Era muito cedo, por volta das sete horas da manhã. As berçaristas se movimentavam, atendendo as mães e recebendo os bebês e as crianças que ali chegavam. Eu, como psicóloga, estava lá fazendo um trabalho de capacitação para pajens e, para isso, tinha que observar a rotina do berçário, assim como a cultura que permeava o lugar antes de propor qualquer trabalho.
De repente, chega uma mãe muito apressada, como quase todas que precisam deixar seus filhos no berçário. O tempo é curto para chegar ao trabalho e elas precisam cumprir sua rotina extenuante para dar conta de oferecer aos seus filhos o melhor. A mãe era muito jovem e tinha traços delicados, mas passava um ar de muito cansaço e certo distanciamento da mulher que vivia dentro dela. Seu filho, uma criança de um ano, parecia muito assustado, como se tivesse sido acordado repentinamente.
A pajem que recebeu mãe e filho era uma pessoa muito simples, mas, ao mesmo tempo, muito sensível. Observando a situação, então, ofereceu a mãe um tempinho para que ela e filho digerissem aquele momento de separação. Embora seja um acontecimento comum, ela achou que este merecia atenção especial.
Em silêncio, apenas recebeu o bebê em seus braços e, ternamente, colocou a mão sobre o braço da mãe. Esta começou a chorar de maneira intensa. Felizmente, a sensibilidade daquela berçarista foi capaz de perceber a necessidade daquela mãe. Dizem que a verdade está no silêncio.
Com uma voz doce e sem expectativa de resposta, tampouco de interpretações, a pajem perguntou, cuidadosamente, se ela gostaria de falar. A mãe, aliviada, acenou afirmativamente com a cabeça. Foram para um canto elá ficaram por quase meia hora. Terminada a conversa, a mãe saiu aparentemente aliviada. Parecia ter encontrado um grande e empático continente para suas angústias. Angústias vividas por várias mulheres que se perdem na função de mãe e provedora.
A berçarista me contou, posteriormente, que aquela mãe revelou que sofria de maus tratos por parte do marido, um homem desempregado, alcoólatra e violento. Seu filho, com frequência, acordava assustado com os gritos, xingamentos e violências do pai.
Esta é uma história que se repete todos os dias. A diferença acontece quando se encontra alguém com quem é possível compartilhar as dificuldades sem julgamentos, interpretações ou sugestões do que se deve ou não fazer.
Esta foi uma cena marcante presenciada por mim. Refleti como o berçário e a escola são - quando partilham de uma visão humanista - grandes centros de ajuda, onde se pode encontrar amparo e alternativas.
Percebi como deixamos, muitas vezes, de oferecer uma despretensiosa escuta, livre de preconceitos, de interpretações prontas e conceitos carregados de moralismos. Sabemos muito pouco do que se passa no mundo de cada um e, por isso, a escola precisa resgatar o seu lugar de formador, o seu lugar de escuta. Estes são aspectos extremamente importantes no aprendizado de uma criança, principalmente quando a família é incluída neste processo.
Mais que o preparo técnico dos nossos educadores, é cada vez mais importante a formação pessoal daqueles que pretendem assumir a função de formadores das nossas crianças. Aquela berçarista era uma pessoa muito, muito simples. Não conhecia as teorias psicológicas, mas tinha um profundo conhecimento do humano. Uma sabedoria quase natural.
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