Graduação em Medicina pela Universidade de Taubaté (1984). Mestrado em Medicina (Pediatria) pela Universidade de São Pau...
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O aleitamento materno traz inúmeros benefícios para as lactantes e para os bebês, mas não é incomum que as mães encontrem dificuldades no processo. A desinformação, a falta de rede de apoio e o insucesso quanto ao ato de amamentar podem motivá-las a querer que o bebê receba o leite humano de outra lactante, tendo ela vínculo familiar ou não.
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A prática, conhecida como amamentação cruzada, é desaconselhada pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e contraindicada pelo Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde (OMS) devido ao risco de o bebê ser contaminado por alguma doença infectocontagiosa.
“A mãe reconhece que este é o melhor alimento para seu bebê, porém não está conseguindo amamentar e desconhece os riscos do aleitamento cruzado”, acrescenta Clery Bernardi Gallacci, pediatra e neonatologista do Hospital e Maternidade Santa Joana.
Quais os riscos da amamentação cruzada?
O principal risco associado à amamentação cruzada é que, através do leite da lactante, o bebê pode ser contaminado por uma série de doenças infectocontagiosas, como hepatite, citomegalovírus (da mesma família do vírus Herpes), Aids e mononucleose. Clery ainda destaca que outras situações podem caracterizar riscos ao bebê, como o uso de alguns medicamentos e o consumo de álcool pela mãe que está amamentando.
“Desde 1993, o Ministério da Saúde já tem portaria contraindicado a prática do aleitamento cruzado. Em 2019, 26 anos após a primeira portaria, uma pesquisa do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (ENANI) revelou que 21,1% das mulheres entrevistadas ainda praticavam o aleitamento cruzado”, aponta Clery.
É importante destacar que a amamentação cruzada também é contraindicada no caso de mulheres que sejam da mesma família, como primas ou irmãs, de acordo com a ginecologista e obstetra Carolina Curci. Mesmo mulheres de aparência saudável não devem amamentar outro bebê, pois elas podem estar em janela imunológica ou possuírem alguma doença assintomática.
Como superar as dificuldades da amamentação?
Nem sempre a amamentação é um processo tranquilo. Por isso, é indispensável contar com uma rede de apoio, com profissionais da saúde e membros da própria família, para ter suporte no aleitamento e um favorecimento no processo.
De acordo com o Guia Alimentar de Crianças Brasileiras Menores de dois anos, do Ministério da Saúde, existem nove desafios comuns no período de aleitamento que podem ser resolvidos a partir de algumas medidas. São eles:
- Demora na descida do leite: “a descida do leite”, ou apojadura, ocorre entre o terceiro e quinto dia pós-parto, mas pode demorar um pouco mais para descer em algumas pessoas, como aquelas que realizaram parto cesárea. Algumas medidas podem ajudar, em especial a estimulação da mama com sucção frequente do bebê ou com extração manual ou por bomba de leite materno
- Criança com dificuldade de sugar: alguns bebês podem encontrar dificuldades para serem amamentados por diversas razões, como: não sugar, tentar sugar, mas não conseguir abocanhar o mamilo e a aréola, pegar a mama, mas não conseguir manter a pega, uso de bicos de silicone e chupetas, a mama apresentar uma condição que dificulta o processo ou ainda o bebê possuir a língua presa, segundo o guia. O melhor a ser feito, nesses casos, é suspender o uso de bicos artificiais, ajustar a pega e variar a posição do bebê no momento de amamentar, além de oferecer o leite no copo ou na colher quando ele não conseguir sugar
- Mamilo plano ou invertido: pode dificultar a amamentação, mas não necessariamente impedi-la. O que pode ser feito é ajudar o bebê a abocanhar o mamilo e a aréola e tentar diferentes posições para facilitar a pega
- Mamilos doloridos e/ou machucados: sentir os mamilos sensíveis logo após o parto é completamente normal, mas sentir dor para amamentar é sinal que algo precisa ser ajustado, como a pega e o posicionamento. Nesse caso, variar a posição das mamadas, iniciar a amamentação na mama não machucada ou menos machucada e enxaguar os mamilos com água limpa, pelo menos uma vez por dia, pode ajudar
