Lucília Santana Faria é coordenadora médica da UTI Pediátrica do Hospital Sírio-Libanês
Redatora especialista em conteúdos sobre saúde, família e alimentação.
O que é Asfixia Perinatal?
A asfixia perinatal é uma síndrome clínico-neurológica que se desenvolve quando há hipoperfusão tecidual significativa e diminuição do fluxo sanguíneo uteroplacentário, ou hipóxia, caracterizada pela quantidade de oxigênio insuficiente nos tecidos.
Pode ocorrer durante o período periparto, no nascimento e nos primeiros minutos de vida, acarretando lesões graves no recém-nascido, principalmente no sistema nervoso central.
Causas
Existem diversas causas podem desencadear um quadro de asfixia perinatal. A mais comum está relacionada aos eventos hipóxico-isquêmicos, que podem ocorrer durante o parto, de modo que o monitoramento do feto é necessário para avaliar se ele não está tendo bradicardia, ou seja, ritmo cardíaco irregular ou lento. Normalmente, a bradicardia ocorre devido ao descolamento prematuro da placenta, nó verdadeiro de cordão e prolapso de cordão.
Ademais, a queda abrupta de pressão da mãe, chamada de hipotensão materna, e a dificuldade do recém-nascido de chorar, ou seja, inflar os pulmões ao nascer, também são causas importantes associadas à asfixia perinatal, conforme ressalta a pediatra neonatologista e coordenadora da UTI Neonatal do Hospital e Maternidade Pro Matre, Edinéia Vaciloto Lima.
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Sintomas
Em casos mais leves de asfixia perinatal, nos quais a mãe e o recém-nascido são prontamente atendidos por uma equipe médica, a pediatra Leila Denise Pereira, do Departamento Científico de Neonatologia da SBP, explica que o bebê não assume a respiração de forma espontânea ao nascer. Porém, se for adequadamente reanimado, ele se recupera e evolui sem outros sintomas.
“Sabe-se que, de cada 10 recém-nascidos que necessitam de ventilação ao nascer, 9 melhoram se a técnica for adequada, e que o atendimento realizado por profissionais de saúde habilitados reduz em 20 a 30% as taxas de mortalidade neonatal”, elucida a médica.
Já em casos mais graves, os sintomas apresentados pelo bebê são:
- Dificuldade respiratória
- Palidez
- Pulsos fracos
- Anormalidades da frequência cardíaca
- Pressão arterial baixa
- Redução do tônus muscular (hipotonia) e do nível de consciência
- Convulsão
- Hipoglicemia
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Fatores de risco
Alguns fatores de risco para a asfixia perinatal podem ser observados antes do nascimento, de acordo com a pediatra Leila Denise Pereira. São eles:
- Ausência de acompanhamento pré-natal
- Doenças maternas (hipertensão arterial, diabetes, pré-eclâmpsia)
- Problemas placentários (descolamento de placenta, anormalidade de implantação da placenta)
- Malformação fetal
- Problemas que prejudicam o fluxo sanguíneo do cordão umbilical
Antes do nascimento, “servem de alerta, principalmente, o trabalho de parto prematuro ou prolongado, a rotura das membranas amnióticas por tempo prolongado, a febre materna e as anormalidades da frequência cardíaca fetal”, explica a especialista, enfatizando a importância da identificação e reconhecimento precoce dos fatores de risco para que medidas preventivas possam ser tomadas.
Outros fatores de risco à serem observados, segundo Lucília Santana Faria, coordenadora médica da UTI Pediátrica do Hospital Sírio-Libanês, incluem:
- Gravidez na adolescência
- Prematuridade
- Baixo peso do recém-nascido (menor que 2,5kg)
- Antecedente de natimortalidade
- Primeira gestação
- Ameaça de parto prematuro
- Intercorrência clínica na gestação
- Parto vaginal associado a uma assistência de baixa qualidade
Tipo de parto influencia na incidência da asfixia perinatal?
De acordo com a médica Lucília Faria, o parto vaginal (ou normal) está associado à maior incidência de asfixia perinatal. Porém, com assistência adequada e mudança de técnica para cesárea quando o parto não evolui de forma esperada, as chances do bebê ter a síndrome diminuem consideravelmente.
“A tentativa de se realizar parto normal a todo custo, com trabalho de parto prolongado ou sem assistência, é um fator importante que se associa à asfixia”, explica a especialista.
