Sâmia Yasin Wayhs é neurocirurgiã e diretora da Comissão das Mulheres na Neurocirurgia da Sociedade Brasileira de Neuroc...
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O que é Estado vegetativo?
O estado vegetativo é uma condição neurológica caracterizada pela ausência de reação intencional do paciente a estímulos do ambiente.
No geral, devido à atividade do tronco cerebral e da medula espinhal, há a conservação dos reflexos autônomos e motores, de modo que a pessoa pode apresentar movimentos oculares, bocejo e movimentos involuntários em reação a estímulos dolorosos; nesses momentos, é comum que apresente aumento da pressão arterial, da frequência cardíaca e respiratória. O ciclo de sono e vigília também é preservado na condição.
Todavia, os pacientes em estado vegetativo não demonstram consciência do meio externo ou de si mesmos, de forma que não há evidência de compreensão ou de expressão linguística.
O termo estado vegetativo persistente refere-se ao estado considerado definitivo e irreversível, normalmente após um ano de cuidados de observação e de estimulação. Após três anos sem respostas conscientes, as chances de a pessoa acordar se tornam excepcionais, segundo Sâmia Yasin Wayhs, neurocirurgiã e diretora da Comissão das Mulheres na Neurocirurgia da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia.
Qual a diferença entre estado vegetativo e coma?
A principal diferença entre o coma e o estado vegetativo é a presença do ciclo sono-vigília, que se dá no EV, além da questão da irreversibilidade do quadro. Nesse contexto, o paciente em coma pode apresentar uma recuperação, acompanhada ou não de uma sequela, ou evoluir para a morte.
“Os pacientes em coma que sobrevivem após quatro semanas podem permanecer sem acordar e sem consciência, evoluindo para estado vegetativo. A maioria desses sobreviventes, no entanto, evolui com estado mínimo de consciência, que pode apresentar melhora neurológica após semanas e meses ao longo de um ano”, explica Sâmia Yasin Wayhs.
Causas
O paciente entra em estado vegetativo quando a parte do cérebro que controla o pensamento e a percepção para de trabalhar, ao mesmo tempo que a parte do cérebro que controla a respiração, a frequência cardíaca e a pressão arterial continua a funcionar, segundo o Manual MSD.
De acordo com Sâmia e a neurologista Ana Paula Peña, isso pode ocorrer em função de:
- Traumatismo craniano encefálico
- Hemorragia cerebral
- Acidente vascular cerebral (AVC)
- Meningite
- Encefalite
- Encefalopatia hipóxico-isquêmica (lesões cerebrais após parada cardiorrespiratória)
- Infecções no sistema nervoso central
- Tumor cerebral
Incidência do estado vegetativo
Não existem dados precisos sobre a prevalência de pessoas em estado vegetativo persistente. As estimativas variam de 10 mil a 25 mil adultos e de 4 mil a 10 mil crianças nos Estados Unidos. Segundo dados divulgados em 2018, é provável uma incidência de 1.500 novos casos por ano na Inglaterra e no País de Gales.
Sintomas
Os principais sinais do estado vegetativo incluem a ausência de consciência de si ou do ambiente e de respostas comportamentais sustentadas, reprodutíveis, propositais ou voluntárias aos estímulos visual, auditivo e tátil, conforme explica Sâmia. Desse modo, o paciente com a condição não consegue:
- Falar ou seguir comandos;
- Ter consciência do que está acontecendo ao redor;
- Pensar ou mover o corpo propositalmente;
- Controlar a micção ou a evacuação.
Porém, uma característica do estado vegetativo é que há preservação suficiente do diencéfalo e do tronco encefálico, de modo que o paciente pode:
- Dormir e acordar em um ciclo regular;
- Realizar movimentos básicos, como bocejar, engasgar, mastigar e tossir;
- Ter a aparência de estar sorrindo ou olhando com desdém;
- Abrir os olhos e piscar.
Ao contrário de pacientes em estado vegetativo, aqueles em estado mínimo de consciência, segundo a neurologista Sâmia Yasin Wayhs, "podem apresentar contato visual, virar a cabeça ao serem chamados e movimentar os olhos. Podem pronunciar algumas palavras, demonstrar dor, acompanhar com os olhos e segurar o objeto quando solicitado”.
A depender da lesão, esses pacientes podem apresentar melhora neurológica se tratados e reabilitados.
Diagnóstico
A princípio, a partir de uma investigação clínica e neurológica, é preciso distinguir o estado vegetativo do estado mínimo de consciência. Ambos podem ser permanentes ou temporários, de modo que o diagnóstico não pode ser realizado de imediato. Usualmente é necessário um período de observação de um a três meses.
O diagnóstico da condição é realizado com base nos sintomas do paciente. Um exame neurológico especializado pode ser necessário, o que inclui exames laboratoriais e exames de imagem, tais como tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) do crânio.
No geral, exames de imagem neurológicos são indicados para excluir doenças tratáveis. TC e RM podem diferenciar infarto isquêmico, hemorragia intracerebral e uma massa envolvendo o córtex ou o tronco encefálico, segundo o Manual MSD.
Tratamento
O tratamento do estado vegetativo é principalmente de suporte, em especial em casos de pacientes em estado vegetativo persistente. Segundo o neurologista Ronald E. Cranford no artigo Término do Tratamento no Estado Vegetativo Persistente, existem quatro níveis de cuidados médicos nessa situação, sendo eles:
- Nutrição e hidratação a partir do uso de tubos de alimentação;
- Medicação: administração de antibióticos para tratar infecções pulmonares e urinárias, doenças sistêmicas que podem ocorrer devido à imobilização;
- Cuidados gerais para manter o conforto, o bem-estar, a higiene e a dignidade pessoal;
- Tecnologia: suporte avançado de vida, como a ventilação e a diálise, por exemplo.
Atualmente, existem estudos que avaliam os efeitos da musicoterapia durante distúrbios de consciência. Alguns deles sugerem que a forma de tratamento pode levar a efeitos comportamentais positivos. Porém, as pesquisas nessa área até agora são limitadas.
Por fim, é importante ressaltar que as decisões sobre os cuidados com o paciente devem envolver serviços sociais e reuniões frequentes com a família — especialmente no que dizem respeito ao tratamento de pacientes terminais.
Convivendo (Prognóstico)
O prognóstico do estado vegetativo pode variar de acordo com a causa e a duração da condição. Em suma, se a causa é uma condição metabólica reversível, o prognóstico pode ser favorável ao paciente.
Todavia, a recuperação é improvável após um mês se a lesão cerebral é não traumática e 12 meses se o dano é traumático. Embora possa ocorrer uma recuperação depois desse período, a maioria dos indivíduos é severamente incapacitado.
Segundo o Manual MSD, se um estado vegetativo persiste, a maioria dos pacientes morre em seis meses após a lesão cerebral inicial. A causa é normalmente por doenças sistêmicas causadas pela imobilidade, como infecção do trato urinário ou pneumonia. A morte também pode ser súbita e de causa desconhecida.
Já para os demais casos, a expectativa de vida é de cerca de dois a cinco anos. Alguns pacientes podem viver décadas, especialmente os que possuem uma condição física boa e estável com os cuidados gerais.
Referências
Sâmia Yasin Wayhs, neurocirurgiã e diretora da Comissão das Mulheres na Neurocirurgia da Sociedade Brasileira de Neurocirurgia - CRM 164427-SP / RQE 23417
Ana Paula Peña, neurologista.
Manual MSD