- Leite empedrado: é quando a mama produz leite além da quantidade esperada. O peito enche a ponto de deixar a pele esticada, ficando endurecido ou com a presença de alguns caroços. O melhor a se fazer, nesses casos, é adotar a amamentação em livre demanda, realizar massagens com movimentos circulares nas mamas, começando pela aréola e depois ao seu redor, massageando bem os pontos “empedrados” e retirar um pouco do leite antes de colocar o bebê para mamar, até que a aréola fique macia, o que facilita a pega
- Mastite: é uma inflamação da mama, que pode progredir ou não para uma infecção. Nessa situação, uma parte da mama fica inchada, quente, avermelhada e dolorida, o que costuma causar dores no corpo, febre e mal-estar. É fundamental buscar ajuda de um serviço de saúde nesses casos para um tratamento adequado
- Bloqueio de ductos lactíferos: os ductos lactíferos são os canais por onde o leite passa dentro da mama. Segundo o Ministério da Saúde, eles podem ficar bloqueados quando: o leite produzido não é drenado adequadamente, a mama não está sendo bem esvaziada, as mamadas estão muito espaçadas e a mulher usa um sutiã muito apertado ou ainda obstrui os poros de saída do leite com cremes. Para tratar o problema, o ideal é amamentar com frequência, massagear a área afetada e esvaziar as mamas, além de tentar diferentes posições para amamentar. Caso não resolva, a mãe deve buscar ajuda especializada
- Pouco leite: essa é uma das principais razões que motivam a amamentação cruzada. É importante saber que a maioria das mulheres produz uma quantidade suficiente de leite, desde que a criança amamente com frequência, por tempo e pega adequados, estimulando a produção do leite e o esvaziamento da mama
- Hiperlactação: ocorre quando a mulher produz leite além do que o bebê consome. Evitar retirar o leite antes das mamadas e só fazer isso quando elas estiverem muito cheias pode ajudar a lidar com a condição. A pessoa que produz leite em excesso também pode considerar doar para o Banco de Leite Humano ou Posto de Coleta de Leite Humano, quando houver em sua cidade.
Quando a mãe não deve amamentar?
No Brasil, segundo recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a amamentação é contraindicada em caso de administração de medicamentos incompatíveis com o aleitamento ou de mãe portadoras de HIV e HTLV, o vírus o vírus T-linfotrópico humano — pelo risco da transmissão através do leite materno.
Outras doenças infecciosas e potencialmente contagiosas não chegam a impedir a amamentação, como tuberculose, catapora, influenza tipo 1 e rubéola. Contudo, é fundamental que sejam tomados cuidados específicos para que não existam riscos à saúde da criança.
Embora seja raro, outro impeditivo da amamentação é quando a criança possui diagnóstico de galactosemia, uma doença em que ela não pode ingerir lactose, o que torna necessária a substituição de todos os alimentos que contenham leite na sua composição, incluindo o leite materno. Nesses casos, o ideal é recorrer ao leite sintético, previamente indicado pelo pediatra.
Importância dos bancos de leite humano
No caso de mães que não podem amamentar, os Bancos de Leite Humano são uma alternativa para manter o aleitamento. Segundo Clery, o leite doado aos bancos passa por um processo de segurança na manipulação, pasteurização e armazenamento para depois ser liberado para o uso dos bebês.
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Em razão disso, o processo é completamente seguro, ao contrário da amamentação cruzada. “Além disso, as mães doadoras passam por uma triagem infecciosa e anamnese para estarem aptas à doação. Os Bancos de Leite Humano estão sob vigilância das Secretarias de Saúde e precisam seguir rigorosamente a legislação do Ministério da Saúde”, acrescenta a especialista.
Para receber doações, existem Bancos de Leite registrados nas Secretarias de Saúde de modo que a mãe pode procurar o mais próximo de sua residência e verificar a disponibilidade de dispensação do mesmo.
O leite materno é o alimento mais completo que o bebê pode ter. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), ele deve ser o alimento exclusivo da criança até o sexto mês de vida. Após este período, a amamentação deve prosseguir junto com a complementação alimentar de outras fontes nutricionais.