Anna Hirsch Burg é psicóloga formada pela Pontifícia Universidade Católia de São Paulo. Fez sua formação em psicanálise...
i"Há uma recente transformação no estatuto da adolescência na atualidade; se até a primeira metade desse século tudo o que o adolescente desejava era ser incluído no mundo dos adultos, hoje a adolescência é hipervalorizada e são os adultos que tentam se identificar com os adolescentes" (Contardo Calligaris).
Como podemos julgar o que significa ser pai ou mãe de um (a) adolescente numa época onde as inúmeras mudanças nas relações familiares e sociais não estão claras para ninguém? O que significa ser adolescente e assistir (em 3D) à eclosão de um ?novo corpo? e pensamento próprio? Vivenciar o nascimento tanto de perdas quanto de novos poderes?
Em se tratando de uma fase tão complexa da vida como a adolescência, ao analisar pais e filhos, não procure encontrar mocinhos e bandidos, pois ambos, cada um a sua maneira, atravessam uma profunda crise. Estamos diante da primeira geração de adolescentes da história da humanidade que ?tem facebook?. Parece brincadeira, mas acredito que cada geração enfrentará "a tecnologia que merece" com suas consequentes modificações nos relacionamentos familiares e interpessoais.
Do ponto de vista do psicanalista J.D. Nasio, "A adolescência é um luto da infância. O jovem deve ao mesmo tempo perder seu universo de criança, conservar suas sensações e emoções infantis e conquistar a idade adulta. Portanto, o adolescente deve, ao mesmo tempo, perder, conservar e conquistar: Perder seu corpo de criança, conservar tudo que sentiu, percebeu e desejou desde seu primeiro despertar, em especial sua inocência de criança; conquistar a idade adulta".
Acredito que a melhor maneira de um adulto entender esse "luto adolescente" é lembrando-se da sua própria adolescência. Como foi perceber que papai e mamãe não eram iguais aos pais construídos pelo olhar infantil? Como era vivenciar a urgência em pertencer a um grupo de amigos e desejar espaço no olhar das meninas ou dos meninos? A insegurança alternada com a sensação de se sentir o dono do mundo e ousar ser irreverente?
Ambivalência, instabilidade de humor e comportamento aparentemente incoerente são característicos nessa fase, desde que não se manifeste nenhum exagero em sua intensidade ou frequência. Podemos então concluir que estes sintomas são uma "síndrome normal na adolescência". Os jovens alternam audácia com timidez, apatia concomitante com conflitos afetivos, crises religiosas que vão do ateísmo ao misticismo, sexualidade amorfa ou por demais exibida e falam ou calam demais. Tentam expressar em palavras esta busca de si mesmo. A lacuna nesta expressão geralmente se apresenta pelo fato de não saberem identificar exatamente o que sentem.
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Não são apenas os adolescentes que passam por um luto. Para os pais, o exercício de se desprender do filho criança e evoluir para uma relação com o filho adulto geralmente dói. Não é pouco frequente escutar no consultório a tristeza dos pais que, ao se depararem com seus filhos crescidos, percebem que sua própria juventude passou. Talvez o maior luto vivido pelos pais seja o fato de serem julgados por seus filhos, coisa que não acontecia quando eram pequenos, afinal, nesta fase se sentiam idolatrados.
Foi o tempo em que a tentativa de uma compreensão mais profunda dos fenômenos que acontecem durante a adolescência centralizava-se somente no adolescente. Esse enfoque estará sempre incompleto se não ampliarmos os horizontes para a família e o contexto social em que está inserida.
Pais e adolescentes, alguns de maneira silenciosa e sorrateira, outros com maior turbulência e tempestade, atravessam suas crises. Mas calma, existe terra a vista! Quais são os sinais que atestam o fim dessa fase que chamamos popularmente de "aborrescência"? J.D. Nasio fornece uma bela pista, tão psicanalítica quanto poética: "Ter amadurecido é ter adquirido uma nova maneira de amar o outro e amar-se a si mesmo".