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A musicoterapia é capaz de proporcionar uma série de benefícios cientificamente comprovados, como ajudar no desenvolvimento da habilidade de fala e promover melhorias na coordenação motora e na sensação de bem-estar.
Por isso, terapeutas usam certos artifícios da música para estimular a progressão de crianças e adultos em diferentes contextos. Neste sentido, o método costuma ser altamente indicado para pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).
O TEA é uma condição que compromete as habilidades de comunicação e interação social da pessoa e, geralmente, aparece até os três anos de idade. Dentro do espectro, os pacientes são diagnosticados em diferentes graus de comprometimento, que vão desde leve até severo, onde existe um grande comprometimento da comunicação.
Exclusão social
De acordo com um estudo realizado pela Universidade Federal de Minas Gerais, estima-se que 24% das pessoas com TEA apresentam dois ou mais transtornos associados, com destaque para depressão, ansiedade, fobia social, transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), dentre outros. Há também relatos de prejuízos no desenvolvimento motor.
Muitas dessas condições paralelas evoluem em decorrência da dificuldade para comunicar-se e também do preconceito da sociedade, que muitas vezes exclui em vez de integrar indivíduos com TEA. Sem contar os casos em que os pais ou responsáveis não sabem como lidar com a pessoa autista.
Assim, a musicoterapia pode ser um caminho para ajudar a criança com TEA, conforme explica Luisiana Passarini, musicoterapeuta que pesquisa a neurociência da música no desenvolvimento da primeira infância. "O método modifica o modo de comunicação e potencializa a criança, mostrando outras habilidades e possibilidades que ela tem quando consegue fazer música", afirma.
A terapeuta Ana Paola Roveda, especialista em terapia do som, acrescenta que a musicoterapia também vale para outros transtornos. "Cada ritmo trabalha com uma doença específica e através do ritmo, daquela melodia, o profissional encontra um paralelo entre a música e o transtorno para que o paciente tenha melhoras na qualidade de vida", diz.
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Integração familiar e social
É comum que a criança autista tenha dificuldade para se vincular com o mundo externo. "Por isso, toda a questão musical irá trabalhar essa forma de se relacionar e, consequentemente, melhorar a interação social e o bem-estar do paciente", pontua Ana Paola Roveda.
Esse trabalho da musicoterapia pode também servir de apoio familiar. De acordo com Luisiana Passarini, a família é envolvida no método para que aprenda a escutar a criança de uma forma diferente e perceber toda a sua interação social.
"O tempo todo, o musicoterapeuta está ali para ajudar a criança a desenvolver a interação social e a comunicação a partir da música. Sempre brincamos muito com as crianças para que seja interessante para elas, mas brincamos com um objetivo", reitera a especialista.
Estímulo da atenção e do foco
A musicoterapia beneficia especialmente a atenção por atuar nas frequências cerebrais. "Pessoas com dificuldade de foco ou hiperatividade possuem a mente muito agitada, por isso, o método age com a intenção de harmonizar essa atividade cerebral excessiva", esclarece Ana Paula Roveda.
A especialista Luisiana Passarini aponta que uma das questões principais da musicoterapia é a atenção compartilhada. "Outro ponto é o quanto a criança consegue sustentar a atenção sobre o que faz, ou seja, por quanto tempo ela mantém o foco", completa.
Pesquisas mostram que a ação de criar música está relacionada à sensação de prazer e de gratificação. E isso, aos poucos, auxilia que a criança consiga aumentar a sua atenção e o foco.
Diante disso, Luisiana explica que as sessões ajudam a criança a compreender o poder de compartilhar atenção. "Quando a criança compartilha, ela aprende a trabalhar o "agora é minha vez", "agora é a sua vez" e, consequentemente, ter atenção no outro e perceber o que os outros fazem ao seu redor", afirma.
Sensação de conforto pela música
As melhoras que a musicoterapia pode promover na comunicação e na integração social de pessoas com TEA compõem o enredo do livro A Melodia dos Sonhos, escrito pela especialista em psicologia positiva, Juliana Marinho.
"Em meus estudos de fobia, reparei que todas essas doenças vêm de algum bloqueio, de algum trauma sofrido na infância ou na adolescência. Então, a personagem começa um tratamento para fazer um resgate, um desbloqueio daquele passado para que possa ir para frente e, consequentemente, melhorar a interação social", elucida.
A protagonista do romance, uma arquiteta que sofre de fobia social, passa a realizar sessões de terapia com a psicóloga e de musicoterapia e, aos poucos, vai vendo os resultados e restabelece o seu vínculo com o mundo externo.
Pessoas com TEA, principalmente adultos que não tiveram o diagnóstico na infância, podem carregar uma série de traumas decorrentes da incompreensão que circunda o transtorno. Assim, de acordo com Juliana, ouvir música pode ser uma forma de se comunicar com o mundo e a musicoterapia é capaz de tornar o processo de "tratamento" de um trauma mais rápido.
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A terapeuta Ana Paola Roveda informa ainda que, nas sessões de musicoterapia, a pessoa cria uma relação com a música, o que promove uma sensação de conforto. "Assim, a partir disso, ela se sente bem e permite a comunicação", diz.
