É médico psiquiatra formado em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e especialista em Psiquiatria p...
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Houve pelo menos 22 ataques violentos em escolas do Brasil nas últimas duas décadas, segundo levantamento de Michele Prado, do Monitor do Debate Político no Meio Digital da USP (Universidade de São Paulo), sendo quatro deles nos últimos 15 dias. No total, de acordo com outro estudo, da Escola Politécnica de Saúde/Fiocruz, o País contabiliza 35 vítimas fatais e 72 feridos nesses atos extremos. Para além dos dados trágicos, existem as marcas e os traumas com os quais as crianças, os jovens, seus pais e as instituições de ensino precisam lidar.
Ainda que a imprensa tenha mudado a abordagem sobre esses crimes, passando a não destacar os nomes dos agressores e nem divulgar as imagens dos ataques, as redes sociais e os grupos de WhatsApp seguem escalando o medo de novos ataques e disseminando informações não verificadas sobre massacres com datas supostamente marcadas.
Esta semana, escolas alteraram rotinas, com guardas nos portões e proibições de livre circulação. A ansiedade se espalhou pelos corredores e chegou às salas de aulas. Os grupos de mensagens trocaram as tretas habituais por relatos de medo, informações sobre rotas de fuga no colégio e uma enxurrada de dúvidas. Alunos, professores e responsáveis procuram respostas para saber lidar com o assunto.
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Polícias estaduais e o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmam estar trabalhando para combater ameaças reais. Em parceria com a SaferNet Brasil, a pasta criou um canal exclusivo para recebimento de informações e denúncias de ataques contra escolas, chamado Operação Escola Segura. Na quarta-feira (12 de abril), o governo federal anunciou regras contra as redes sociais em caso de apologia de violência.
Mas, afinal, como aliviar a ansiedade e o medo dos filhos de irem à escola? Como abordar, de maneira efetiva e segura, o assunto com crianças e adolescentes? E, principalmente, quais medidas devem ser acompanhadas e cobradas das escolas pelos responsáveis? O MinhaVida conversou com especialistas para entender a melhor abordagem. Confira:
1. Mantenha um diálogo aberto com os filhos
A psicanalista Joseana Sousa tem duas filhas: uma de três anos e outra de sete. A escola onde as meninas estudam colocou seguranças na entrada e na saída, mas suas filhas não sabem o porquê. “Perguntei e elas não sabiam o motivo, mas entendiam que era para protegê-las.” E, assim, ela optou por não entrar em mais detalhes.
Joseana, que é especialista em desenvolvimento humano, acredita que essa é uma maneira de não levar a ansiedade e o medo para as crianças pequenas, que ainda não têm acesso às informações e notícias recentes sobre ataques a escolas. “Se a criança não sabe o que está acontecendo, não é interessante levar essa informação, pois gerará uma preocupação desnecessária para a idade deles”, afirma.
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Já no caso de crianças mais velhas, ou que tenham tido acesso às notícias recentes, e adolescentes, é necessário abordar o tema com linguagem adequada e de forma a passar a elas o sentimento de segurança. “Dependendo da idade da criança, se ela já teve acesso a esse tipo de informação, o que nós podemos fazer é capacitar essa criança, explicar que a escola e os adultos estão tomando conta disso e que ela pode se sentir segura.”
Além disso, é fundamental estabelecer um diálogo aberto para que os jovens e as crianças se sintam à vontade e seguros para relatar seus anseios, medos e preocupações aos pais. “Qualquer informação que traga um sentimento desagradável ou perturbação para essa criança deve ser compartilhada. Eles devem se sentir seguros e em um ambiente confortável para essa conversa”, completa a psicanalista.
2. Monitore as informações às quais seu filho têm acesso
Hoje em dia, é muito fácil crianças mais velhas e adolescentes terem acesso a todo e qualquer tipo de informação nas redes sociais, inclusive às fake news. Por isso, é essencial que os responsáveis monitorem o conteúdo que é consumido e compartilhado por seus filhos, assim como os perfis que seguem.
“É muito importante educar sobre consumir informações de fontes confiáveis e sobre verificar informações antes de compartilhar com outras pessoas”, orienta Joseane. “Notícias e sensacionalismo podem aumentar a ansiedade. Então, é preciso consumir apenas as informações que são realmente relevantes e confiáveis.”
3. Evite compartilhar informações que podem ser falsas
Ainda nesse sentido, ao se deparar com mensagens sobre supostas ameaças a novos ataques a escolas, evite compartilhar com outras pessoas ou grupos e oriente seu filho a fazer o mesmo. Apesar de parecer que a atitude servirá como um alerta, na realidade, compartilhar esse tipo de informação pode gerar ainda mais pânico na comunidade envolvida. É o que especialistas chamam de “efeito contágio”.
