Nutricionista, graduada pelo Centro Universitário São Camilo, em São Paulo, com especialização em Nutrição de Doenças Cr...
iEstamos comendo muito, cada vez mais, e com muita dificuldade em parar. Começamos a comer e só paramos ao ver o fim, em pouco tempo percebemos que devoramos tudo. Ansiedade, estresse, compulsão, o que esta acontecendo? Doenças da ansiedade e até mesmo transtornos alimentares podem justificar esse comportamento, mas, na maior parte das vezes, é apenas o paladar a nos passar uma rasteira.
Vários mecanismos fisiológicos estão associados ao controle do consumo alimentar. Reguladores hormonais estão envolvidos na sinalização de fome e saciedade e tende a manter o balanço energético neutro, estimulando ou inibindo o apetite de acordo com a necessidade do corpo humano. Sobressai-se ao controle hormonal, o mecanismo de recompensa. Esse mecanismo nos conduz ao alimento guiado pelo prazer, memória e aprendizado, e conta com a ajuda fundamental dos nossos sentidos.
Visão, audição, aroma junto com o paladar nos conduzem na busca pelo alimento. Nossa língua apresenta receptores específicos identificados para cinco sabores: doce, amargo, salgado, azedo e umami. A predileção ao doce é inata, nascemos já gostando desse sabor. Somos capazes de perceber a proteína a partir de receptores umami, há uma sensação prazerosa e suave em resposta ao consumo de fontes de aminoácidos, que são derivados proteicos, em especial ao sabor do glutamato. Aprendemos a gostar do salgado e quanto maior a quantidade de sal, maior o consumo. Nos afastamos do azedo e amargo por estarem relacionados a alimentos de potencial risco à saúde, como veneno e alimentos estragados.
Quanto à gordura, ainda não foi identificado um receptor especifico para seu gosto, mas a composição em gordura dos alimentos parece afetar o consumo através de seu aspecto, textura e possivelmente o seu aroma. A combinação dessa textura agradável da gordura com açúcar ou sal nos deu alimentos irresistíveis e certamente fazem parte do nosso consumo cotidiano unicamente pelo prazer e não por necessidade nutricional.
A indústria de alimentos soube usar todo esse conhecimento a serviço do consumo. Combinou sabores, juntou sal e glutamato; açúcar e gordura; sal, gordura e glutamato. Essas associações aumentam nossas respostas de prazer e podem justificar nossa incapacidade de interromper o consumo, mesmo estando já satisfeitos. Poucas pessoas são capazes de parar de comer espontaneamente alimentos ricos em sal, como salgadinhos de pacote ou pipoca temperada, assim como é quase improvável abandonar uma barra de chocolate pela metade.
Esse descontrole não esta associado à compulsão. O sal fica na língua estimulando o centro os receptores gustativos. Assim como o açúcar e a textura do chocolate conferida pela gordura impregnam por toda a boca e nos fazem querer mais. Nossa história de aprendizado do alimento, somado à resposta intensa de prazer promovido pelo paladar, dominam nosso consumo nesses momentos.
Esse sistema de recompensa pode ser modulado ao longo da vida e iniciativas de mudança de hábito e reeducação alimentar nos ajudam a controlar esse consumo desenfreado. Nossos sentidos conseguem se adaptar e, após pouco tempo sem receber estímulos intensos, rejeitam muito sal ou muito açúcar. Há neutralidade no paladar quando passamos a comer alimentos mais suaves como frutas. Não deixamos de receber sinalizações de prazer, só modificamos a fonte estimulante e voltamos a ter controle sobre nossas escolhas. Esse é um caminho não muito tranquilo, mas é uma rota segura que vai de encontro à saúde e vida longa!