Durante o atendimento de crianças, também é possível trabalhar pontos específicos que prejudicam a comunicação, como quadros de agressividade. "Se os pais se queixam, por exemplo, de agressividade, é possível trabalhar ondas sonoras mais harmônicas, como o solfejo", exemplifica a especialista.
Alívio do estresse e da ansiedade
Segundo a escritora Juliana Marinho, a musicoterapia estimula a liberação de neurotransmissores ligados ao prazer, como a serotonina, e também coordena os batimentos cardíacos, além de trazer melhorias diretas ao humor. Esses efeitos acontecem porque o som ajuda na harmonização das frequências cerebrais.
Desta forma, o alívio do estresse promovido pela musicoterapia também surte efeitos positivos quando o paciente é uma criança com TEA - e eles reverberam em toda a família. "Há a diminuição dos níveis de ansiedade tanto da criança quanto da família, pois abre-se ali uma comunicação. Assim, a família irá aceitar a criança da forma que ela é", pondera Ana Paola Roveda.
Ajuda no desenvolvimento motor
Um dos elementos principais da música, o ritmo, é explorado na musicoterapia a fim de melhorar a coordenação motora, conforme explica Luisiana Passarini. "Cada ritmo proporciona uma organização temporal e espacial. Quando a pessoa vivencia isso no corpo, de fazer um ritmo específico, ela se organiza internamente e ativa áreas cerebrais que são afetadas por essa atividade rítmica, o que consequentemente ativa o desenvolvimento motor", esclarece.
Importante reforçar que ninguém nasce sabendo tocar um instrumento musical. Por isso, o ato de tocar piano, por exemplo, desenvolve habilidades motoras que talvez nunca foram exploradas.
"Por que especialistas indicam que Mozart beneficia o desenvolvimento infantil? Porque toda frequência musical da música de Mozart estabelece um efeito específico em algo, como, por exemplo, o estímulo do desenvolvimento motor", pontua Ana Paola Roveda.
Embora não aconteça em todos os casos, existem relatos e também estudos da literatura científica de pessoas com TEA que também sofrem de prejuízos motores. Portanto, a musicoterapia pode trazer benefícios ainda maiores para esses pacientes.
Melhorias na fala
A terapeuta Luisiana Passarini complementa que os benefícios rítmicos da música também estão ligados à melhora da fala. "Essa parte rítmica organiza muito a questão da fala, porque, anatomicamente, são áreas muito próximas e, para o desenvolvimento da fala, um dos fatores mais importantes é a percepção rítmica", diz.
Quando a criança (ou adulto) aprende a vivenciar ritmos, ela vai se organizando na parte sensorial e também de linguagem. "Por isso, uma das grandes vantagens da música é que ela ativa muitas áreas do cérebro ao mesmo tempo e também as fortalece", completa Luisiana.
Músicos com TEA
Estudos recentes de psicólogos e historiadores defendem a teoria de que Wolfgang Amadeus Mozart tinha Transtorno do Espectro Autista (TEA). Até hoje, o austríaco é estudado mundialmente por ter sido um dos mais influentes compositores da história da música. Ele aprendeu a tocar instrumentos rapidamente e já compunha suas próprias músicas aos cinco anos de idade.
Segundo cartas escritas por sua irmã e familiares, Mozart sofria de muita dificuldade para se comunicar, se integrar socialmente e apresentava quadros frequentes de hiperatividade e falta de autocontrole sobre emoções. Porém, não existem estudos científicos que comprovem essa teoria, porque, na época (século 18), ainda não existia o diagnóstico de TEA e o campo da saúde mental ainda era pouco explorado.
Em tempos bem mais atuais, especificamente no ano de 2018, uma reportagem da BBC de Londres revelou o talento musical incomum de Michael Fuller - um menino de 11 anos considerado prodígio na música. Neste caso, porém, ele foi, de fato, diagnosticado com TEA e surpreendeu seus professores pela capacidade de "tirar músicas de ouvido".
Esse hábito, na verdade, diz respeito à habilidade de tocar uma música sem precisar olhar sua partitura ou aprendê-la com ajuda de um professor. Pessoas com essa aptidão identificam quais são as notas musicais de determinado som e conseguem reproduzi-las em instrumentos musicais.
Outro caso conhecido de músico com TEA é de Marty Balin, fundador da banda Jefferson Airplane - um dos grupos de rock mais influentes da história. O cantor foi diagnosticado com autismo ainda na infância e, em uma entrevista ao jornalista Jerry Gladstone, ressaltou o preconceito que circunda o transtorno.
"Fui diagnosticado com autismo quando criança e lutei contra isso enquanto crescia. Eu amava música, mas meu maior obstáculo foram as pessoas me dizendo que eu não tinha o que era preciso para ser um músico de sucesso", declarou o artista na época.
Porém, com menos de 30 anos, Balin e sua banda já haviam ganhado prêmios de diversas emissoras dos Estados Unidos e se apresentado em várias partes do mundo. Na mesma entrevista, o músico declarou: "Todos nós temos talentos. Use-os e você será feliz. Do contrário, é provável que não fique feliz. Você pode falhar - e tudo bem. Mas se você perseguir seu sonho, ele pode se tornar realidade."