Médica psiquiatra e docente da Escola Internacional de Desenvolvimento (EID). Também ministra curso sobre autismo em adu...
iFormado pela Universidade Luterana do Brasil, no Rio Grande do Sul, é especializado em conteúdos de saúde
O que é Síndrome de Savant?
A Síndrome de Savant é uma alteração psíquica rara em que as pessoas apresentam talentos e habilidades incríveis, e são denominadas "ilhas de genialidade" ou "prodígios". Indivíduos com essa condição exibem capacidades notáveis, como memorizar livros inteiros, fazer cálculos matemáticos rapidamente e sem o auxílio de calculadoras, além de aptidões artísticas. No geral, porém, enfrentam dificuldades de comunicação e expressão, apesar de terem uma memória acima da média.
De acordo com o Instituto de Apoio e Desenvolvimento (ITAD), a prevalência de pessoas com síndrome é de 1 em cada 2.000, ainda que sua incidência aumente para 1 em cada 10 indivíduos com autismo, ou seja, é um distúrbio com prevalência pequena entre a população geral.
Desta forma, a síndrome é diagnosticada com mais frequência em crianças, porém o savantismo também pode surgir na idade adulta após traumas cerebrais, meningite, crises de epilepsia ou em decorrência de um AVC.
História da síndrome de Savant
Savant é uma palavra de origem francesa que significa “sábio” - daí a síndrome do sábio, pela qual também é conhecida.
Embora a síndrome de Savant seja pouco conhecida, já foi citada na literatura científica desde meados do século 18, quando o psiquiatra norte-americano Benjamim Rush descreveu a incrível habilidade de Thomas Fuller para lidar com números.
No entanto, em 1887, o médico britânico John Langdon Down (conhecido até então por ter identificado a síndrome de Down) descobriu 10 pessoas com a síndrome de Savant.
Atualmente, sabe-se que a maioria das pessoas com Síndrome de Savant têm, geralmente, QI (quociente de inteligência) entre 40 e 70, ou seja, abaixo da média mundial, que é entre 85 e 100. Logo, a genialidade é restrita apenas para determinadas habilidades.
Síndrome de Savant X transtorno do espectro autista (TEA): qual a diferença?
Transtorno do espectro autista
- A pessoa com TEA também pode ter o diagnóstico de síndrome de Savant, mas não necessariamente. Aproximadamente metade dos casos de Savant estão associados ao transtorno do espectro autista, enquanto a outra parte está relacionada a outros transtornos
- Pessoas com TEA podem ter interesses restritos em determinados assuntos
Síndrome de Savant
- Quem tem a síndrome de Savant apresenta habilidades inatas, ou seja, não precisa estudar para dominar determinado tema
Isso significa que um músico com autismo mas sem síndrome de Savant pode, por exemplo, ter grande interesse em Mozart e aprender a tocar todas as peças, sabendo explicar como foram criadas, como devem ser tocadas, etc. Enquanto um músico Savant, mesmo sem ter estudado, consegue tocar uma música após escutá-la uma única vez.
Causas
Desde a descoberta da síndrome de Savant, os avanços das técnicas de exames de imagem cerebral, como a ressonância magnética, permitiram aos pesquisadores uma visão mais detalhada da condição. No entanto, não existe nenhuma teoria exata de como o savantismo pode acontecer.
Acredita-se que a disfunção de determinadas regiões cerebrais provoque uma resposta paradoxal com a super ativação e potencialização de outras áreas do cérebro. Esse processo é chamado de facilitação funcional paradoxal.
Desta maneira, após haver um dano cerebral em determinada região - geralmente no hemisfério esquerdo - há ativação de outra região cerebral e o aparecimento de capacidades até então adormecidas. Isso ocorre por um processo de desinibição de habilidades previamente armazenadas na nova região recrutada.
Sinais
A principal característica da síndrome de Savant é a capacidade extraordinária em determinadas áreas que estão relacionadas ao hemisfério direito do cérebro, como:
- Arte
- Música
- Cálculos matemáticos
- Habilidades mecânicas/visuoespaciais
- Compreensão da linguagem, como a capacidade de aprender diversas línguas
- Conhecimento em áreas específicas, como neurofisiologia, estatística, programação de computadores, entre outras
Diagnóstico
O diagnóstico da síndrome de Savant é clínico, ou seja, o médico avalia o histórico da pessoa juntamente com uma avaliação neuropsicológica. O objetivo é identificar e valorizar as áreas de destreza e utilizar as facilidades para minimizar a falta de habilidades em outras áreas.
Depois, o especialista avalia se é necessário algum diagnóstico diferencial que tenha indicação de tratamento específico, como uma lesão cerebral por AVC ou um tumor, por exemplo.
Buscando ajuda médica
Na maioria dos casos, a síndrome de Savant está relacionada a outras doenças. Assim, geralmente o diagnóstico acontece durante o acompanhamento com o especialista, que pode ser:
- Psiquiatra
- Neurologista
- Neurocirurgião
- Pediatra
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Tratamento
Não existe um tratamento específico para a síndrome de Savant; no entanto, devido à associação dessa condição com outros déficits relacionados à socialização e resolução de problemas, terapias podem ser adotadas para minimizar essas dificuldades e aprimorar outras habilidades.
Tem cura?
A síndrome de Savant não tem cura, porém, com a orientação adequada dos profissionais de saúde, é possível ajudar a pessoa a socializar e a realizar outras tarefas diárias.
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Convivendo (Prognóstico)
Entre os principais problemas encontrados, o paciente com essa condição é focado em suas habilidades específicas, mas, ao mesmo tempo, apresenta diminuição do interesse em atividades básicas, como fazer amizades, permanecer em locais públicos ou organizar a vida doméstica.
Mais Sobre
Casos famosos de síndrome de Savant
Os casos mais conhecidos de savantismo são:
1. Kim Peek (1951-2009): embora não conseguisse realizar ações simples como abotoar a camisa, o estadunidense ficou conhecido por decorar mais de 12 mil livros na íntegra. Sua história inspirou o filme Rain Man (1988).
2. Stephen Wiltshire (1974): nascido com TEA, o arquiteto britânico consegue desenhar com maestria paisagens e locais que viu uma única vez.
3. Temple Grandin (1947): também com autismo, a norte-americana conquistou um bacharelado em psicologia, um mestrado em zoologia e um PhD na mesma área. Suas pesquisas e invenções melhoraram o tratamento de animais em fazendas e abatedouros.
4. Jacob Barnett (1998): diagnosticado com TEA, Jacob, também dos Estados Unidos, é o menino mais jovem a entrar na faculdade para estudar física da matéria condensada. Ele tem um QI maior que o de Albert Einstein!
Além disso, a série “The Good Doctor”, criada por David Shore, conta a história de um residente de cirurgia, Shaun Murphy, que tem autismo e apresenta síndrome de Savant. O savantismo o auxilia em diversos momentos de sua profissão.
Referências
Julio Pereira, neurocirurgião da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo
Instituto de Apoio e Desenvolvimento
Autism Research Institute (ARI). Disponível em: https://www.autism.com/understanding_savants
Artigo “The savant syndrome” - Cambridge. Disponível em: https://www.cambridge.org/core/services/aop-cambridge-core/content/view/8DF3E01F971681C4A3E57F08CAFE73DF/S0955603600009119a.pdf/savant_syndrome.pdf
Artigo “The savant syndrome: an extraordinary condition”. Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2677584/