).
Essas alterações interferem no crescimento facial e desenvolvimento das estruturas orofacias e também nas funções de mastigação, deglutição e na produção articulatória da fala prejudicando a inteligibilidade, o entendimento, da comunicação oral.
O que os pais precisam observar?
O indivíduo respirador oral pode apresentar vários sinais e sintomas característicos da chamada "síndrome do respirador oral". Os sinais que os pais devem observar são: assistir à TV com lábios entreabertos, lábios ressecados, gengivas inflamadas, ronco, sono agitado e pesadelos, dormir com a boca aberta, babar durante o sono, apresentar olheiras e/ou aspecto cansado, podendo ficar hiperativa ou sonolenta durante o dia. Além disso, as crianças também podem apresentar respiração barulhenta, voz rouca, dificuldade para se alimentar, como por exemplo: comer rápido, mastigar pouco e beber líquidos para auxiliar na hora de engolir.
Como funciona o diagnóstico e tratamento?
A investigação da causa da obstrução é relevante para compreensão do problema e determinação da conduta terapêutica. E quanto antes o diagnóstico e o tratamento, menor o risco de sequelas.
Pela diversidade das alterações encontradas, muitas vezes será necessário a intervenção de mais de um especialista como, por exemplo: o médico otorrinolaringologista e/ou alergista que irão diagnosticar a causa e prescrever o melhor tratamento naquele momento, podendo ser medicamentoso ou cirúrgico, o ortodontista que fará as correções dentárias necessárias seja interceptando o agravamento do problema, corrigindo a má oclusão ou redirecionando o crescimento craniofacial, o fisioterapeuta, por sua vez, atuará com as alterações de postura corporal.
O fonoaudiólogo é o profissional que reeducará as funções da respiração, da mastigação, da deglutição e da fala, através de um trabalho realizado, comumente, uma ou duas vezes por semana, no melhor período e acompanhando o desenvolvimento de cada paciente. ele também irá conscientizar esse paciente acerca do funcionamento da boca, do nariz, da laringe, da faringe e dos pulmões. Além de educar, principalmente, sobre a importância do uso da respiração nasal.
Para que o trabalho do fonoaudiólogo ocorra com êxito, são solicitadas diversas tarefas nas sessões de fonoterapia, dentre elas estão a limpeza e o uso do nariz durante as consultas, sendo de extrema importância a motivação do paciente, com o desenvolvimento de estratégias por parte do profissional.
Na maioria dos casos, não são necessários todos os especialistas anteriormente mencionados. No entanto, é imprescindível uma consulta com o médico otorrinolaringologista antes que o problema seja abordado pelos demais profissionais. A escolha do fonoaudiólogo também deve ser feita avaliando a especialidade desses casos, que é a motricidade orofacial.
Referências
Costa, Mariana; Freitas Valentim, Amanda; Gonçalves Becker, Helena Maria; Rodrigues Motta, AndréaACHADOS DA AVALIAÇÃO MULTIPROFISSIONAL DE CRIANÇAS RESPIRADORAS ORAIS Revista CEFAC, vol. 17, núm. 3, mayo-junio, 2015, pp. 864-878 Instituto Cefac São Paulo, Brasil
Marchesan, Di Francesco - Distúrbios da Motricidade Orofacial Ciclo 5 ap 1; 2011. p. 9-34Junqueira P, Marchesan IQ, Oliveira LR, Ciccone E, Haddad L, Rizzo MC. Speech languagepathology findings in patients with mouth breathing: multidisciplinary diagnosis according to etiology. Int J Orofacial Myology. 2010;36:27-32.
Marchesan IQ. Distúrbios Miofuncionais Orofaciais na Infância. In: Sociedade Brasileira de Otorrinolaringologia, Tratado de Otorrinolaringologia. São Paulo: Roca; 2003. p.520-533Di Francesco, R.C. Definindo a respiração oral. In: Krakauer, L. et al. (Org). Respiração oral: abordagem interdisciplinar. São José dos Campos: Pulso, 2003. p.15-