Médica Infectologista graduada pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), com residência médica pela Universidade...
iA tuberculose (TB) é tão antiga que foi detectada até em múmias. Esta é uma infecção que, embora curável, ainda aflige a humanidade. No Brasil são registrados mais de 70 mil casos novos desta doença a cada ano. O surgimento do HIV fez com que o mundo todo observasse o aumento expressivo dos casos de tuberculose. Isso se deve ao fato de as pessoas infectadas pelo HIV terem quase 30 vezes mais chance de adoecer com TB do que as pessoas sem HIV.
Isso acontece devido à falhas na imunidade celular acarretadas pelo HIV, que diminuem a capacidade de combater e controlar a infecção da tuberculose. Contrair a doença quando se tem HIV pode significar um agravamento potencialmente fatal. A principal causa de morte entre as pessoas vivendo com HIV é a tuberculose.
No Brasil cerca de 10% a 12% das pessoas doentes com TB são também infectadas pelo HIV. Muitas vezes, o diagnóstico de tuberculose é o que leva a pessoa a ser testada para o HIV, uma vez que todas as pessoas em tratamento da doença devem realizar o teste para verificar a presença do vírus, independentemente da idade ou sexo.
Da mesma forma, todas as pessoas infectadas pelo HIV devem ser continuamente monitoradas para infecção por tuberculose e devem estar atentas aos sintomas mais frequentes, como perda de peso, tosse, catarro, febre e sudorese à noite. Esses indícios devem ser comunicados à equipe médica sem demora.
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A tuberculose é curável e, portanto, o tratamento tem data para terminar. Já o tratamento do HIV é previsto, com as opções hoje disponíveis, para perdurar por toda a vida. A despeito desta grande diferença, o tratamento das duas infecções têm algumas semelhanças. Ambos são contra agentes vivos que procuram de todas as maneiras se multiplicar. E como acontece com a gente, os "filhos" da bactéria da TB ou os do vírus HIV são parecidos, mas não idênticos a seus pais.
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Esse é um ponto crucial do tratamento: bactérias e vírus descobrem mecanismos para burlar os remédios e sobreviver na sua presença - a isso chamamos resistência aos medicamentos. A resistência acontece quando o vírus ou bactéria é exposto de forma irregular ao medicamento. Quando o tratamento é feito na dose certa e regularmente, não há chance dos microrganismos se reproduzirem. No entanto, a pessoa que toma o remédio em dose menor que a indicada, ou deixa de tomar algumas doses, cria um ambiente propício para que vírus e bactérias se reproduzam na presença de alguma quantidade de remédio. Assim, ao longo do tempo, alguns dos "filhos" podem desenvolver resistência. Neste momento, o medicamento, seja ele para o HIV ou para tuberculose, deixa de fazer efeito. Por este motivo o tratamento deve ser absolutamente regular. As perdas de doses, sejam elas por esquecimento ou até mesmo por vômitos, que podem eventualmente ocorrer, devem ser discutidas com o médico.
O tratamento das duas infecções demanda mais de um medicamento. Muitas vezes a interação entre os remédios pode exigir mudanças no tratamento do HIV ou da TB. Assim, é importante que cada paciente tenha seu esquema avaliado individualmente.
Em geral, os tratamentos fazem os sintomas melhorarem. Na dupla HIV-TB nem sempre esta relação é direta. Em pacientes muito imunossuprimidos pelo HIV, a melhora inicial, ao tratar a TB, pode ser seguida por piora dos sintomas - com febre, aumento de gânglios, piora nos raios-X - a isso chamamos reação paradoxal. À medida que o tratamento do HIV faz efeito e a imunidade melhora, o organismo passa a "brigar" com a tuberculose. Essa "briga" pode aumentar a inflamação e com isso piorar sintomas que vinham melhorando. É uma piora transitória, que demonstra melhora na imunidade.
Embora vírus e bactérias sejam espertos, nós contamos com algumas vantagens no combate da dupla TB-HIV. Sabemos que tratar o HIV e manter a imunidade em níveis elevados diminui o risco de contrair tuberculose - e esse é apenas um dos muitos motivos pelos quais orienta-se tratar o HIV de todas as pessoas, independentemente dos exames ou quadro clínico.
Além disso, muito embora não exista vacina para tuberculose eficaz para adultos, é possível identificar, por meio de exames, as pessoas que já foram infectadas pela TB e ainda não adoeceram. Estas pessoas com tuberculose latente, ou seja, na forma dormente, assintomática, não infectante, podem ser tratadas antes de adoecerem. O tratamento para prevenir a TB deve ser oferecido não só a pessoas infectadas pelo HIV, mas também para pessoas com outros riscos para tuberculose, como as com diabetes, as transplantadas, entre outras.