Humberto Veiga, autor dos livros "O que as mulheres querem saber sobre finanças pessoais" e "Tranquilidade Financeira -...
iA conhecida pergunta "O que nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?" nos leva a uma situação circular e é sobre algo semelhante com referência a nossa vida e ao nosso bem-estar que eu quero comentar neste artigo: você trabalha para quê?
Quando estamos tratando de bem-estar e de qualidade de vida, temos que ter em mente que o tempo alocado no trabalho compete com aquele destinado a investirmos em nossos interesses "não remunerados" (ou até mesmo dispendiosos). Ficar de pernas para o ar, caminhar, olhar os pássaros ou escutar o barulho da chuva não custam nada, mas diminuem a quantidade de trabalho que podemos realizar em um dia. Um dos conceitos mais conhecidos quando se trata da alocação do tempo em economia, no que se refere às famílias, é que este tempo ou é utilizado para lazer ou para o trabalho.
Na grande maioria dos casos nós trabalhamos para satisfazer o nosso consumo. Ainda que uma boa parte das pessoas exerça a profissão que lhe agrada e que foi escolhida e não imposta por uma necessidade qualquer, é mais gostoso fazer o que se quer quando se quer.
Numa linha quase lógica de pensamento, se nosso consumo é alto, temos que trabalhar mais, e aí surge a dúvida: será que trabalhamos mais para consumir mais, ou consumimos mais o que nos leva a trabalhar mais?
Espero que concordemos até agora com isso: o trabalho "obrigatório" depende do consumo. Quanto menor for o último, mais tempo disponível nos restará.
Vejamos o caso do crédito consignado. Quando você adquire um produto por meio desta linha de financiamento, você está "vendendo" parte da sua força de trabalho para a aquisição daquele bem. Para ser mais preciso, você está gastando parte desta força de trabalho com o bem e outra com o serviço, que é o custo do crédito: juros. Quanto maiores forem os juros, maior será o seu tempo alocado para consumir o produto almejado.
Dito isso, temos uma primeira solução para quem não gosta muito de trabalhar: consuma menos. Aliás, surge aqui uma reflexão para aquelas pessoas que gostam muito de consumir: será que vale a pena trabalhar tanto?
Vivemos em uma sociedade chamada de consumo, na qual grande parte do produto nacional (nos Estados Unidos o consumo representa 70% da riqueza produzida) vem desta prática aparentemente corriqueira. E o trabalho é altamente valorizado. Mas trabalhar para quê? Para consumir.
Bolsa nova, vestido novo, carro novo, TV de última geração, tudo isso força você a sair mais cedo de casa e a voltar mais tarde. Para ajudar, aquele que trabalha muito é valorizado. Aquele que consome muito, se não vive atolado em dívidas, também o é. Até o lazer, que era uma possibilidade de relaxamento, passa a ter características de consumo. Se não for a um restaurante, não tem graça. Aliás, se o restaurante não for "caro" não tem graça.
O círculo vicioso funciona de modo a justificar esta atitude de consumo: o restaurante tem que ser caro porque eu trabalhei muito para ganhar o que eu ganho, logo, tenho que gastar muito por causa disso.
Certa vez, em uma conversa com uma pessoa querida, surge a seguinte afirmativa: "Ora, mas se eu não puder trocar de carro ou comprar uma roupa nova não tem graça". Será? O mundo pede isso? Sim, pede, mas você só entrega se quiser. O mundo pede isso porque há muita gente esperando para consumir mais e trabalhar mais em função do seu consumo e do seu trabalho.
Sair desse círculo vicioso não é fácil. Acho os que conseguem verdadeiros heróis, dado o tamanho esforço global no sentido de nos inserir nesta roda-viva. Mas discutir este assunto nos permite olhar nossa vida sob outra perspectiva.