Incidência da asfixia perinatal
Na literatura médica, a incidência de asfixia perinatal varia de 3 a 6 para cada 1.000 recém-nascidos vivos. Cerca de 4 milhões de recém-nascidos no mundo apresentam a síndrome anualmente. Destes, 1 milhão evoluem para óbito e 1 milhão evoluem com sequelas graves, conforme esclarece a médica Lucília Faria.
No Brasil, embora não existam dados precisos sobre a incidência de asfixia perinatal, levantamentos da Sociedade Brasileira de Pediatria indicam que 13 a 15 recém-nascidos morrem todos os dias de asfixia no país. Dos nascidos, cerca de 290.000 necessitam de ajuda para iniciar e manter a respiração após o nascimento.
Tratamento
O tratamento de bebês com asfixia perinatal se inicia logo após o parto, com os procedimentos de reanimação neonatal praticados com base no Programa de Reanimação Neonatal da Sociedade Brasileira de Pediatria. A médica Edinéia Lima explica que eles são realizados por uma equipe multiprofissional devidamente treinada e preparada para receber e assistir um recém-nascido com a síndrome.
Após os primeiros cuidados, o bebê é transportado da sala de parto para a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal.
Atualmente, o tratamento mais utilizado e com melhores resultados para os recém-nascidos com asfixia perinatal moderada ou grave é a Hipotermia Terapêutica, uma técnica que consiste no resfriamento do corpo do bebê para diminuir o risco de lesões neurológicas e a formação de coágulos, associada a monitorização da atividade cerebral pelo eletroencefalograma, que deve ser iniciado precocemente e mantido por 72 horas.
Segundo a pediatra Lucília Faria, o bebê deve estar na UTI neonatal, sendo monitorado e recebendo auxílio de aparelhos para sua respiração, além de receber assistência multidisciplinar.
“Nos casos mais graves, é recomendado que o recém-nascido seja tratado em hospitais de alta complexidade, que dispõem de recursos tecnológicos com potencial de prevenir ou reduzir sequelas neurológicas e mortalidade”, acrescenta Leila Denise Pereira.
Cuidados
Após a alta, é necessário que os bebês que tiveram asfixia perinatal sigam um acompanhamento multiprofissional, com pediatras, neurologistas pediátricos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos e cardiologistas. Dessa forma, é possível a detecção de possíveis deficiências, análise da necessidade de intervenção precoce e minimização de sequelas que podem acometer a criança.
Sequelas da asfixia perinatal
A asfixia perinatal é considerada uma condição multissistêmica, como explica Leila, de modo que pode levar ao comprometimento de vários órgãos como rins, pulmões, intestino, fígado, coração e cérebro - o que, em muitos casos, é reversível. “As complicações mais temidas são as que acometem o sistema neurológico, tendo em vista sua potencial evolução para sequelas”, explica.
A especialista esclarece que recém-nascidos que evoluem com comprometimento moderado ou grave no cérebro, no período neonatal, apresentam risco elevado de sequelas como:
- Paralisia cerebral
- Anormalidade visual
- Deficiência auditiva
- Dificuldade de aprendizado
- Déficit de atenção e hiperatividade (TDAH)
- Distúrbio de comportamento
Prevenção
Como evitar asfixia neonatal?
Um acompanhamento cuidadoso durante o pré-natal, com consultas mensais e a realização de todos os exames solicitados, é o melhor método de prevenção contra a asfixia perinatal. Nesse processo, é possível reconhecer as possíveis situações de risco para o bebê durante o parto.
Ademais, de acordo com a pediatra Leila Denise Pereira, a estratégia preventiva inclui “a monitorização fetal antes e durante o parto, a presença de equipe obstétrica capacitada para atender o parto, reconhecer complicações obstétricas e intervir em tempo oportuno, além da presença de equipe pediátrica capacitada em reanimação neonatal”.
A pediatra neonatologista Edinéia Lima também ressalta a importância de realizar o parto em uma instituição com estrutura preparada para oferecer uma assistência completa para a mãe e o recém-nascido, reduzindo os riscos para ambos.
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Referências
Lucília Santana Faria, coordenadora médica da UTI Pediátrica do Hospital Sírio-Libanês - CRM-SP 57356
Edinéia Vaciloto Lima, pediatra neonatologista e coordenadora da UTI Neonatal do Hospital e Maternidade Pro Matre
Leila Denise Pereira, pediatra do Departamento Científico de Neonatologia da SBP