Graduado em Medicina pela Faculdade de Medicina do ABC (1978) e doutorado em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da U...
iO consumo nocivo de álcool está associado a mais de 200 tipos de doenças e lesões e é responsável por 5,3% das mortes no mundo e 5,1% da carga global de doenças1.
Esses impactos provocados pela ingestão abusiva de álcool são influenciados pelo estilo de vida, comportamento, normas sociais e também pela genética. A hereditariedade para o hábito de beber, bem como para o abuso e a dependência, é complexa e indica o envolvimento de múltiplos genes, cada um contribuindo para aspectos distintos.
O papel da genética nos transtornos por uso de álcool tem sido investigado nos últimos anos e estudos com gêmeos foram os primeiros a mostrar essa relação. Dentro dessa linha de pesquisa2, um estudo australiano, por exemplo, encontrou uma estimativa de hereditariedade de 64%; ao passo que outro estudo com gêmeos relatou uma variação entre 40% e 70%.
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O tema voltou a ganhar notoriedade com a divulgação de um dos maiores estudos3 na área, publicado na renomada revista científica Nature. A grande repercussão levou em consideração, além das próprias descobertas, o aumento do tamanho da amostra e da diversidade étnica, o que contribui para melhorar esse tipo de análise.
Os pesquisadores analisaram os genomas de mais de 3,4 milhões de pessoas de ancestralidades diversas, como africana, asiática, americana e europeia, sendo encontradas 849 variações genéticas associadas à quantidade de álcool consumida por semana e outras 2.400 associações genéticas ligadas ao consumo de tabaco.
Uma das novas associações encontradas está ligada ao gene chamado ECE2, envolvido no desenvolvimento do córtex cerebral e também no processamento da neurotensina, molécula que regula a sinalização da dopamina, neurotransmissor envolvido no sistema de recompensa.
Os avanços nessa linha de pesquisa são positivos e relevantes, podendo contribuir para compreendermos melhor o papel da genética nos padrões de consumo de álcool, assim como para determinar o poder preditivo do risco poligênico entre populações.
No entanto, vale destacar que, embora os fatores genéticos tenham um papel importante no desenvolvimento dos transtornos por uso de álcool, estudos indicam que outros fatores de risco, como ambientais e interações gene ambiente, também contribuem significativamente para o surgimento e persistência destes transtornos.
Compreender todos esses aspectos é essencial para aprimorarmos continuamente as medidas de prevenção dos problemas relacionados ao álcool e o cuidado das pessoas afetadas por eles.
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Referências
- Alcohol. WHO. https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/alcohol
- Carvalho, Andre F., et al. "Alcohol use disorders." The Lancet 394.10200 (2019): 781-792.
- Saunders, Gretchen RB, et al. "Genetic diversity fuels gene discovery for tobacco and alcohol u.se." Nature (2022): 1-7.