“É preciso limitar o acesso a essas informações, filtrar, verificar as fontes e, principalmente, não compartilhar antes de checar se é uma informação confiável ou não”, afirma Joseane.
Caso fique sabendo de alguma ameaça na escola em que seu filho ou outro familiar estuda ou trabalha, o mais indicado é verificar a fonte e denunciar para as autoridades locais. Invista nos canais de denúncia, como a Operação Escola Segura, e na polícia. No caso das redes sociais, é possível denunciar a publicação que contém as mensagens violentas ou de incitação ao ódio para que ela seja deletada.
4. Acompanhe as medidas de segurança propostas pela escola
Uma maneira importante e interessante de manter a calma como responsável para poder repassar essa tranquilidade para os filhos é se inteirar do que as autoridades e a escola estão fazendo para promover a segurança dos alunos neste momento.
Envolver-se no plano de segurança e cobrar da instituição ações efetivas para proteger os alunos é um caminho. Além disso, é importante seguir as orientações que são propostas pelas autoridades e pela escola e repassar esses planos para as crianças e os adolescentes.
5. Invista em técnicas de relaxamento e em psicoterapia, se necessário
Por fim, mas não menos importante, é essencial investir em técnicas de relaxamento, principalmente nos momentos em que a ansiedade e o medo baterem. “Existem pesquisas que comprovam que a exposição prolongada e repetida às notícias de eventos pós-traumáticos têm um impacto direto e negativo na saúde mental, especialmente de crianças e adolescentes”, afirma Joseane.
“A nossa mente não sabe o que é real e o que é imaginário, então, quando repetimos uma notícia várias vezes, é como se aquilo estivesse acontecendo várias vezes na nossa cabeça”, completa. Portanto, as técnicas de relaxamento entram como uma solução para acalmar a mente e o coração - e serve tanto para os filhos, quanto para os pais.
Algumas ideias incluem respiração diafragmática, que ajuda a desacelerar o coração e a reduzir os sintomas de ansiedade, yoga, atividade física e, se for o caso, a psicoterapia.
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“Caso você ou seu filho não consiga lidar sozinho com essa situação, com a ansiedade, procure ajuda de um profissional, como um psicólogo. Nós podemos desenvolver estratégias juntos para lidar com medo, com a ansiedade e encontrar uma maneira de lhe apoiar de forma mais eficaz para que, assim, você possa apoiar seus filhos”, diz Joseane.
E as escolas, que papel têm para amenizar a ansiedade dos alunos?
Os pais não precisam (e não devem!) estar sozinhos na tarefa de acalmar as crianças e os adolescentes diante do cenário de ataques a escolas frequentes. A escola também deve exercer um papel importante e protagonista na missão de criar um ambiente mais seguro e sem violência para os alunos.
Uma dessas atitudes, na visão de Celso Lopes de Souza, psiquiatra e fundador do Programa Semente, que atua na formação socioemocional de alunos e educadores em diversas escolas brasileiras, é acionar as autoridades em casos de ameaças feitas à escola ou à universidade e seguir as orientações das autoridades. “É importante evitar a “catastrofização”. A escola deve evitar o anúncio [sobre a ameaça] antes da hora certa, antes de procurar as autoridades policiais”, afirma.
Em segundo lugar, é essencial que a instituição mantenha uma comunicação transparente com os pais - e isso deve ser cobrado pelos responsáveis, mesmo em escolas que não receberam ameaças ou não sofreram ataques.
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“O que deve ser feito é tomar providências de prevenção. A escola pode mostrar os mecanismos que ela usa para a segurança dos alunos e expor aos pais qual o clima escolar”, sugere Celso. “Quanto mais os pais conhecerem a comunidade escolar, e estiverem participando dessa comunidade, mais confiança se estabelece e melhor é o clima de harmonia da escola.”
Celso acredita que essa é uma oportunidade de as instituições investirem no desenvolvimento socioemocional. “É a oportunidade de trabalhar no desenvolvimento de competências como empatia, respeito e confiança, porque são essas competências que todos podemos aprender e que vão gerar um ambiente com menos bullying e com mais confiança para os alunos exporem seus problemas”, afirma o médico.
Por fim, o psiquiatra acredita ser importante, ainda, que os professores trabalhem na sala de aula o pensamento crítico. “É preciso observar como sites e redes sociais que induzem esse tipo de conduta podem fazer muito mal para a sociedade”, finaliza.